Page 7 - Revista da Armada
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BREVE HISTÓRIA DA OPERAÇÃO DE AERONAVES
A PARTIR DE NAVIOS DA MARINHA PORTUGUESA
A aviação tal como a conhece-
mos atualmente, terá come- Foto Museu de Marinha Os aviadores seriam salvos pelo
çado em 1903 com os voos cargueiro inglês Paris City após 9
dos irmãos Wright em Kitty Hawk1. horas à deriva, mas pior sorte teve
o “16” que se perdeu durante a
Logo no dealbar desta nova era, al- tentativa de o recuperar. Apesar do
guns visionários compreenderam o contratempo, as opiniões-públicas
impacto que as capacidades de ob- portuguesas e brasileira “exigiram”
servação das aeronaves poderiam ter que a Travessia fosse concluída.
nas operações militares, e no que diz Nesta sequência, pela primeira vez
respeito às operações navais, o seu um navio da Marinha operou com
valor seria inestimável. uma aeronave; quando o Fairey
No início do séc. XX, o poder na- IIID nº17, o famoso Santa Cruz, foi
val estava intimamente relacionado embarcado em Lisboa no cruzador
com a quantidade de couraçados e NRP Carvalho Araújo, para retomar
o calibre das suas peças de artilharia, a Travessia a partir dos penedos de
mas sendo a sua aquisição altamente S. Pedro e S. Paulo. O Santa Cruz
dispendiosa, para países de vocação O Fairey IIID nº 16 a bordo do paquete brasileiro Bagé, em abril de 1922. descolou no dia 5 de junho e, após
marítima mas com poucos recursos, Foto Museu de Marinha quatro pequenas escalas no Brasil,
que era o caso de Portugal, a opção concluiu a Travessia com sucesso
de enveredar por soluções mais ino- após amarar em segurança na baía
vadoras e criativas como a aquisição de Guanabara (Rio de Janeiro) a 15
de submersíveis e/ou de aeronaves de junho de 1922.
seria muito tentadora. Por este mo- Mais tarde, a 4 de abril de 1931,
tivo, compreende-se que logo em iniciou-se na Madeira um levan-
1912 se tenha começado a idealizar tamento militar contra o governo
o Serviço de Aviação da Armada, da Ditadura Nacional5. Para neu-
que seria oficialmente criado em tralizar a revolta, logo a 7 de abril
setembro de 1917 e que teve como o governo enviou para a Madeira
principal impulsionador um grande uma força de 800 militares do Exér-
visionário da aviação ao serviço das cito, embarcados no paquete Pedro
operações navais: o 1TEN Artur de Gomes, escoltado pelo cruzador
Sacadura Freire Cabral. Carvalho Araújo e pelas canhonei-
No entanto, quando se considera O Fairey IIID nº 17 Santa Cruz a ser içado para bordo do NRP ras Damão e Ibo. A 8 de abril esta
a utilização de aeronaves em opera- Carvalho Araújo. expedição foi desviada para os
ções navais, por natureza expedicio- Foto álbum do CTEN Costa Gomes Açores, uma vez que algumas ilhas
nárias, surge de imediato o desafio deste arquipélago aderiram à revol-
de operar aeronaves a partir de na- ta. Passados três dias a expedição
vios2. Embora a Aviação Naval3 por- é reforçada com o cruzador Vasco
tuguesa se tenha enquadrado mais da Gama, a canhoneira Limpopo e
no conceito de aviação marítima, o cargueiro Cubango. Este último,
ou seja, a utilização de aeronaves a para além de uma força de desem-
partir de terra em apoio às operações barque da Marinha e de artilharia
navais, a utilização de aeronaves a do Exército, embarcou três hidroa-
partir de navios não passou desper- viões CAMS 37A da Aviação Naval,
cebida, antes pelo contrário, sempre o que transformou o Cubango no
foi um desiderato. Na verdade, sem- primeiro “porta-aviões” português.
pre que foi necessário (e possível) Nos Açores os CAMS operaram a
operaram-se aeronaves a partir de partir da Horta (que se tinha manti-
navios da Marinha e o objetivo deste do fiel ao governo) e efetuaram voos
artigo é exatamente revelar alguns sobre a Terceira para lançamento de
factos menos conhecidos sobre este panfletos com proclamações a in-
tipo de operação em Portugal. centivar os revoltosos à rendição. A
A primeira utilização de aerona- falta de apoio popular, a dissuasão
ves portuguesas a partir de navios causada pela presença dos cruzado-
ocorreu durante a Travessia Aérea res e sobrevoos dos hidros, fizeram
do Atlântico Sul, protagonizada pe- com que os militares sublevados se
los comandantes Sacadura Cabral Hidroavião CAMS 37A nº 42 embarcado no Cubango durante a rendessem entre os dias 17 e 20 de
e Gago Coutinho. A 18 de abril expedição de 1931. abril sem que fosse disparado um
de 1922, o Fairey IIID Mk2 “Lusi- o Fairey IIID nº164. No dia 11 de maio de único tiro. Mas a Madeira continu-
tânia”, durante a sua amaragem em mar 1922, já em Fernando de Noronha, o “16” ava sob o controlo dos revoltosos e a expe-
revolto, partiu um flutuador e afundou-se descolou rumo ao Recife, mas passadas dição prosseguiu rumo ao Porto Santo. En-
junto aos penedos de S. Pedro e S. Paulo. quatro horas e meia de voo, uma infeliz tre 23 e 25 de abril, largaram de Lisboa os
Para continuar a Travessia, foi embarca- falha de motor (bastante comum nessa épo- paquetes Niassa 6 e Carvalho Araújo com
do em Lisboa no paquete brasileiro Bagé, ca…) obrigou-o a amarar de emergência. mais 1400 militares a bordo7, entre eles o
REVISTA DA ARMADA • JULHO 2013 7