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Patrão Moisés Macatrão
                    Patrão Moisés Macatrão



                                O ADEUS DE UM “LOBO DO MAR”

         “O mar é muito forte, mas os homens  outros, é o Patrão Moisés uma referência, um  to marítimo, viu a Marinha reconhecer a sua
         a quem Deus ajuda e encoraja, têm   homem a quem as comunidades marítima em  ímpar carreira com a atribuição do seu nome,
         tanta força como ele ou ainda mais”.  geral e a piscatória, em particular, muito de-  em 1997, à primeira embarcação salva-vidas da
                            Patrão Joaquim Lopes  vem. Foi, seguramente, um dos homens que  nova classe “Rainha Dª Amélia”, a qual se en-
                                            mais fez pelas gentes do mar.      contra operacional ao serviço da Capitania do
             de Janeiro de 2004. Na Figueira da                                  Porto da Figueira da Foz.
             Foz, o primeiro dia do novo ano fica                                   O seu amor ao mar, pelo qual sempre teve
         1  marcado por uma profunda tristeza:                                   um enorme respeito, fazia com que não con-
         o falecimento do heróico Patrão Moisés Ri-                              seguisse estar muito tempo sem o ter por
         beiro Macatrão. Após anos de uma luta de-                               perto. E já mesmo nos últimos tempos da
         sigual contra a doen ça, que enfrentou com                              sua vida, acompanhava, via rádio, o que ia
         enorme coragem e grande apego à vida,                                   acontecendo no mar.
         uma última e traiçoeira “volta de mar”                                    Também era grande o amor do Patrão
         conseguiu finalmente varrê-lo do convés                                  Moisés ao Instituto de Socorros a Náufragos
         da vida e lançá-lo ao mar da eternidade.                                e à Marinha. E fez questão em ser transpor-
         Para nós, homens do mar, o Patrão Moisés                                tado para a sua última morada num carro
         estará sempre presente.                                                 de apoio ao salvamento no mar e de ser se-
           Nascido em Peniche a 4 de Março de                                    pultado uniformizado com a sua farda azul
         1929, tinha o Patrão Moisés 14 anos quan-                               do botão de âncora. Assim aconteceu no dia
         do se iniciou na pesca da sardinha. Aos 18                              2 de Janeiro de 2004. O seu corpo, depois de
         anos já colaborava como voluntário com o                                ter estado em câmara ardente na Igreja Ma-
         Instituto de Socorros a Náufragos  (ISN).                               triz da Figueira da Foz, foi transladado para
         Mas é só em 11 de Março de 1960 que, na                                 Peniche, onde após a cerimónia religiosa na
         sua terra natal, ingressa no quadro do pes-                             Capela de Nª Senhora da Conceição, a urna,
         soal do ISN com a categoria de sota-patrão.                             coberta com a Bandeira Nacional e a Bandei-
         Dois anos depois é promovido a patrão de                                ra do ISN, seguiu para o cemitério local.
         salva-vidas e é colocado na Estação Salva-                                No seu funeral, que contou com a presen-
         -Vidas da Figueira da Foz, onde se apresen-  Patrão Moisés Macatrão.    ça de muita gente, do mar e não só, que lhe
         tou em 2 de Março da 1962. Aqui prestou                                 quis prestar a sua homenagem, a Marinha
         serviço durante perto de 32 anos, até se apo-  Tendo efectuado ao longo da sua carreira cen-  esteve representada pelo Subdirector-Geral da
         sentar, por razões de saúde, em 29 de Janeiro  tenas de salvamentos, tem o Patrão Moisés uma  Autoridade Marítima, CALM Tito Cerqueira,
         de 1994, completando assim cerca de 34 anos  folha de serviços invejável, da qual constam sete  e pelos Capitães dos Portos da Figueira da Foz
         ao serviço do salvamento marítimo.  expressivos louvores, a Medalha Naval Vasco  e de Peniche, respectivamente  CFR Fidalgo de
           Enquanto Patrão da Estação Salva-Vidas da  da Gama, seis Medalhas de Coragem, Abne-  Oliveira e CTEN Damásio Afonso, bem como
         Figueira da Foz, da qual era o responsável, foi  gação e Humanidade – duas de Ouro, três de  por representações do ISN e das Capitanias, Co-
         também patrão das embarcações salva-vidas  Prata e uma de Cobre, e uma Medalha de Cobre  mandos Locais da Polícia Marítima e Estações
         “Rei D. Carlos I”, “Raínha Dª Amélia”, “Patrão  de Filantropia e Caridade. Foi também agracia-  Salva-Vidas da Figueira da Foz e de Peniche.
         Rabumba”, “Patrão José André dos Santos” e  do pela comunidade figueirense com três pré-  Na mensagem de condolências que S.Ex.ª o
         “Patrão Ezequiel Seabra”. Foram longos anos  mios “Walter Bensaúde” e um prémio “Serviços  Almirante Chefe do Estado-Maior da Armada
         durante os quais, apesar das tradicionais difi-  à Comunidade”, pelos excelentes serviços pres-  enviou à Esposa, Filhos e restante Família, pode-
         culdades em recursos materiais e humanos com  tados à comunidade marítima local.  -se ler: “Os distintos e extraordinários serviços
         que esta filantrópica actividade se vê nor-                                que o Sr. Patrão Moisés prestou ao longo
         malmente confrontada, a capacidade de                                     de 34 anos à Marinha e ao Instituto de So-
         resposta da Estação Salva-Vidas se mante-                                Revista de Marinha  corros a Náufragos, e portanto, a Portugal,
         ve sempre em elevado grau de prontidão,                                   foram oportunamente, em vida, por diver-
         quase exclusivamente devido à brilhante                                   sas vezes reconhecidos com a concessão de
         acção do Patrão Moisés, que encarava a                                    louvores e condecorações, e a atribuição
         sua profissão como um verdadeiro sacer-                                    do seu nome a uma das modernas embar-
         dócio. Ele era a melhor garantia para a ex-                               cações salva-vidas que se encontram em
         celência da qualidade do serviço público                                  actividade. A sua memória sempre será
         de salvamento marítimo da responsabili-                                   lembrada pela Marinha e pelo Instituto
         dade da Capitania do Porto da Figueira da                                 de Socorros a Náufragos, ficando o seu
         Foz, tendo sido para todos os Capitães do                                 nome inscrito a letras de ouro na galeria
         Porto com quem serviu, um colaborador   Salva-vidas “Patrão Macatrão”.    dos heróicos “Lobos do Mar” que com ex-
         de excepção e de total confiança.     Tendo merecido a distinção de ser condeco-  cepcional coragem, enorme abnegação e eleva-
           Homem destemido e valente, exigente, com  rado pele então Ministro da Defesa Nacional  da humanidade, se dedicam de alma e coração
         espírito de sacrifício, humilde e com coração,  na cerimónia oficial comemorativa do Centená-  à salvaguarda da vida humana no mar”.
         fazendo-se ao mar nas piores condições, arris-  rio do ISN, realizada em 1992, o Patrão Moisés        Z
         cando a própria vida para salvar as vidas dos  Macatrão, herói contemporâneo do salvamen-  (Colaboração DGAM/ISN)
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U ABRIL 2004  15
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