Page 125 - Revista da Armada
P. 125
Patrão Moisés Macatrão
Patrão Moisés Macatrão
O ADEUS DE UM “LOBO DO MAR”
“O mar é muito forte, mas os homens outros, é o Patrão Moisés uma referência, um to marítimo, viu a Marinha reconhecer a sua
a quem Deus ajuda e encoraja, têm homem a quem as comunidades marítima em ímpar carreira com a atribuição do seu nome,
tanta força como ele ou ainda mais”. geral e a piscatória, em particular, muito de- em 1997, à primeira embarcação salva-vidas da
Patrão Joaquim Lopes vem. Foi, seguramente, um dos homens que nova classe “Rainha Dª Amélia”, a qual se en-
mais fez pelas gentes do mar. contra operacional ao serviço da Capitania do
de Janeiro de 2004. Na Figueira da Porto da Figueira da Foz.
Foz, o primeiro dia do novo ano fica O seu amor ao mar, pelo qual sempre teve
1 marcado por uma profunda tristeza: um enorme respeito, fazia com que não con-
o falecimento do heróico Patrão Moisés Ri- seguisse estar muito tempo sem o ter por
beiro Macatrão. Após anos de uma luta de- perto. E já mesmo nos últimos tempos da
sigual contra a doen ça, que enfrentou com sua vida, acompanhava, via rádio, o que ia
enorme coragem e grande apego à vida, acontecendo no mar.
uma última e traiçoeira “volta de mar” Também era grande o amor do Patrão
conseguiu finalmente varrê-lo do convés Moisés ao Instituto de Socorros a Náufragos
da vida e lançá-lo ao mar da eternidade. e à Marinha. E fez questão em ser transpor-
Para nós, homens do mar, o Patrão Moisés tado para a sua última morada num carro
estará sempre presente. de apoio ao salvamento no mar e de ser se-
Nascido em Peniche a 4 de Março de pultado uniformizado com a sua farda azul
1929, tinha o Patrão Moisés 14 anos quan- do botão de âncora. Assim aconteceu no dia
do se iniciou na pesca da sardinha. Aos 18 2 de Janeiro de 2004. O seu corpo, depois de
anos já colaborava como voluntário com o ter estado em câmara ardente na Igreja Ma-
Instituto de Socorros a Náufragos (ISN). triz da Figueira da Foz, foi transladado para
Mas é só em 11 de Março de 1960 que, na Peniche, onde após a cerimónia religiosa na
sua terra natal, ingressa no quadro do pes- Capela de Nª Senhora da Conceição, a urna,
soal do ISN com a categoria de sota-patrão. coberta com a Bandeira Nacional e a Bandei-
Dois anos depois é promovido a patrão de ra do ISN, seguiu para o cemitério local.
salva-vidas e é colocado na Estação Salva- No seu funeral, que contou com a presen-
-Vidas da Figueira da Foz, onde se apresen- Patrão Moisés Macatrão. ça de muita gente, do mar e não só, que lhe
tou em 2 de Março da 1962. Aqui prestou quis prestar a sua homenagem, a Marinha
serviço durante perto de 32 anos, até se apo- Tendo efectuado ao longo da sua carreira cen- esteve representada pelo Subdirector-Geral da
sentar, por razões de saúde, em 29 de Janeiro tenas de salvamentos, tem o Patrão Moisés uma Autoridade Marítima, CALM Tito Cerqueira,
de 1994, completando assim cerca de 34 anos folha de serviços invejável, da qual constam sete e pelos Capitães dos Portos da Figueira da Foz
ao serviço do salvamento marítimo. expressivos louvores, a Medalha Naval Vasco e de Peniche, respectivamente CFR Fidalgo de
Enquanto Patrão da Estação Salva-Vidas da da Gama, seis Medalhas de Coragem, Abne- Oliveira e CTEN Damásio Afonso, bem como
Figueira da Foz, da qual era o responsável, foi gação e Humanidade – duas de Ouro, três de por representações do ISN e das Capitanias, Co-
também patrão das embarcações salva-vidas Prata e uma de Cobre, e uma Medalha de Cobre mandos Locais da Polícia Marítima e Estações
“Rei D. Carlos I”, “Raínha Dª Amélia”, “Patrão de Filantropia e Caridade. Foi também agracia- Salva-Vidas da Figueira da Foz e de Peniche.
Rabumba”, “Patrão José André dos Santos” e do pela comunidade figueirense com três pré- Na mensagem de condolências que S.Ex.ª o
“Patrão Ezequiel Seabra”. Foram longos anos mios “Walter Bensaúde” e um prémio “Serviços Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada
durante os quais, apesar das tradicionais difi- à Comunidade”, pelos excelentes serviços pres- enviou à Esposa, Filhos e restante Família, pode-
culdades em recursos materiais e humanos com tados à comunidade marítima local. -se ler: “Os distintos e extraordinários serviços
que esta filantrópica actividade se vê nor- que o Sr. Patrão Moisés prestou ao longo
malmente confrontada, a capacidade de de 34 anos à Marinha e ao Instituto de So-
resposta da Estação Salva-Vidas se mante- Revista de Marinha corros a Náufragos, e portanto, a Portugal,
ve sempre em elevado grau de prontidão, foram oportunamente, em vida, por diver-
quase exclusivamente devido à brilhante sas vezes reconhecidos com a concessão de
acção do Patrão Moisés, que encarava a louvores e condecorações, e a atribuição
sua profissão como um verdadeiro sacer- do seu nome a uma das modernas embar-
dócio. Ele era a melhor garantia para a ex- cações salva-vidas que se encontram em
celência da qualidade do serviço público actividade. A sua memória sempre será
de salvamento marítimo da responsabili- lembrada pela Marinha e pelo Instituto
dade da Capitania do Porto da Figueira da de Socorros a Náufragos, ficando o seu
Foz, tendo sido para todos os Capitães do nome inscrito a letras de ouro na galeria
Porto com quem serviu, um colaborador Salva-vidas “Patrão Macatrão”. dos heróicos “Lobos do Mar” que com ex-
de excepção e de total confiança. Tendo merecido a distinção de ser condeco- cepcional coragem, enorme abnegação e eleva-
Homem destemido e valente, exigente, com rado pele então Ministro da Defesa Nacional da humanidade, se dedicam de alma e coração
espírito de sacrifício, humilde e com coração, na cerimónia oficial comemorativa do Centená- à salvaguarda da vida humana no mar”.
fazendo-se ao mar nas piores condições, arris- rio do ISN, realizada em 1992, o Patrão Moisés Z
cando a própria vida para salvar as vidas dos Macatrão, herói contemporâneo do salvamen- (Colaboração DGAM/ISN)
REVISTA DA ARMADA U ABRIL 2004 15