Page 297 - Revista da Armada
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OUMUN - A porta da Baía









           OU MUN (de OU: baía; MUN:  porta) - A PORTA
         DA BAÍA, é assim que se designa em chinês essa gota de
         terra a que chamamos Macau, com as suas colinas aleao-
         doradas sobre a água  lamacenta do imenso delta do rio
         das Pérolas, protegendo o fundeadouro do Porto Interior
         contra  o  nió/ FOUM,  o  temfvel  ~vento que  roda»,
                                                            longa  fila  de  panchões  (foguetes),  saindo então para o
           Investigando sobre a origem de OU MUN,  consultei
         a tradução para português do «Ou-Muo Kei Leók» (Mo-  mar e  regressando pouco depois.  Durante o ano, qual-
                                                            quer embarcação acabada de construir, também procede
         nografia  de  Macau) ,  publicada  em  1751  em  chinês  por
                                                            a idêntico ritual.
        dois funcionários do País do Meio, onde na Parte I pode
                                                                São várias as lendas sobre a fundação do Templo da
         ler-se:
                                                            Barra. Uma delas, reza o seguinte:
           «A baía de fiO U-K tA NG (Espelho do Fosso) encon-
         tra-se  registada  no  MENG-SÜ  (História  da  Dinastia   «Um dia, uma donzela de FU KIEN,  uma província
                                                            da China, quis embarcar num dos juncos que estavam de
         Meng), com O nome de OU-MUN (Porta da Baía).  Pelo
                                                            abalada para o Sul. Mas todos lhe recusaram a passagem,
         facto de existirem ao sul desta baía quatro ilhas que SUT-
                                                            visto  não  ter dinheiro.  Todos?  Não.  Os  tripulantes do
        gem  do mar, separadas umas das outras, permeando-se
                                                            mais pobre  junco, compadecidos, ofereceram-se para  a
        entre elas a água de modo a formar a letra+ (SAP: dez) ,
                                                            transportar gratuitamente para Cantão.  No caminho re-
        se deu a este sítio o nome da SAP-TCHI-MUN (porta em
                                                            bentou uma tempestade e todos os barcos se afundaram,
         forma da  letra dez).  Esta é a razão por que se diz tanto
        ON-MUN como simplesmente  OU,  onde existem  duas   excepto um. É que a rapariga tomou o leme e guiou a em-
                                                            barcação para um porto de refúgio.  Ao desembarcar, ela
        colinas, a NAM-TÓle) (Terraço Meridional) e a  PAK-
                                                            subiu a  um  rochedo e  não mais foi  vista.  Os tripulantes
         -TÓ/f) (Terraço Setentrional), que ficam uma em frente
                                                            ficaram convencidos que fora a Deusa A-MA que os sal-
        da outra, formando como que uma porta. No sítio chama-
                                                            vara da tormenta e os conduzira a esse porto. Erigiram ali
        do  OU,  presentemente,  os  bárbaros  SÂI-IEàNGe)
                                                            um  templo em honra de A-MA, o qual se chamou MA-
         (portugueses) residem  no arco formado pelo mar ( ... ) ...
                                                            -KOKMIUN.»
           Curiosamente, O nome de Macau, tão conhecido no
         mundo que não fala o chinês, não é o nome chinês do por-
         to (OU MUN). Procurando saber a origem do termo Ma-
        cau, verifiquei que segundo a maioria dos  historiadores
         poderá ter derivado de A-MA KÁ U (ancoradouro da baía
        de  A-MA).  Em  documentos de  missionários ocidentais
        datados de  1598, o estabelecimento português na China
        é designado por AMAGÁ U(4), que posteriormente evo-
         luiu para Macau.
           Antes da chegada dos portugueses já existia no Porto
         Interior, no local denominado MA KOK, o templo onde
        ainda hoje se venera a Soberana do Céu, a Deusa A-MA,   Ma·Kok Mium (o Temploda Deusa A-Ma, o Templo da Barra).
        a protectora dos navegantes. A importância do culto des-
        ta  divindade  é  extraordinária,  principalmente  entre  os   Nos  rochedos do Templo da  Barra, 19Cal de medita-
                                                            ção, estão gravados em chinês vários poemas. Traduzidos
        maritimos. Todos os anos. no dia 23 do3.o mês lunar, rea-
        lizam-se enormes festejos; no terreno em (rente do tem-  para  inglês,  foram  vertidos  para  português  por  monse-
        plo, fronteiro à Capitania dos Portos, é erguido um gran-  nhor Manuel Teixeira. Transcrevo a seguir o poema que
        de barracão com anfiteatro, inteiramente sustentado por   me pareceu mais interessante:
        bambus, onde se realizam representações de ópera canto-   «Quando os argonautas do mar desvendaram o
        nense, muito apreciadas pelo povo.  Nessa data, todos os                                     (Oriente,
        juncos de pesca se aproximam sucessivamente da margem     Nasceu esta ilha misteriosa num recanto do mar.
        junto ao templo, aproam ao santuário e metendo máqui-     Como O pescoço duma galinha C),
        nas a ré efectuam uma espécie de vénia com a proa - é     Avança até ao termo de nove mares,
        o «bater cabeça .. - acompanhada do estralejar de uma     Abre-se uma porta,
                                                                  Um porto para acolher a todos de todas as
           (') Colina da Penha.                                                                     [direcções;
           e) Colina da Guia.
           e) SÂI-IEONG  IAN  (Homens do  Duemo  Atlámico,  ou  Porm-  (l) .PescOÇo de Galinha .. (KA I KEANG) f o nome que os chineses
        gueses).                                            dão ii POli/O  Cabrita.  nos extremos leste da ilha da  Taipa.  que se avista
           (') Em . Templo Chinb da Barro_, de monsenhor Manuel Teixeira.   de Mac(Ju.

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