Page 5 - Revista da Armada
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Hoje há quem argumente que era a fraca          com a adequada exploração das condições            Como distingo então o «antes» e o «depois»
preparação dos sargentos e das praças que        ambientais. Tal pressupõe a disponibilidade       dos helicópteros? De forma simples: na mu-
levava a que os oficiais tivessem de assumir     e o emprego de meios aéreos, tais como os         dança de atitude que permitiu que as acções
maiores responsabilidades ao nível da execu-     helicópteros com sonares de profundidade          deixassem de se centrar na preocupação
ção das tarefas. Sendo imparcial, até porque     variável, exactamente o tipo de sensores de       com o «eu», para passar a concentrar-se nos
a distância ajuda a uma avaliação mais de-       que a Marinha passou a dispor.                    efeitos a causar nos «outros».
sapaixonada, considero que os oficiais «con-
duziam e operavam» porque não sentiam a           E como «a necessidade aguça o engenho»,                            Luís Carlos de Sousa Pereira
necessidade de fazer outra coisa! As próprias    a nova postura resultou num desenvolvimento                                                CMG
valências ao nível dos sensores e das armas      muito rápido na forma de empregar os heli-
não lhes ofereciam alternativas.                 cópteros e de explorar as suas valências. Mais    Notas
                                                 libertos, os oficiais podiam explorar o seu in-   1 Quando algo não acontece, as suas consequências
 Com a chegada das novas fragatas da classe      telecto, procurar controlar os acontecimentos     não se materializam.
Vasco da Gama surgiram também os helicóp-        e, assim, evitar ter de se concentrar no próprio  2 Quando os perigos não são imediatos, é possível pre-
teros Lynx. Sendo, como a maioria dos leito-     navio. Para antecipar as acções dos submari-      venir e contrariar o seu desfecho.
res saberá, uma parte integrante (orgânica) do   nos, por exemplo, passou a analisar-se a per-     3 Quando a ameaça está próxima, protegemo-nos dos
sistema de armas e sensores das fragatas, es-    sonalidade dos comandantes, e o seu modo          seus efeitos.
tas ficam muito limitadas nas suas valências,    de actuar. Sem o quererem, e porque não           4 O Chaff é um sistema de proteção baseado na disper-
seja ao nível ASW – para o que os Lynx são       adicionaram esta nova variável ao seu próprio     são de palhetas metálicas, que, ao serem detectadas pe-
essencialmente vocacionados –, seja no pla-      processo de decisão, os comandantes dos sub-      los radares, aparecem nos écrans dos operadores como
no da guerra de superfície, seja, ainda, numa    marinos denunciavam padrões de comporta-          ecos com características semelhantes aos que são pro-
perspectiva de transporte logístico14, quando    mento que serviam para posicionar e orientar      duzidos pelos navios.
não dispõem de uma aeronave embarcada.           as aeronaves17.
                                                                                                                                5 As fragatas da classe «Almi-
 Mas o advento dos                                «Antes dos helicópteros», subsistia uma                                       rante Pereira da Silva» foram
Lynx veio porém intro-                           manifesta desvantagem «material» que con-                                      sendo imobilizadas, deixan-
duzir um novo factor                             dicionava aquilo que era possível fazer e                                      do gradualmente de partici-
de extrema relevância:                           que determinava a postura dos OAT. Se re-                                      par em missões e exercícios
a possibilidade de es-                           lembrarmos o, já referido, OODA loop, pode                                     a partir de 1983.
tender os sensores15                             concluir-se que, nessa altura, se descurariam                                  6 Para poder operar e falar nos
para além da área de                             as primeiras duas fases – Observar e Orientar                                  circuitos tácticos em fonia.
influência directa dos                           –, em favor das etapas posteriores – Decidir e                                 7 Naturalmente que esta era
navios, levando as                               Agir. Desta forma, decisão e acção não eram                                    apenas a imagem visível do
acções próprias, e os                            devidamente enquadradas pela observação e                                      «bom operacional», pois
seus efeitos, para lá                            pela orientação. Ora, «ganha a guerra» quem                                    muito trabalho de planea-
do horizonte. Pela pri-                          quebra, ou atrasa, o OODA loop do seu opo-                                     mento e de preparação dos
meira vez, a análise da                          nente. O ciclo estava, de facto, quebrado, o                                   navios e das guarnições, bem
situação e os juízos so-                         que nos colocava numa situação de «perda»                                      como de análise e avaliação
bre a forma de contra-                           constante.                                                                     das operações, era efectuado
riar potenciais linhas                                                                                                          por esses oficiais, sendo esse
de acção do inimigo poderiam ser prossegui-       Os helicópteros resolveram a questão das                                      trabalho que realmente dis-
das e antecipadas através de acções práticas.    desvantagens «materiais», obrigando à mu-                                      tinguia as pessoas pelo saber.
Era, finalmente, possível, exercer uma maior     dança de atitude que recentrou as priorida-                                    Mas nem todos os que muito
pressão sobre as plataformas oponentes, le-      des dos OAT no Observar e Orientar antes          sabiam de táctica e operações eram bons «comunicado-
vando-as a preocupar-se com a sua própria        de Decidir e Agir. Completou-se o ciclo, ga-      res», nem todos os que tinham excelentes desempenhos
segurança, e, desta forma, equilibrar os ciclos  nhou-se no «tempo operacional», e na capa-        nas linhas tácticas de comunicações, eram bons conhe-
de decisão.                                      cidade de aprender e adaptar, factor essencial    cedores das matérias da táctica e das operações.
                                                 à melhoria dos resultados operacionais. Na        8 Que constituem, de facto, bons alcances, face às ca-
 Esta simples constatação recolocou o pen-       perspectiva dos processos internos, sobreveio     racterísticas das nossas águas.
samento táctico e as prioridades de acção no     a necessidade de uma estreita articulação e       9 Para o leitor menos familiarizado com esta temática,
lugar certo. Aos oficiais cabia antes de mais    coordenação entre os centros de comando           convirá esclarecer que os submarinos são capazes de
avaliar a situação, decidir e nortear o empre-   de bordo, e impulsionaram-se os procedi-          detectar forças e de disparar torpedos a distâncias muito
go dos sensores e das armas. Mas para isso       mentos e as normas de segurança, tudo con-        superiores (para além das sessenta mil e das vinte mil
precisavam de um panorama esclarecido            tribuindo para gerar a noção do «navio como       jardas, respectivamente).
sobre o qual pudessem trabalhar, tarefa que      um sistema» e para promover uma maior             10 Aqui referido para os leitores que pretenderem con-
teria de recair sobre os sargentos e as praças.  coesão ao nível das guarnições.                   sultar o assunto em maior detalhe.
Talvez mais do que a evolução tecnológica                                                          11 Naturalmente que esta lógica se aplicava às restantes
dos sistemas e dos equipamentos de bordo,                                                          disciplinas da guerra no mar, pois as limitações ao nível
a integração dos helicópteros foi um estímulo                                                      do material (radares, guerra electrónica, sistemas auto-
fundamental para gerar essa noção de pro-                                                          máticos de tratamento de dados, etc.) tornavam muito
pósito, e para fundamentar na prática aquilo                                                       complicado manter uma imagem clara da situação tác-
que, em teoria, já se sabia.                                                                       tica em torno do navio.
                                                                                                   12 Atenta as velocidades dos torpedos então existentes.
 As opções colocadas ao dispor dos OAT                                                             13 Como a condução de planos de zig-zag.
passaram a ser muito maiores, e, no caso                                                           14 Para pessoal e material, ainda que limitado e só utili-
particular da ASW, a própria hegemonia da                                                          zado em situações muito particulares.
arma submarina – que continua a ser das                                                            15 E as armas.
mais perigosas e difíceis de contrariar – viu-                                                     16 Pese embora muitos dos camaradas dos submarinos
-se reduzida16. Na realidade, a arma subma-                                                        possam ter tido dificuldade em o aceitar.
rina não se combate com sonares de casco,                                                          17 Aqui cabe uma especial palavra de apreço a muitos
mas sim à distância – a despeito dos alcances                                                      dos pilotos, que, com experiência anterior como OAT
de detecção que se podem obter com siste-                                                          a bordo dos navios de superfície, estavam especial-
mas que utilizam frequências mais baixas, ou                                                       mente sensibilizados, e preparados, para este tipo de
                                                                                                   «peleja». Uma prova evidente de que, além do treino,
                                                                                                   a formação pesa significativamente no desempenho.

                                                                                                   N.R.
                                                                                                   O autor não adota o novo acordo ortográfico.

                                                                                                          REVISTA DA ARMADA • JULHO 2013 5
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