Page 8 - Revista da Armada

Antologia do Mar

e dos Marinheiros

José Rodrigues Miguéis P~Jo eap .• fl'lJg. Cr ist6l'ão M oreiTII

osé Rodrigues Miguéis nasceu cm Lisboa, a 9 de Dezem-
bro de 1901. Formado cm Direito pela Universidade da
sua terra natal, e cm Ciências Pedagógicas pela Universi·
Jdade de Bruxelas, iniciou ainda estudante a sua carreira
jornallstica. nas páginas de .. A Republ ica», que continuaria na
.. Seara Nova» c noutros jornais, cnlrc etes o semanário .. O Glo-
bo .. , de que foi director com Bento de Jesus Caraça. Advogado
e professor do ensino secundário em Lisboa. daqui emigrou cm
1935 para os Estados Unidos,onde se fixou c veioa morrer, com
79 anos, a 27 de Outubro de 1980. deixando uma obra que, fiel
à grande tradição humanista da novelíslica europeia do século
XIX, mas sem perder o sentido da modernidade, o impõe como
uma das mais destacadas figuras da literatura portuguesa con-
temporânea. Iniciada com .. Páscoa Feliz,. (1932), nela figuram
dtulos como .. Onde a Noite se Acaba" (contos, 1946), .. Saudades
para Dona Genciana" (1957, que inspirou o filme do mesmo
nome, realizado por Eduardo Geada e estreado em 1986),
.. Uah" (1958, prémio Camilo Castelo Branco), .. Uma Aventu-
ra Inquietante» e «Um Homem Sorri à Morte Com Meia-Cara"
(1959), .. Escola do Paraíso" e .. Gente de Terceira Classc,.
(1962), «Nikolai, Nikolai,. (1971) e .. Espelho Poliédrico,.
(1973).
No romance, como na novela e no conto, Miguéis tem .. uma
das escritas mais limpidamente elegantes dos nossos dias, capaz
de sugerir variadíssimos tons de ambiente e humor narrativo, de
reintegrar toda uma cena pelo pormenor ou dito mais evocati·
vo,. (<<História da Literatura Portuguesa,., de António José
Saraiva c Óscar Lopes), E, para além dessa característica da sua
prosa, .. é um espírito rico, variado, insinuantc, fino, eomaisad-
mirãvel dos oradores que jamais ouvi na min ha vida» (António
Sérgio).
O conto que incluímos nesta antologia, em versão integral,
foi publicado no volume .. Gente de Terceira Classe ... onde pre-
dominam os temas relativos à emigração portuguesa nos Esta-
dos Unidos, de que o escritor teve um largo e directo conheci-
mento, e que tratou com a sua tão diversificada técnica narrati-
va, e com essa capacidade de combinar a anãlise psicológica com (Foto do Strviço dt f)ocumtntaçdo do r Didrio dt Notícial_}
um realismo social onde a denuncia surgc dcfinida mas nunca
partidariamcnte marcada-e torna assim maiseficazesse diãlo- em 1976 levou à unanimidade da eleição de Miguéis para a Aca-
go, que permanece vivo, entre José Rodrigues Miguéis e os lei- demia das Ciências. não se salientava apenas o mérito literário
tores em que sua obra se continua: apesar de (como escreveu de «uma obra que dificilmente encontra paralelo na literatura
Mãrio Dionlsio) «a prolongada ausência e a distância não lhe portuguesa, pela extraordinária versatili~ade ~o e~lilo e a ex~re­
terem permitido, se acaso o queria, dedicar-sc pessoalmente ma variedade dos lemas que a poderosa Imagmaçao do escTltor
aos negócios da glória. em que tanlos são eldmi"ls .. incessantemente mobiliza, c pela nobilíssima coerência ideoló-
Mas com este distanciamento. no espaço e no espírito. n:\o gica que de modo exemplar sempre o animou»: mas exalta-se
põde José Rodrigues Miguéis furtar-se, ainda em vida, ao reco· também «o pessoalíssimo contributo para a compreensão do
nhecimento da importância do escritor. em que um e1l:ilio volun- 'homem português', das íntimas contradições que geral~ent~ o
tãrio de quase meio século não fe1. secar a rai1. arrancada li terra caracterizam e que Miguéis surpreende a cada passo com Irónica
de suas origens. Por isso, na proposta subscrita por Jacinto Pra- bonomia, que não exclui o exercicio de uma lucidez impla-
do CocJho, Fernando Namora c David Mourão-Ferreira, que cáve"' .
•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Um Conto de José Rodrigues Miguéis
.. o VIAJANTE CLANDESTINO ..

Nesse ano - hoje /do (Us/all/e fiO tem- bro COrrt!14 mui/o menos frio do q14t! habi-
po e fiOS usos (los homells, que por vezes lita/mente ao longo da costa do At/állfico:
julgamos viver nOltlro mllndo-o Dezem- IltVOU/to e clII4~'OSO, e morno Olé, como se

6