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DOUTRINA NAVAL

Adoutrina naval indica como a Ma-                  manos, à organização e às actividades da Ma-      vontade dos seus membros, quando desliga-
         rinha deve cumprir a sua missão           rinha; ordena as relações da instituição com      das de uma doutrina que exprima, com ver-
         ao serviço de Portugal. Por isso,         o seu pessoal e com os públicos de interesse      dade, a consciência pública e a tradição histó-
relaciona-se intensamente com a teoria, a es-      externos; decreta o quadro de acção segundo       rica sobre como deve cumprir a sua missão.
tratégia e a lei aplicável a esta instituição pú-  o qual a Marinha, em nome do Estado, exerce
blica. Todavia, cada um destes instrumentos        a autoridade pública.                                A doutrina naval portuguesa está generi-
de construção da Marinha tem finalidades,                                                            camente expressa nos paradigmas da “Mari-
funções e acções distintas, insubstituíveis e         Admitindo como válida a lógica sequen-         nha Equilibrada”, da “Marinha Optimizada”
complementares, que necessitam de ser com-         cial de desenvolvimento dos instrumentos          e da “Marinha do Duplo Uso”. Estes mode-
preendidas e respeitadas por quem participa        de construção da Marinha, a doutrina situa-       los de representação traduzem fielmente o
na sua elaboração e aplicação.                     -se entre a teoria e a estratégia, e tem como     entendimento que se aperfeiçoou em Portu-
                                                   finalidade adoptar e prescrever princípios,       gal ao longo dos tempos, sobre a necessida-
    Neste texto, forçosamente sucinto, par-        orientações e medidas para edificar, estru-       de e utilidade da Marinha. Para além disso,
tilho com os leitores o meu entendimento           turar e empregar os meios da Marinha. Por         visam legitimar e motivar a prossecução das
sobre o essencial do conteúdo de cada um           isso, escolhe e fixa as actividades da Marinha.   acções genéticas, estruturais e operacionais
daqueles instrumentos, evidenciando os as-         Neste âmbito: elege as grandes ideias que ser-    destinadas a conferir renovada capacidade
pectos fundamentais da                             vem de referência e inspiração às actuações
sua interacção recíproca,                          da Marinha e converte-as em paradigmas de                               à Marinha. Por isso, os
e enunciando os prin-                              representação; dita os esforços individuais e                           três paradigmas propor-
cipais requisitos a que                            colectivos dos diferentes sectores da Marinha;                          cionam formas padro-
obedece o desenvolvi-                              preceitua uma linguagem e propósitos mobi-                              nizadas de olhar para a
mento e a utilização da                            lizadores e unificadores do esforço de todos                            realidade interna e exter-
doutrina naval portu-                              no cumprimento das respectivas tarefas.                                 na da Marinha, e poten-
guesa.                                                                                                                     ciam a sua influência no
                                                      Importa realçar que a doutrina, embora                               quadro da prescrição de
    A teoria tem como fi-                          sendo posterior à formação da teoria a que                              como deve preparar e
nalidade criar e renovar                           recorre, é autónoma relativamente às suas                               empregar os seus meios,
os conceitos e métodos                             formulações ou interpretações. Para além                                tendo em consideração as
para edificar, estruturar                          disso, a doutrina é modeladora e dispositiva,                           competências de outros
e empregar os meios                                uma vez que, como escolhe e fixa as activida-                           organismos públicos e as
da Marinha. Por isso,                              des da Marinha, influencia a estratégia e a lei,                        necessidades dos portu-
concebe e regenera as                              contribuindo, assim, para que estas evoluam                             gueses.
actividades da Marinha.                            progressivamente, de forma a manterem-se
Neste âmbito: desenvol-                            ajustadas à realidade dinâmica da conjuntu-                                 Como a doutrina naval
ve, com criatividade e                             ra interna e externa do país. Porém, também                             portuguesa tem estas duas
sistematização, configu-                           importa realçar que a doutrina é informada,                             importantes aptidões, o
rações ainda não existentes sobre os aspectos      pormenorizada e condicionada pela estraté-                              seu desenvolvimento foi
relativos à preparação e ao emprego da Ma-         gia e pela lei. Sendo isto inquestionável, supor  regulado pelos princípios da eficiência e da
rinha; sustenta, com clareza, objectividade e      que a estratégia e a lei bastam para construir a  eficácia, e a sua aplicação prática tem sido
profundidade, o que a Marinha deverá fazer;        Marinha, é uma atitude de alto risco, porque      muito judiciosa. Para além disso, houve o cui-
reproduz, com rigor, abstracção e abertura, o      muitas organizações viram hipotecado o seu        dado de garantir que não estabelece dogmas
pensamento, a observação e a experiência da        futuro, pela execução de planos de acção ou       nem procedimentos e, ao mesmo tempo, é
Marinha.                                           adopção de regras irredentistas. A observa-       dinâmica e flexível para se adaptar à realida-
                                                   ção dos factos mostra que, em qualquer orga-      de, e suficientemente estável de modo a pos-
    A estratégia tem como finalidade formu-        nização pública ou privada, a estratégia e a lei  suir durabilidade. Também foi realizado um
lar e operacionalizar o plano de acção para        podem ter efeitos corrosivos no espírito, pro-    esforço considerável, no sentido de garantir
edificar, estruturar e empregar os meios da        vocar desvios comportamentais e perverter a       a sua clareza, uma redacção sem excessivo
Marinha. Por isso, exprime e programa as                                                             detalhe e uma adequada focalização no cum-
actividades da Marinha. Neste âmbito: de-                                                            primento da missão da Marinha.
duz os objectivos que lhe cumpre alcançar;                                                              Do exposto fica evidente que é do tra-
analisa estes objectivos, os requisitos deles                                                        balho intelectual realizado pelos teóricos,
decorrentes e as pré-condições que a conse-                                                          pelos doutrinadores, pelos estrategistas e
cução de cada objectivo requer, e estabelece                                                         pelos legisladores, revelando compreensão
pressupostos; avalia os recursos disponíveis                                                         e respeito pelas finalidades, funções e acções
e potenciais relativamente aos requisitos e às                                                       distintas, insubstituíveis e complementares
pré-condições requeridas; estabelece, a par-                                                         de cada um dos instrumentos de construção
tir desse processo, um conjunto coerente de                                                          da Marinha, que resultarão as bases sólidas
prioridades, bem como os meios e as formas                                                           da sua preparação e emprego, enquanto ins-
para os atingir, assegurando a coerência das                                                         tituição pública que desempenha, simulta-
acções sectoriais a realizar.                                                                        neamente, as tarefas típicas de Armada e de
                                                                                                     Guarda Costeira, estando dotada de meios
    A lei tem como finalidade instituir e impor                                                      equilibrados, possuindo uma estrutura op-
as regras públicas para edificar, estruturar e                                                       timizada e realizando actividades de duplo
empregar os meios da Marinha. Por isso, ins-                                                         uso ao serviço de Portugal.
taura e determina as actividades da Marinha.
Neste âmbito: fixa as atribuições e competên-                                                                                António Silva Ribeiro
cias da Marinha; normaliza os aspectos relati-                                                                                               CALM
vos à política naval, aos meios materiais e hu-

4 DEZEMBRO 2011 • REVISTA DA ARMADA
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