Page 12 - Revista da Armada
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pos de trabalho, sendo de realçar a criação da e de Organização no Instituto Superior Naval afectados pelo incêndio, como a oferta por aquele Mi-
classe de fuzileiros em 1961, que considerava de Guerra, sendo autor do Ciclo de Lições de nistério da cedência imediata de qualquer dos edifí-
imprescindível para a defesa dos interesses Estratégia e Ciclo de Lições de Organização, pu- cios que lhe estavam adstritos […] Após uma rápida
portugueses em África. blicações que, durante décadas, constituíram visita a alguns deles, foi escolhido o antigo Convento
referências para o estudo destas matérias. das Trinas […]»6.
Na sequência da invasão do território do
Estado da Índia Portuguesa, pelas tropas da Pelo facto de não ser propriamente um in- Nos quase seis anos que levou como Mi-
União Indiana em Dezembro de 1961, publi- condicional do regime, a sua nomeação para nistro da Marinha, foram diversos os desen-
cou nos Anais do Clube Militar Naval a sua aná- Ministro da Marinha colheu de surpresa mui- volvimentos que resultaram da sua iniciativa,
lise dos acontecimentos, colocando ênfase na designadamente, a reorganização da estrutu-
fragilidade da posição portuguesa, em gran- tos dos seus amigos. Assumiu o cargo no dia ra das Forças Armadas nas províncias ultra-
de medida fruto da disparidade das forças 20 de Agosto de 1968, tendo sido promovido a marinas; a criação do Grupo de Estudos de
em confronto. Contra-almirante a 24 de Janeiro de 1969. História Marítima, precursor da Academia
de Marinha; a criação da Força de Fuzilei-
Em 1963 viu promulgada a profunda Numa interessante entrevista que, como ros do Continente e da Direcção de Infra-
reformulação da Ordenança do Serviço Naval Ministro da Marinha, concedeu aos Anais -estruturas; as novas instalações do Instituto
(OSN), que efectuou durante a sua passagem do Clube Militar Naval em 1969, afirmou que Hidrográfico; a criação da Revista da Armada e
pelo EMA. Assumiria, em Outubro desse ano, a sua maior preocupação era «modificar as do Gabinete de Heráldica Naval; a assistência
o comando da Flotilha de Draga-minas, que condições em que os militares da Armada vivem hospitalar, médica e medicamentosa ao pes-
exerceu em acumulação com a frequência do e servem»4. Neste sentido, procurou encon- soal da Armada e seus familiares; a edificação
Curso Superior Naval de Guerra. Pelo facto de trar uma solução adequada para o problema do supermercado da Marinha; e a criação dos
ter sido o melhor classificado do Curso, foi-lhe do Hospital da Marinha e para a assistência Conselhos das Classes da Armada.
atribuído o Prémio Almirante Américo Tomás. médica às famílias dos militares. Quanto às
No ano seguinte frequentou ainda o Special preocupações que não tinham directamente Contam-se também, neste período, a
Weapons Orientation Course, na Intelligence, a ver com o pessoal, elas passavam por: construção de diversos navios – alguns deles
Military and Special Weapons School Europe. no Arsenal do Alfeite – além da aquisição de
«[…] transformar o Arsenal do Alfeite num outros no estrangeiro. Relativamente ao Arse-
Concluído o CSNG, cessou igualmente as estabelecimento fabril eficiente; acabar com as nal do Alfeite, procedeu à sua militarização e
funções de Comandante da Flotilha de Dra- enervantes demoras na construção das novas reorganização, com o objectivo de aí ser feita
ga-minas, assumindo a chefia da 1.ª Divisão infra-estruturas; problema do edifício do Minis- a manutenção dos novos navios da Armada.
do EMA (Organização), cargo que desempe- tério da Marinha que carece duma solução global; Tendo em vista esse desiderato, foram cons-
nhou, durante mais de dois anos. Por inerên- instalação do Instituto Hidrográfico em Paço de truídas a doca seca e a doca flutuante, esta
cia, voltou a presidir à Comissão Permanente Arcos; criar nos Jerónimos um grande centro cul- última com recurso ao aço que havia sido im-
de Infra-estruturas da Armada, precursora da tural da Marinha que compreendesse o Museu, portado durante a Segunda Guerra Mundial.
actual Direcção de Infra-estruturas. Importa a Biblioteca, o Arquivo e o Grupo de Estudos de
sublinhar que em 1964 exerceu, por duas ve- História Marítima (que poderá ser o embrião de Consumado o golpe de Estado, o Contra-
zes, as funções de Capitão de Bandeira a bor- uma Academia de Marinha); acelerar a constru- -almirante Pereira Crespo e outros membros
do de dois paquetes utilizados na ligação entre ção das infra-estruturas dos novos navios; cons- do governo foram levados, sob prisão, para o
Portugal e as províncias africanas, primeiro no truir um supermercado em Alcântara, […]»5. quartel de Engenharia da Pontinha. Diz no seu
Vera Cruz e, pouco tempo depois, no Niassa. último livro que,
Na sequência do incêndio que a 18 de Fe-
Em 1965 integrou a Comissão de Estudo vereiro destruiu as instalações do Instituto Hi- «Ao amanhecer, vi o terreiro fronteiro ao edi-
para as novas instalações do Instituto Hidro- drográfico, que nessa época funcionava na an- fício em que me encontrava preso, cheio de fuzi-
gráfico, sendo de realçar a marca profunda tiga Sala do Risco, o Contra-almirante Pereira leiros, com as suas boinas pretas e os seus cordões
que deixou no EMA, concluídos os cerca de 9 Crespo compareceu no local, aí acompanhan- vermelhos. Era a tropa que, com tanto trabalho e
anos em que aí prestou serviço, como atesta o do os trabalhos de salvamento e rescaldo. De carinho eu tinha ajudado a criar e a estruturar,
testemunho do Vice-almirante Silva Horta: acordo com o testemunho do Vice-almirante para que a Marinha, mais valiosamente, pudesse
Barahona Fernandes, defender o Ultramar português»7.
«Pela facilidade com que definia e dissecava um
problema. Pela abertura de espírito com que escuta- «[…] com o seu prestígio e aproveitando o efei- Muito crítico do processo que levou à inde-
va opiniões e sugestões. Pela clareza do raciocínio to de choque […] conseguiu em dois dias obter do pendência das províncias ultramarinas, consi-
que conduzia à solução»3. ministro das Finanças não só uma verba de 70 000 derava que não haviam sido acautelados os in-
contos […] destinada à reinstalação dos serviços teresses de Portugal nem os dos portugueses
Em muitas áreas, e com o seu precioso con- que aí viviam. Disso mesmo deixou testemu-
tributo, a Marinha conheceu, em meados dos nho no seu livro Porque perdemos a guerra (1977)
anos 60, diversos desenvolvimentos, como porque, tal como ele antecipara, as facções ri-
a criação do Centro de Instrução de Minas e vais, com apoio militar da União Soviética, de
Contramedidas, do Grupo n.º 2 de Escolas da Cuba e dos Estados Unidos, haviam já entrado
Armada, dos Comandos Navais do Continen- em conflito aberto em Angola e Moçambique.
te e dos Açores e do Comando da Defesa Marí-
tima da Madeira, além do Centro de Instrução Depois de ter sido distinguido com inúme-
de Táctica Naval (CITAN). Foi também por ros louvores e as mais altas condecorações, a
esta altura que foi criada a esquadrilha de lan- espiral de acontecimentos que se sucedeu ao
chas do lago Niassa, em Moçambique, essen- 25 de Abril de 1974 impediu que a Marinha
cial para contenção dos ataques que se verifica- pudesse continuar a contar com o prestígio, a
vam no norte daquela província ultramarina. dedicação e os conhecimentos do Contra-al-
mirante Manuel Pereira Crespo. Antevendo o
A 14 de Setembro de 1966 foi promovido rumo que os acontecimentos iriam tomar, foi
a Comodoro, passando a desempenhar fun- ele próprio quem a 29 de Abril de 1974 tomou
ções de adjunto do Chefe do Estado-Maior a iniciativa de pedir a passagem à situação de
da Armada, onde prosseguiu o trabalho de reserva, que mereceu deferimento uma sema-
reorganização da Marinha. Foi neste período na depois, no dia 6 de Maio.
professor efectivo das cadeiras de Estratégia
12 AGOSTO 2011 • REVISTA DA ARMADA