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75 anos do afundamento do “Niobe”
                 75 anos do afundamento do “Niobe”

                                                    1932-2007

           O naufrágio do navio-escola da Reichsmarine  navegar à vela com todo o pano caçado o Niobe  que a existirem poderiam ter mantido o navio a
         em 1932, bem como a discussão que varreu a  adornou de tal forma que embarcou tamanha  flutuar por mais tempo ou evitando mesmo o seu
         sociedade germânica na sequência deste infortú-  quantidade de água, afundando em poucos mi-  afundamento, contribuindo assim para que mais
         nio, levaram à tomada da decisão no sentido de  nutos a norte da ilha de Fehmarn. No acidente  vidas pudessem ter sido salvas.
         ser construído de raiz um novo veleiro, obede-  perderam a vida 69 homens, incluindo muitos   Numa sentida cerimónia de homenagem às
         cendo aos mais exigentes requisitos de seguran-  jovens cadetes, salvando-se apenas 40 dos que  vítimas, o Niobe foi definitivamente afundado
         ça. Dez meses depois, o novo navio-escola bapti-  se encontravam a bordo.  com um torpedo a 18 de Setembro de 1933 e
         zado como Gorch Foch era lançado à água.  Por conseguinte, para tentar compreender as  em Kiel foi colocada uma enorme pedra como
                                            causas do naufrágio que ocorrera numa profun-  memorial, para que este acidente não mais fos-
         O                                                   Arquivo CTEN António Gonçalves  se esquecido.
               navio que naufragou em 1932 arvoran-
                                                                                 Esta tragédia e as subsequentes repercussões
               do bandeira alemã foi construído em
               1913 nos estaleiros Frederikshavn’s Værf
         og Flydedok, em Fredrikshavn, Dinamarca. Ha-                          por toda a sociedade alemã prepararam o terreno
                                                                               para o aparecimento duma nova classe de na-
         via sido concebido como lugre de quatro mas-                          vios-escolas e ditaram novas exigências ao nível
         tros e adquirido pelo armador F. L. Knakkegaard                       dos padrões de segurança por parte da Reichma-
         de Nyköbing que lhe pôs o nome Morten Jen-                            rine em relação aos seus navios. O Kapitänleut-
         sen. Três anos depois foi vendido a um armador                        nant Heinrich Ruhfus, comandante do Niobe na
         norueguês passando a chamar-se Tyholm. Em                             altura do acidente, foi levado a tribunal militar.
         Novembro de 1916, em plena Grande Guerra                              No entanto acabou por ser absolvido devido ao
         portanto, quando efectuava o transporte dum car-                      facto de ter ficado provado que as suas decisões
         regamento de madeira para Inglaterra foi captu-                       não colocaram o navio em risco e também por
         rado por um submarino alemão, sendo vendido                           se desconhecerem os verdadeiros motivos que
         no ano seguinte em hasta pública a um armador                         terão levado ao seu afundamento.
         germânico. Terminado o conflito foi registado por   O lugre-barca Niobe navegando à vela.  Com ao naufrágio do Niobe a Marinha Alemã
         duas vezes, primeiro como Aldebaran e mais tar-                       ficou sem o seu único navio-escola para dar trei-
         de como Schwalbe, tendo navegado como navio  didade de 20 metros, a 21 de Agosto desse mes-  no de mar os seus marinheiros e cadetes. Como
         mercante até finais de 1921. A 6 de Fevereiro de  mo ano a Reichsmarine conseguiu voltar a pôr  forma de ultrapassar esta situação foi então ela-
         1922, ciente da importância da existência dum  o navio a flutuar. Desta forma foram resgatados  borado um projecto para a construção de um
         veleiro para a formação dos seus futuros oficiais,  os corpos dos marinheiros e cadetes mortos que  novo veleiro, maior do que o Niobe. O governo
         o Schwalbe foi adquirido pela Reichmarine e au-  foram entregues às respectivas famílias, enquanto  alemão, compreendendo a importância da exis-
         mentado ao efectivo. Recebeu o nome Niobe e  que o navio foi rebocado para Kiel a fim de ser  tência dum navio com estas características, dispo-
         no final desse ano foi alvo de várias alterações,  inspeccionado. Mesmo assim não foi possível  nibilizou uma verba de 200.000 marcos alemães
         tanto ao nível do interior como do aparelho, para  apurar com rigor as verdadeiras razões do aci-  para financiar a sua construção. Mas também o
         ser utilizado como navio-escola. Abandonada a  dente, embora tenha sido admitido um eventual  povo anónimo contribuiu para a construção do
         armação original em lugre, foi aparelhado como  erro de cálculo no lastro do navio, cerca de 150  novo navio, individual e colectivamente, depois
         barca de três mastros, aparelho bem mais exigen-  toneladas a menos do que o necessário. Este va-  do naufrágio do Niobe ter alimentado durante
         te do ponto físico tendo em vista o embarque de     Arquivo CTEN António Gonçalves  meses acesas discussões por toda a Alemanha.
         cadetes. No entanto, nos últimos anos navegou                           Antes de encomendar o navio ao estaleiro
         como lugre-barca, a partir do momento em que                          Schiffswerft & Maschinenfabrik Blohm & Voss, e
         lhe foi retirada a vela de papafigo do mastro                          com base na análise aos indícios que terão esta-
         grande, essencialmente devido ao facto de esta,                       do na origem do afundamento do Niobe, foram
         quando caçada conjuntamente com o latino                              definidos alguns requisitos que a nova constru-
         grande, não permitir que nenhuma das duas ti-                         ção deveria satisfazer, dos quais destacamos os
         vesse bom rendimento.                                                 mais relevantes: existência de vergas volantes;
                                                                               compartimentação estanque; chapa de aço fe-
                 Características do Niobe                                      chando todo o convés sob o tabuado; e mastros
            Comprimento fora-a-fora  58,0 m                                    cuja altura não fosse além dos 39,5 metros com
                  Boca            9,2 m                                        os respectivos mastaréus acachapados. Todos
                  Calado          5,2 m                                        estes requisitos estiveram na base da construção
            Altura do mastro grande  43,8 m                                    do Gorch Fock I, sendo que os mesmos precei-
               Deslocamento      724 tons                                      tos foram igualmente observados nos demais na-
               Superfície vélica  953 m 2                                      vios da classe: Horst Vessel (1936) – actual Eagle
                                                                               (1945); Albert Leo Schlageter (1937) – actual na-
           A bordo do Niobe, dada a sua função de   Memorial ao naufrágio do Niobe.  vio-escola Sagres (1962); Mircea (1938); Herbert
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         navio-escola, não foi instalado qualquer tipo  lor ficou expresso no relatório elaborado no que  Norkus (1939); e Gorch Fock II (1958) .
         de armamento e a partir de 1923 efectuou inú-  concerne às causas prováveis do naufrágio, no          Z
         meras viagens de instrução nos mares do Nor-  qual se admitia também que a colocação de ver-  António Manuel Gonçalves
         te e Báltico.                      gas com vista à conversão do seu aparelho em                    CTEN
           Nove anos depois, mais precisamente a 26  barca, fazendo subir o respectivo centro de gra-  am.sailing@hotmail.com
         de Julho de 1932, deu-se o naufrágio. Durante  vidade, pudesse igualmente estar na origem do   Notas
                                                                                 1  Ver «A Sagres e os seus irmãos» e «A construção
         uma viagem de instrução no Báltico, uma tem-  acidente. Além disso, e como agravante, foi igual-  do “Albert Leo Schlageter” – Os primórdios da Sagres»,
         pestade que a todos colheu de surpresa, levou  mente considerada uma lacuna grave o facto do   Revista da Armada, Fevereiro a Junho e Setembro/Ou-
         ao súbito aumento da intensidade do vento. A  navio não dispor de compartimentos estanques,   tubro de 2004 e Setembro/Outubro de 2007.

         14  JANEIRO 2008 U REVISTA DA ARMADA
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