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O Espadarte
                                O Espadarte



                                                       1ª parte



         Em 17 de Junho de 1910 Portu-      peias e o Ultimatum Inglês. Quanto aos fa-  ma, as colónias não progrediam porque não
         gal formalizava a encomenda        ctores internos merecem realce: a Revolução  existia uma marinha capaz. Esta ligação
                                            Liberal seguida da Guerra Civil, o Rotativis-
                                                                               Marinha /Colónias foi uma constante ao
         daquele que viria a ser o seu pri-  mo e o desenvolvimento dos ideais republi-  longo do século, sendo comum a pasta go-
         meiro submersível, o Espadarte.    canos.                             vernativa que geria estes dois assuntos.
                                                                                 A situação alterou-se ligeiramente no final
                                              Estes acontecimentos tiveram uma influên-
         Decorridos que são 90 anos so-     cia bastante grande na forma como foram  do século. O interesse pelas colónias africanas
         bre esse acto, tão importante pa-  conduzidos os investimentos no sector públi-  aumentou duma forma significativa. Na Euro-
         ra a Marinha e para o País, arro-  co, nomeadamente na instituição militar.  pa as relações entre diversos países degrada-
                                            Durante a primeira metade do século as pre-
                                                                               ram-se em consequência desta disputa. Devi-
         jado e aventureiro para a                                                  do a uma dessas disputas relacionadas
         época face às incertezas                                                   com territórios africanos a Inglaterra
         resultantes dos primeiros                                                  apresentou a Portugal o famoso Ulti-
                                                                                    matum. Este gerou uma onda de con-
         passos que ainda davam os                                                  testação em Portugal, sendo organiza-
         submarinos como arma de                                                    da uma subscrição com o fim de obter
         guerra, não podia a Revista                                                verbas para aquisição de meios navais
                                                                                    para fazer face à afronta sofrida. Por
         da Armada deixar de assi-                                                  outro lado, esta questão foi aproveitada
         nalar tão importante efe-                                                  pelos republicanos, que consideravam
         méride. Facto ainda mais                                                   ser o rei o principal responsável pela si-
                                                                                    tuação criada. Nestas condições o país
         pertinente pela coincidên-                                                 vive os anos de transição do século XIX
         cia de estar em curso um                                                   para o XX num ambiente em que, por
         programa que visa esco-                                                    um lado, se nota uma vontade bastante
                                                                                    grande de melhorar a capacidade mili-
         lher os substitutos para os                                                tar do país, especialmente em termos
         actuais três submarinos da                                                 navais e, por outro, existe uma elevada
                                                                                    instabilidade devida à crescente in-
         Classe “Albacora”.                                                         fluência republicana, associada às ele-
           O século XX foi marcado por mu-                                          vadas dificuldades económicas que o
         danças radicais na Arte da Guerra no                                       país conhecia há muitos anos.
         Mar. Um dos factores que mais influ-
         enciou estas alterações foi a intro-                                       A LIGA NAVAL PORTUGUESA
         dução de dois tipos de plataformas no
         teatro de guerra naval: o avião e o sub-                                     No final do século XIX surge uma
         marino. Portugal adoptou estas duas                                        organização, a Liga Naval Portuguesa,
         armas poucos anos depois de come-  Almirante Azevedo Coutinho, Ministro da Marinha, que em   cujo objectivo principal era a mobili-
         çarem a ter utilização operacional. Es-  17 de Junho de 1910 encomendou o 1º submersível português.  zação de esforços para a renovação
         te artigo é dedicado ao primeiro sub-                                      da frota nacional. Criada em 1900,
         mersível que Portugal possuiu: o Espadarte.  ocupações centraram-se essencialmente  por iniciativa do então segundo-tenente Pe-
           A primeira parte será consagrada à cara-  sobre a Metrópole. As colónias foram pratica-  reira de Matos, que propôs ao Clube Militar
         cterização da época em que o Espadarte foi  mente esquecidas, devido à inexistência de  Naval que desenvolvesse as diligências ne-
         adquirido. Analisaremos, duma forma muito  um governo estável. Com o fim da Guerra  cessárias para a criação da dita liga. Funcio-
         sucinta, as condições políticas em Portugal  Civil notou-se um pequeno interesse pelos  nou nos seus primeiros tempos extrema-
         no início do século XX e os reflexos dessa si-  territórios africanos, nomeadamente Angola,  mente ligada àquele clube, esta liga assumiu
         tuação na nossa Marinha de Guerra (1). Se-  como alternativa ao Brasil, recentemente tor-  um papel semi-oficial, recebendo subsídios
         guidamente abordaremos a evolução históri-  nado independente. No entanto, foi um inte-  do governo e colaborando com ele na defini-
         ca do submarino, destacando os passos mais  resse sem continuidade, uma vez que a prin-  ção duma política naval.
         importantes até se chegar ao Espadarte e aos  cipal prioridade era recuperar dos efeitos da  Esta organização desenvolveu a sua activi-
         outros submersíveis da mesma época.  Guerra Civil.                    dade em moldes semelhantes aos praticados
                                              Na segunda metade do século assiste-se a  pelas suas congéneres europeias que muito
         PORTUGAL E A MARINHA NO INÍCIO     um desenvolvimento económico, que no en-  contribuíram para a corrida aos armamentos,
         DO SÉCULO XX                       tanto apenas se notou nalguns sectores da so-  que acabou por conduzir à Primeira Grande
                                            ciedade. As colónias continuaram a merecer  Guerra. Contudo, em Portugal os objectivos
           O século XIX foi bastante conturbado em  um interesse bastante reduzido. Entre os mo-  eram muito mais modestos. Num pequeno
         Portugal. Esta instabilidade foi provocada  tivos apontados para esse desinteresse conta-  texto sobre a renovação da nossa frota apon-
         tanto por razões externas como internas. En-  -se a reduzida capacidade naval, tanto para  tava-se essencialmente para a constituição de
         tre as primeiras podemos destacar: as Inva-  assegurar as ligações entre os diferentes pon-  forças com intuitos defensivos. Assim, defen-
         sões Francesas, a Independência do Brasil, a  tos do território nacional como para permitir  dia-se a aquisição de torpedeiros e submersí-
         partilha de África por várias potências euro-  a afirmação da soberania. Dito de outra for-  veis para a defesa da nossa costa e de canho-

         12 JUNHO 2000 • REVISTA DA ARMADA
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