Page 5 - Revista da Armada
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ser desenhadas para objetivos específi-         Em paralelo, agravaram-se uma série         até o embarque de especialistas que pos-
cos. Todos sabem que o que se observa         de ilícitos no mar com repercussões em        sam observar “in loco” a operação e fun-
de interesse em terra ou no mar é sujeito     terra, nomeadamente a imigração ilegal        cionamento de sistemas, é insubstituível
a relatórios e análises. Os meios de guerra   por via marítima e a criminalidade trans-     como forma de promoção. No caso Por-
eletrónica moderna e a combinação com         nacional com grande expressão no narco-       tuguês, julga-se que existe um mercado
uma panóplia imensa de fontes de infor-       tráfico. Simultaneamente, o terrorismo        para patrulhas costeiros e oceânicos de
mação podem produzir resultados sur-          internacional passou a ser uma preocupa-      fabrico nacional, como houve para os sis-
preendentes. Por outro lado, a observa-       ção para as atividades marítimas e a pira-    temas integrados de comunicações, que
ção visual e o contacto com meios navais,     taria ressurgir em vários pontos do globo,    não teriam tido sucesso se não fossem
infraestruturas e pessoas, são elementos      com realce para a zona do corno de África.    montados em navios da Marinha Portu-
precisos de informação, quando conve-                                                       guesa. Por outro lado, os navios podem
nientemente trabalhada.                         As Marinhas foram chamadas para             promover muitos outros produtos nacio-
                                              criar e manter estabilidade, iniciando-se     nais no estrangeiro. Os vinhos e conser-
  A cooperação naval técnico-militar é        uma nova era na diplomacia naval. De          vas já fazem parte da habitual, mas o N.E.
uma forma de diplomacia que vai muito         facto, de acordo com um entendimento          “Sagres”, em recente viagem à volta do
para além de atividades de formação. As       praticamente consensual referido nos pri-     mundo, levou uma pequena exposição
relações de boa vontade e a abertura para     meiros parágrafos deste texto, as funções     de mobiliário português.
cedência de meios e negócios mutuamen-        de fiscalização e controlo de águas jurisdi-
te vantajosos, bem como a continuidade        cionais não se enquadravam na diploma-          O outro, que poderia ser eventualmente
de relações, são aspetos a ter em conta.      cia naval, pois não estavam relacionadas      designado por diplomacia naval científica,
                                              com a política externa do Estado.             relaciona-se com as capacidades ligadas
  As visitas de rotina aos portos, para                                                     às ciências do mar, nomeadamente a hi-
reabastecimento ou descanso de guarni-          Todavia, o que se verifica na atualidade    drografia e a oceanografia. São muitas as
ções podem ser aproveitadas para culti-       é que são atribuídas às Marinhas missões      possibilidades de cooperação com países
var amizade, causar impressões positi-        de fiscalização e controlo em águas juris-    muito necessitados de apoio nestas áreas­ e
vas e melhorar a imagem. Os programas         dicionais de outros, para combater a crimi-   designadamente os países africanos de ex-
das visitas podem contemplar visitas a        nalidade internacional. Essa faculdade tem    pressão portuguesa. A produção ou atua­
entidades importantes e organização de        sido dada com o acordo do Estado Costei-      lização de cartas náuticas é uma ativida-
eventos que provoquem interação com a         ro, como já aconteceu em várias partes do     de inesgotável e os estudos conducentes
sociedade local.                              mundo e até em Cabo Verde, com a parti-       ao alargamento das respetivas platafor-
                                              cipação de uma corveta portuguesa.            mas continentais constituem outro exem-
  As visitas políticas absorvem as vanta-                                                   plo atual de cooperação. Mas, existe uma
gens das visitas de rotina, mas destinam-       No combate á pirataria, o envolvimento      infinidade de possibilidades relativas ao
-se a promover influência, pelo que im-       de várias forças navais na costa da Somá-     desenvolvimento do litoral, assinalamen-
plicam uma comunicação mais intensa           lia e regiões próximas foi legitimada por     to marítimo, formação científica especia-
com os poderes instituídos e a população      uma resolução das Nações Unidas. Isto         lizada, etc.
locais. O acompanhamento de visitas de        porque estava em causa o interesse co-
Estado e a participação em celebrações        mum na normalidade do tráfego maríti-           Em suma, a diplomacia naval é um ins-
nacionais são exemplos de visitas políti-     mo, numa área onde circulam navios com        trumento do poder político que pode con-
cas. A participação em exercícios, a aber-    materiais particularmente importantes.        tribuir muito para se atingirem objetivos
tura dos navios a visitas, a organização de                                                 político-estratégicos, mesmo em zonas
eventos desportivos e culturais, as rece-       Outra novidade da diplomacia naval          afastadas e constitui um dos modos de
ções formais a bordo, os discursos proferi-   moderna foi a necessidade da cooperação       rentabilização dos meios combatentes em
dos, a promoção de ideias favoráveis, etc,    internacional. Para combater eficazmente      tempo de paz. Tem ainda a vantagem de
fazem parte da organização do programa.       as ameaças que se intensificaram no mar,      apresentar sempre um certo grau de dis-
                                              os Estados rapidamente perceberam que         suasão, ainda que na forma latente.
  O que antecede traça um retrato da di-      não podiam garantir um grau aceitável de
plomacia naval clássica, que está consoli-    segurança no mar de forma isolada, por          Cabe aqui referir que o modelo de Ma-
dada há muitos anos e que no seu extremo      maiores que fossem as suas capacidades.       rinha Equilibrada adotado pela Marinha
mais coercivo corporizava a chamada di-                                                     Portuguesa, ao preferir uma diversidade
plomacia da canhoneira, porque utilizada        Para além das forças combinadas nos         de capacidades em vez de se concentrar
essencialmente a ameaça como perceção         casos mais graves, a cooperação interna-      em funções muito especializadas, ajusta-se
de agressão iminente, para obter ganhos       cional passa pela partilha de informações     bem às vantagens de se possuir uma com-
políticos.                                    relativas ao conhecimento situacional ma-     ponente oceânica relevante, mesmo que
                                              rítimo e por um elevado número de acor-       não tenha a dimensão que seria a mais ade-
  Os tempos modernos não invalidaram          dos de cooperação assinados. A legislação     quada aos interesses de Portugal no mar.
a diplomacia naval clássica, embora tor-      internacional e importantíssima ação da
nassem menos aceitável a diplomacia da        Organização Marítima Internacional con-         Duas breves conclusões, mas da maior
canhoneira na sua forma mais explícita.       tribuíram também para o ambiente de co-       importância, na perspetiva do autor, para
                                              laboração, a que aderiram praticamente        a relação do país com a sua Marinha:
  No mundo atual a ligação do mar à eco-      todos os países estruturados.
nomia mundial é bem expressa pelo facto                                                       - Torna-se necessário compreender a
de mais de 90% das mercadorias circularem       Sem pretender esgotar o assunto, que        subtileza da diplomacia naval e a sua
pela via marítima e a tendência não cessa de  é muito vasto, afigura-se útil focar ainda    enorme abrangência;
aumentar. A globalização e a consequente      dois aspetos da diplomacia naval, não
interdependência de todos os Estados, está    muito conhecidos.                               - Face à utilidade dos meios navais
baseada na garantia da normalidade do trá-                                                  como instrumento diplomático, devem
fego marítimo. Por outro lado, as indústrias    Um deles, que talvez se pudesse desig-      ser aproveitadas todas as ocasiões propí-
e boa parte do comércio internacional tor-    nar por diplomacia naval económica, tem       cias para a sua utilização.
naram-se muito vulneráveis a atrasos e in-    a ver com a utilização de meios navais
terrupções de fornecimentos, pois a cadeia    para divulgar as próprias construções                                                            
logística funciona sob o princípio de entre-  em estaleiros nacionais, bem como equi-                       Victor M. B. Lopo Cajarabille
gas em volume suficiente e em tempo (“just    pamentos da indústria de defesa. Nada
enough e just in time”), de modo a permitir   melhor do que mostrar os navios e equi-                                                             VALM
maior eficiência, em razão do menor custo.    pamentos em países que sejam potenciais
                                              compradores. As explicações detalhadas e      Nota
                                                                                            1 Definição do Prof. Doutor Victor Marques dos
                                                                                            Santos

                                                                                                        REVISTA DA ARMADA • MARÇO 2012 5
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