Page 6 - Revista da Armada
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REVISTA DA ARMADA | 523
FORMAR
OFICIAIS DA ARMADA
“É ofício do almirante do mar ter marinheiros para marinhar titividade internacional dos estudantes, docentes e investigadores
os navios” europeus. Tendo esta finalidade, é fácil perceber que, aplicado a um
Padre Fernando Oliveira sistema fechado, onde tais benefícios não têm uma aplicação direta,
nem podem ser prioritários, o Processo de Bolonha induziu algumas
INTRODUÇÃO disfunções nas escolas superiores militares. A principal, foi criar uma
enorme pressão de uniformidade curricular, não só pela necessi-
o seu pioneiro tratado sobre estratégia naval, Arte da Guerra dade de atribuição de ECTS (Sistema Europeu de Transferência e
Ndo Mar, o Padre Fernando Oliveira refletiu demoradamente Acumulação de Créditos), que suscitaram o reforço da componente
sobre os vários aspetos relacionados com a formação dos “homens científica de base, em moldes semelhantes aos das universidades.
do mar”, que considerava ser um dos mais importantes “ofícios do Porém, também impuseram a necessidade de acomodar as exigên-
Almirante”. Não podia concordar mais com o sagaz padre português cias associadas aos processos de acreditação dos ciclos de estudos,
e foi, por isso mesmo, que decidi escrever este artigo, expondo algu- com impacto, inclusive, nas estruturas funcionais das escolas supe-
mas ideias relativamente à formação dos cadetes da Escola Naval. riores militares. Em consequência disto, na Escola Naval foi induzido
A longa existência da nossa Marinha comprova que um oficial da uma espécie de stress científico, que provocou alguma miopia rela-
Armada deve ser, simultânea e concorrentemente, um militar, um tivamente à formação militar e marinheira.
marinheiro e um técnico. Assim sendo, a formação dos cadetes Neste quadro, a necessidade de não descurar nenhuma das três
da Escola Naval tem, necessariamente, de conjugar estas três ver- vertentes identificadas, impõe desafios extraordinários à Escola
tentes, com o objetivo de preparar oficiais valorosos, marinheiros Naval, fazendo com que a tarefa de formar cadetes, além de extre-
hábeis e técnicos proficientes, capazes de uma liderança eficaz, mamente aliciante, seja muito mais exigente do que produzir mes-
uma prática competente e um sólido saber. tres, como acontece nas universidades.
Deixem-me, então, explicitar um pouco melhor o meu entendi-
O STRESS CIENTÍFICO mento sobre cada uma das três vertentes de formação, atrás identi-
ficadas como essenciais na Escola Naval.
O Processo de Bolonha veio alterar, significativamente, todo o
enquadramento do ensino superior, com impacto natural no ensino A FORMAÇÃO MILITAR
militar. Recordo que esse protocolo visou a equiparação dos siste-
mas de ensino na União Europeia, com subsequentes benefícios Conforme decorre do respetivo estatuto, a formação de militares
em termos de promoção da empregabilidade e da mobilidade visa, em última análise, prepará-los para defender a Pátria, mesmo
intraeuropeia do conhecimento, bem como de aumento da compe- com o sacrifício da própria vida, devendo pautar o seu procedi-
6 NOVEMBRO 2017