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No V Centenário do “Apóstolo das Índias”


         São Francisco Xavier e Portugal
         São Francisco Xavier e Portugal





















         Panorama de Lisboa e partida de S. Francisco Xavier para a Índia.
         Autor desconhecido – Séc. XVIII. Noviciado da Cotovia, MNAA.
               s frutos abundantes da evangeliza- XAVIER EM PORTUGAL           Hospital à procura de algum curativo, de
               ção de São Francisco Xavier, co-                                comida e de dormida. Todos os dias saem
         Onhecido por “Apóstolo das Ín-       Chegado a Lisboa depois de uma via-  para instruir e catequizar também noutros
         dias” e denominado pelo Papa João Paulo  gem de mais de três meses, a cavalo e a pé,  locais da cidade.
         II como “Missionário do Mundo”, devem-  desde Roma, através da Itália, da França e   Lisboa é, neste momento, a capital do
         -se, sem dúvida, à sua simpatia irradian-  da Espanha, Francisco Xavier procura Si-  mundo novo, descoberto pelos portugue-
         te, à sua alegria constante e ao seu maravi-  mão Rodrigues – o seu companheiro, para  ses. Há quatro décadas, Vasco da Gama
         lhoso poder de adaptação. Mas não seriam  seguirem para a Índia - que se instalara no  tinha aberto o caminho marítimo para a
         tão surpreendentes sem o ambiente por-  Hospital de Todos os Santos, onde servia,  Índia. Os portugueses lutaram e venceram
         tuguês, que o acolheu e amparou, desde  assistia e instruía os doentes. O Hospital  os mouros, que dominavam quase toda a
         o rei D. João III e a rainha D. Catarina, até  estava situado ao lado da Igreja de São Do-  África e o Sul da Ásia. Conquistaram Goa
         aos governantes e vice-reis da Índia, capi-  mingos e em parte da Praça da Figueira,  e Cochim, e, a seguir Malaca, a chave e o
         tães de portos, de navios e de fortalezas ou  não longe do Palácio Real (onde é hoje o  ponto de passagem de todo o comércio
         feitores de el-rei, mercadores, soldados e  Teatro D. Maria), onde D. João III os rece-  do Oriente.
         marinheiros, sem esquecer as autoridades  be, insistindo que nele se hospedem, por-  A convite do Rei, os novos missionários
         religiosas e membros do clero secular e das  que tinha por eles uma consideração espe-  passam os domingos a confessar na Corte
         ordens religiosas.                 cial. Eles, porém, como era seu costume,  e a instruir na doutrina cristã os pajens e
           São Francisco Xavier votou sempre a  persistem na ideia de viverem junto dos  demais jovens. E, em pouco tempo, de tal
         Portugal uma sincera e reconhecida ami-  doentes e dos marginais, que acorrem ao  forma mudaram os costumes daqueles jo-
         zade, afirmando-se “navarro                                                    vens, que toda a gente começou
         por nascimento e português de                                                  a chamar “apóstolos” aos seus
         coração”. Dos 138 textos que                                                   orientadores. Surpresa idêntica
         dele conhecemos, 92 estão es-                                                  manifestaram os habitantes de
         critos em português e metade                                                   Almeirim, quando a Corte ali foi
         de outros dois também em por-                                                  passar alguns meses de Inverno,
         tuguês. Agradecia assim, não só                                                perante a mudança de costumes
         o ter estudado cerca de dez anos                                               a que assistiam. De facto, os jo-
         no Colégio Português de Santa                                                  vens, que noutros anos, se ocu-
         Bárbara em Paris e o ter convi-                                                pavam unicamente em jogos de
         vido e trabalhado dez meses em                                                 caça e de galanteios em festas
         Portugal, antes de partir para o                                               cortesãs, agora, com a presença
         Oriente, mas também o facto                                                    dos “apóstolos”, era de admi-
         de ter tido todas as facilidades                                               rar vê-los à Missa todos os dias
         nas naus portuguesas, quer na                                                  e nas confissões de cada Sába-
         viagem de Lisboa para a Índia                                                  do, não gastando já todo o seu
         (mais de um ano!), quer depois                                                 tempo em caçadas e em festas
         nos percursos que realizou, du-                                                frívolas. “Esta Corte está muito
         rante os nove anos de missão                                                   reformada; e tanto que participa
         no Oriente, de Goa para Mala-                                                  mais de Religião que de Corte”
         ca, para as Molucas, de novo de                                                – escreve São Francisco a Santo
         Malaca para Goa, a ida e volta                                                 Inácio, fundador da Ordem dos
         de Goa ao Japão e, por fim, a                                                  Jesuítas, agradecendo a Deus.
         tentativa de chegar à China. Re-                                                O monarca, perante a transfor-
         conheceu sempre o reino de Por-                                                mação operada no ambiente da
         tugal e a terra portuguesa como   Imagens de Santo Inácio de Loiola e S. Francisco Xavier esculpidas na Índia no Séc. XVII.  casa e da família real, já não quer
         a sua pátria adoptiva.     Pertenceram a um antigo Convento de Diu – Museu de Marinha.  deixar “os apóstolos” partir para
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U MAIO 2006  17
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