Page 192 - Revista da Armada
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1ª PARTE
Nos 450 anos do estabelecimento
Nos 450 anos do estabelecimento
dos portugueses em Macau
dos portugueses em Macau
PRÓLOGO A selecção das fontes e dos episódios histó- guiu a preparação da expedição que haveria
ricos, as imprecisões e os erros são, no entanto, de chegar à Índia, três anos mais tarde.
ste texto aborda o período que medeia da inteira responsabilidade do autor. O Mar e a Marinha de Portugal foram então,
entre 1509, data em que um enviado como nunca na sua História, o veículo da estra-
Ede D. Manuel I chega a Malaca com PORTUGAL: DA PRIMEIRA tégia de poder do soberano de um reino com
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ordens para se informar sobre a China e os GLOBALIZAÇÃO AOS apenas um milhão e meio de habitantes .
chineses, e 1557, ano tido como o do estabe- “FUMOS DA ÍNDIA” O Tratado de Tordesilhas (1494) fornecia a
lecimento dos portugueses em Macau. garantia de bom entendimento com Castela,
Passam assim, neste ano de 2007, quatro Na transição do século XV para o século no que dizia respeito às rotas marítimas.
séculos e meio sobre aquele acontecimento XVI, Portugal e a China eram dois reinos com Vivia-se, nas palavras de Charles Boxer [3]
histórico. territórios e populações desproporcionada- “…uma era de poder marítimo, de autoridade ba-
Aflora-se aqui o início da longa relação que mente diferentes, afastados pela geografia, pe- seada no controlo dos mares, detido apenas pelas
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se estabeleceu entre dois reinos e dois povos las tradições e pela História [14, 17, 18]. nações europeias… [Na história dos 500 anos
separados por quase meio mundo, feita de Ambos os países tinham remota notícia um que decorrem entre 1498 e 1945] nada é mais
encontros e desencontros, de amizades e con- do outro, já que as rotas terrestres, praticadas extraordinário do que o modo como os Portugueses
flitos mas também de cooperação e apoio em por comerciantes e campanhas militares, ape- conseguiram obter e manter, virtualmente duran-
momentos de adversidade. te todo o século XVI, uma posição
Em 1999 a China recuperou dominante no comércio marítimo
a administração do território. do Índico e uma parte importante
Foi um ciclo que se fechou e ou- do comércio marítimo a oriente dos
tro que se abriu. Por lá persiste estreitos de Malaca…”.
uma certa atmosfera, docemen- As especiarias eram carrega-
te mediterrânica, feita de velhos das na Índia, transportadas por
edifícios mas sobretudo de uma mar para Lisboa e apresentadas
comunidade caldeada nas rotas no mercado a preços inferiores
portuguesas para a China. às que eram oriundas da lon-
Este texto envolve também ga cadeia comercial associada
o mistério de uma pequena na- às rotas terrestres dos mesmos
ção, que se fez grande no Mar produtos.
que elegeu como veículo da sua A competitividade era esma-
afirmação. A História não vai gadora a favor da operação por-
apagar a sua presença de 450 tuguesa e os lucros proporciona-
anos numa pequena e remota dos situaram-se, durante algum
península do colossal território tempo, na mesma escala. No en-
da China. Viagens e estabelecimentos portugueses no Índico e costas da China - Séc. XV e XVI . tanto, os mercados foram fazen-
Incluem-se breves notas ex- do sentir as suas regras. Por um
plicativas, quando se entende que podem ser nas levavam rumores difusos sobre as respec- lado, as operações de compra no estrangeiro
de utilidade para que o Leitor encontre aqui o tivas existências. dos bens transportados de Lisboa para Goa (co-
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ponto de partida para aprofundar os seus co- Em Lisboa, D. Manuel I subiu ao trono em bre, chumbo, azougue e tecidos), que comple-
nhecimentos. 1495, na sequência da morte de D. João II. Foi mentavam a moeda como meio de pagamen-
No final do texto encontram-se também al- o décimo quarto rei de Portugal e o quinto da to das especiarias, careciam de financiamento,
gumas notas biográficas referidas a autores dinastia de Avis (1385-1580). muito caro e obtido normalmente através da
que escreveram sobre a matéria a partir de O poder do rei era então forte, centralizado, feitoria portuguesa então estabelecida em An-
Macau, e que se julgam menos conhecidos do considerado de origem divina, por vezes exer- tuérpia: a própria Coroa viu-se forçada a emitir
Leitor comum. cido de modo absoluto. títulos de dívida interna para conseguir saldar
Finalmente, um agradecimento ao CMG Jor- Um ano antes, o Tratado de Tordesilhas ti- os empréstimos – e seus gordos juros – contraí-
ge Semedo de Matos, que acedeu a ler o texto nha consagrado a divisão do mundo entre dos no exterior. Por outro lado, o preço das es-
e a contribuir com conhecedores e oportunos Portugal e Castela. Dando continuidade aos peciarias nos mercados europeus foi descendo,
reparos e sugestões. planos do seu antecessor, D. Manuel prosse- à medida que aumentava a sua oferta, oriunda
10 JUNHO 2007 U REVISTA DA ARMADA