Page 13 - Revista da Armada
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Em 1716 e 1717 conseguimos reunir forças navais para   era  necessário  dar-lhes  vinho.  Embora a disciplina  das
        auxiliaras venezianos contra os turcos, a pedido do Papa.   equipagens  fosse  muito  fraca,  existia  um  regulamento
        No primeiro ano a nossa esquadra compunha-se de nove   muito adequado à sua manutenção.  No regresso de cada
        navios (cinco naus, uma fragata, um brulote, uma tartana   viagem os capitães, os pilotos e os mestres eram obrigados
        e um navio-transporte) e no ano seguinte de onze navios   a apresentar  relatórios sob juramento ao  juiz do Almi-
         (sete naus, dois burlotes, uma tartana e um transporte).   rantado, onde informavam a conduta e aptidão dos tripu-
         Comandou ambas as  esquadras o general-do-mar  Lopo   lantes. O juiz tinha poderes para reduzir a metade o sol-
         Furtado de Mendonça, conde do Rio Grande, e foi almi-  do dos marinheiros que se tivessem comportado mal, ees-
         rante Manuel Távora da Cunha, conde de S. Vicente. No   tes descontos eram repartidos pelos que bem servissem.
         primeiro ano não chegámos a entrar em acção por, entre-  Refere também que tanto os oficiais de terra como de
         tanto, os turcos terem levantado o cerco a Cortu, mas no   Marinha  tinham  as  suas  recompensas:  a  concessão  de
         ano seguinte a nossa esquadra entrou na batalha do Cabo   pensões e, com muita frequência, de distinções. Existiam
         Matapão que terminou com a derrota dos turcos graças   três Ordens de Cavalaria das quais era grão-mestre o rei,
         à heróica actuação dos navios portugueses.         que as concedia aos oficiais e outras pessoas por serviços
            De salientar também os esforços que se fizeram neste   prestados.  Eram  as  ordens  de  Avis,  de  Cristo  e  de
         reinado para melhorar a disciplina e a instrução a bordo.   Sant'Iago,  a  primeira  instituída  por  D. Afonso  Henri-
         Em 31 de Março de 1722 foi publicado o «Regimento que   ques. O rei recebia direitos por estas mercês e nem sequer
         hão-de guardar os  capitães-de-mar-e-guerra e  mais ofi-  dispendia o valor das respcctivcas cruzes que , geralmen-
         ciais que embarcarem nas fragatas de guerra», onde se de-  te, eram  oferecidas pelos  padrinhos.  As pensões destas
         finem as funções dos oficiais dos navios e outros membros   dignidades eram de sessenta libras, mas os encargos não
         das tripulações, desde o capitão-de-mar-e-guerra, ao ca-  aumentavam  na proporção dos novos cavaleiros admiti-
         pitão-tenente, escrivão, capelão, "Cirurgião, mestre, pilo-  dos, porque só as recebiam à medida que fossem morren-
         to,  condestável,  contramestre,  carpinteiro,  calafate,   do os antigos cavaleiros.
         guardião, cabo de marinheiros e patrão da lancha e esca-  Ainda segundo o mesmo estrangeiro, o serviço na In-
         ler. Completava este documento o chamado .. Regimento   fantaria era tido em pouco apreço, e poucos eram os fidal-
         da boa ordem e governo que deve  haver a bordo», com   gos ou pessoas de posses que nela serviam, sendo os pos-
         46 capitulas, que regulava o serviço a bordo dos navios e   tos ocupados por criados dos grandes senhores.  Os ofi-
         os castigos para as diversas infracções. Outro regimento,   ciais usavam bastão e por esta insígnia facilmente se reco-
         publicado a 24 de Abril de 1736, intitulado .. Regimento   nheciam, pois só era usada por eles e pelos estrangeiros.
         que hão-de guardar os segundos capitães-de-mar-e-guer-  Os capitães venciam  mensalmente 25  cruzados e os ou-
         ra,capitães de infantaria com exercício de capitães-tenen-  tros, na proporção. A Cavalaria tinha óptima apresenta-
         tes, tenentes e  alferes de  infantaria»,  indica  os deveres   ção mas estava mal montada, por não haver em Portugal
         destes oficiais.                                    bons cavalos e ser difícil importá-los de Espanha, porque
            De referir que foi  no reinado de D.João V que foram   este país proibia a exportação, sob pena de morte. À Ca-
         criados, em 28 de Julho de 1736, as Secretarias de Estado   valaria pertencia a maior parte da nobreza. O soldo de um
         da Guerra e Negócios Estrangeiros e da Marinha e Negó-  capitão era de 50 cruzados por mês. Os soldados de Cava-
         cios do Ultramar. Os primeiros titulares dest,,!s.pastas fo-  laria venciam mais cinco dinheiros do que os de Infanta-
         ram, respectivamente, Marco António de Azevedo Cou-  ria.
         tinho e António Guedes Pereira. Ambos tinham exercido   De  referir  que  no  reinado  de  D. João V  se  instalou
         funções diplomáticas no estrangeiro.                uma fábrica de pólvora em  Barcarena, se reorganizaram
            Segundo  um  estrangeiro  que  visitou  Portugal  em   as ferra rias da Foz do Alge e de Tomar e se instalou uma
         1730(2),  no  estaleiro  da  Ribeira  das  Naus  trabalhava-se   outra em  Santa  Clara.  Adoptou-se  também  na  Ribeira
         ininterruptamente, sob a direcção de um  construtor in-  das Naus a técnica inglesa de construção naval que foi  a
         glês, homem muito hábil nesta arte. Mas os navios mer-  seguir aplicada nos estaleiros da Baía. As encomendas de
         cantes tinham que ser comprados no estrangeiro, devido   lãs para as tropas eram reservadas às manufacturas nacio-
         à falta de madeiras em Portugal , que só as possuía de pi-  nais, procurando-se assim impedir a fortíssima oferta es-
         nho. A esquadra portuguesa compunha-se então de quin-  trangeirae)·
         ze a vinte navios de guerra de 50 a 90 peças.  Um ou dois   Outro  estrangeiro  que  visitou  Portugal  em  1723-
         eram destinados à escolta das frotas que se aparelhavam   . 1726(4)  refere  que  na  Cavalaria os  oficiais eram  pessoas
         para o  Brasil, e outros tantos para o serviço de guarda-  de  condição e  aptas  para o  serviço.  Mas  não sucedia o
         -costa que estava inCestada de  piratas argelinos e de  mou-  mesmo  na  Infantaria  porque  os  fidalgos  colocavam  os
         ros de Salé. Os outros navios de guerra estavam desarma-  seus lacaios como oficiais subalternos, embora muitas ve-
         dos no Tejo. Serviam na  Marinha alguns oficiais estran-  zes não tivessem conhecimentos nem qualidades para co-
         geiros -  franceses, holandeses e ilalianos - que ganha-  mandar tropas. Diz o mesmo estrangeiro que estes oficiais
         vam  mensalmente cem cruzados e quando saíam  para o   nem sequer se davam ao traballro de tirar a banda ou a es-
         mar recebiam sete cruzados e meio por dia, para a alimen-  pada para calçar e descalçar os seus amos.
         tação.  Os  oficiais  portugueses  embarcados  tinham  os   Sobre  o  referido por este  estrangeiro deve  notar-se
         mesmos vencimentos, mas se estivessem desembarcados   que estes desconheciam a diferença que havia entre escu-
         recebiam apenas vinte e sete cruzados.             deiros e criados, e por isso estranhavam aquele costume
            Diz o mesmo estrangeiro que Portugal tinha bons ma-
                                                                e)  Borges de Itfactdo, " Problemas d(l  Históri(l da Indwtria Portu-
         rinheiros, resistentes  à  fadiga e corajosos e nem  sequer   gutsa no Skulo XV 1fJ_.
                                                                (-)  " Mémoiru IrlSfrUfif$ pour un Voyageur dans Its Div~rs Élau de
            f)  "D~scriç6oda Cidade dd..is/xxJ~.             /' Europt _, obra alributda a Charlu Frederir: de Mervtilleux.

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