Page 167 - Revista da Armada
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REGATAS
                                             REGATAS


                                   1. Brest – Las Palmas (1958)


             m ano de cinquentenário das denomina-  ção entre os grandes veleiros. Aproveitou-se  vegando à bolina, com amuras a estibordo , à
                                                                                                              3
             das Tall Ships’ Races, julgámos pertinen-  então para treinar toda a guarnição nas dife-  proa 185º, foi possível passar safa a bóia pouco
         Ete recordar, com algum pormenor, as re-  rentes manobras do pano, beneficiar e substi-  tempo depois, deixando-a por bombordo.
         gatas que tiveram veleiros portugueses como  tuir as partes do aparelho em más condições   Ao final da tarde o Mercator, mais arribado,
         vencedores. A primeira, Brest-Las Palmas, que  e rever todo o velame.  cortou a proa da Sagres, afastando-se lenta e
         a antiga Sagres logrou vencer logo na segun-  No dia 18 de Julho os jovens da Mocidade  progressivamente, ganhando cerca 1 milha até
         da edição do evento, e, mais tarde, em 1982,  Portuguesa passaram para as fragatas Nuno Tris-  ao cair da noite. Como resposta foram de ime-
         embora fora do quadro daquela organização,  tão e Diogo Gomes, que por essa ocasião ha-  diato caçados os cutelos e as varredouras.
         a travessia do Atlântico Norte, entre Newport  viam chegado a Brest, trocando posição com   A distância para o Christian Radich foi tam-
         e Lisboa, cujo laureado foi,                                                       bém aumentando, a ponto
         precisamente, o actual na-                                                         de este deixar de ser avistado
         vio-escola Sagres.                                                                 à popa, cerca das 20h00. Ao
           Importa referir, que, ao                                                        Arquivo Museu de Marinha  longo do primeiro dia a mar-
         longo de cinco décadas, tal                                                        cação do vento escasseou
         como sem limites ousaram                                                           ligeiramente e a sua intensi-
         os clippers do chá, os ven-                                                        dade aumentou um pouco,
         cedores das regatas sempre                                                         tendo entretanto caído logo
         estiveram entre aqueles que                                                        que a noite chegou.
         melhor conseguiram con-                                                              No dia seguinte o vento
         quistar o adversário co-                                                           manteve-se fraco (4 a 6 nós)
         mum – o mar –, selando,                                                            de NW e logo pela manhã
         no momento mais oportu-                                                            o Mercator voltou a cruzar a
         no, com o velho aliado de                                                          proa, desta feita para ocupar
         sempre – o vento –, o pacto                                                        posição na amura de estibor-
         mais favorável.                                                                    do. Apesar de bolinar melhor
           Dedicaremos ainda, por                                                           do que a Sagres, o diferen-
         fim, um artigo ao historial   A Sagres em primeiro plano e o Mercator ao fundo, na largada para a regata Brest-Las Palmas.  cial de velocidade entre os
         desta saudável competi-                                                            dois navios era mínimo.
         ção, disputada em sólidas bases de lealdade  os Guarda -Marinhas do curso D. Duarte de Al-  Na tentativa de minimizar o risco de o navio
                                                                                    4
         e amizade entre Marinheiros dos mais belos  meida, nelas embarcados.  ensacar  no golfo da Biscaia, navegou-se todo o
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         veleiros da actualidade . Como é do conheci-  Durante as regatas que tiveram lugar durante a  dia à bolina, tão chegado ao vento quanto pos-
         mento geral, a ela em grande parte se deve o  Semana de Vela, os Guarda-marinhas, agora em-  sível. Ao final da tarde o Mercator passou nova-
         presente culto prestado a estes Príncipes dos  barcados na Sagres, lograram vencer a competi-  mente para a amura de bombordo. Percebeu-se
         Oceanos. De outra forma, estamos certos,  ção em Vaurien, obtendo ainda o segundo lugar  então que a sua intenção, tal como se verificara
         muitos já só existiriam em recônditas gavetas  em Benodet e na prova de remo.   no dia anterior, seria manter-se a sotavento duran-
         do nosso imaginário, ou ainda em nostálgicas   No dia 2 de Agosto, pelas 7h45, o navio largou  te a noite, com o objectivo de não ser obrigado a
         e muito desbotadas imagens…        da bóia da Rade d’Abri, de Brest, onde se encon-  manobrar, tal como mandam as regras, caso os
           A antiga Sagres largou de Lisboa no dia 7  trava amarrado, com vista a tomar posição nas  rumos se viessem a tornar convergentes.
         de Julho de 1958 levando a bordo praças de  imediações da linha de largada. Esta situava-se   No terceiro dia, o fraco vento que se fazia
         vários cursos em instrução, bem como jo-  um pouco a sul da famosa ilha de Ouessant, de-  sentir começou a dar sinais de querer rodar para
         vens da Mocidade Portuguesa. Estes últimos  finida pelo draga-minas Alençon e pelo navio-pa-  NE chegando mesmo a soprar de ESE. Acabou
         efectuariam até Brest a primeira parte do seu  trulha Attentif, afastados entre si duas milhas.  por se fixar em ENE a partir das 18h00, numa
         treino de mar.                       Apesar da hora da largada se encontrar mar-  altura em que o Mercator se encontrava a pe-
           No dia 12, em pleno golfo da Biscaia, cujo  cada para o meio-dia, esta acabou por ser al-  quena distância pelo través de estibordo. Apro-
         mar é figura central nas histórias de mau tempo  terada para as 13h00, uma vez que uma boa  veitou-se então para ganhar oeste, navegando
         de muitos marinheiros, registou-se uma grave  parte dos veleiros demorou algum tempo a  a proas compreendidas entre os 220º e os 230º,
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         avaria na máquina de bombordo , num mo-  alcançar posição próxima da linha de partida.  no sentido de safar desde logo o possível ensa-
         mento em que o anemómetro a bordo registava  Ao longo das muralhas de Brest uma enorme  camento na Biscaia.
         velocidades do vento superiores a 60 nós. De  multidão observava, atenta, todas as movimen-  A manhã do dia seguinte não trouxe o ven-
         resto, este motor só viria a ser reparado no ar-  tações dos navios.  to esperado, caracterizando-se antes pela sua
         senal da Marinha Francesa após a chegada do   Como consequência do bom posicionamen-  direcção variável, com predomínio de NE. A
         navio a Brest, a 14 de Julho. Por se celebrar nessa  to, a Sagres passou pela linha de largada exac-  navegação foi feita de modo a montar o cabo
         data o dia nacional da França, a Sagres emban-  tamente às 13h00, logo seguida pelo Mercator,  Finisterra, tendo-se assistido ao refrescar pro-
         deirou em arco logo que concluída a manobra  colocado cerca de uma milha a barlavento,  gressivo do vento, a partir do meio da tarde. A
         de atracar naquele porto.          com o vento a soprar de WNW com 10 nós.  sua direcção fixou-se em NW, vindo a rondar,
           Durante a estadia no porto francês, por ab-  O Christian Radich, pela alheta de estibordo e  durante a noite, para norte.
         soluta falta de tempo em Lisboa, foi levada a  a uma distância de 3,5 milhas, só alcançou a   A 6 de Agosto, dobrado o cabo Finisterra às
         cabo toda a preparação do navio com vista à  linha meia hora mais tarde.  50 milhas com vento NNE, surgiu o momento
         sua participação na regata, no período compre-  Uma vez que o vento teimava em escassear, o  de efectuar a escolha entre um rumo próximo
         endido entre a sua chegada a Brest e o início  primeiro grande desafio que se colocava desde  da costa, ou um outro mais largo. O primeiro ti-
         da Semana de Vela, que decorreu na semana  logo era passar a barlavento da bóia «Ar Men»,  nha em vista aproveitar o efeito da nortada, mas
         imediatamente anterior ao início da competi-  situada um pouco mais a sul. No entanto, na-  também contra si jogava a probabilidade de se
                                                                                       REVISTA DA ARMADA U MAIO 2006  21
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