Page 8 - Revista da Armada
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1 VIAGEM, 1 NAVIO, 18 NACIONALIDADES
Adiplomacia naval é, por tradi- Um navio como a Sagres contribui te por parte da Marinha Portuguesa,
ção histórica, uma das mais re- para as componentes de construção funcionando a Sagres como um veículo
levantes funções desempenha- de conhecimento situacional e, de preferencial para a sua concretização.
das pelos navios das marinhas de todo forma ainda mais vincada, de refor- Nesse sentido, ano após ano, tem vin-
o mundo. ço do relacionamento diplomático. do a aumentar o número de militares
Julian Stafford Corbett identificou No quadro desta última componen- estrangeiros que embarcam na Sagres,
(no seu livro England in the se- bem como de países de onde
ven years war, datado de 1907)
a função de apoiar ou obstruir são originários. Na viagem
deste ano, atingiu-se o número
o esforço diplomático, como recorde de 17 nacionalidades
uma das principais funções
das marinhas. Todavia, Cor- (além da portuguesa, natural-
mente), representadas por 19
bett referiu-se sobretudo a militares – maioritariamente
empenhamentos em situações
de elevada intensidade e de cadetes, mas incluindo tam-
bém alguns jovens oficiais e al-
elevado grau de ameaça (i.e. si- gumas praças. Os países repre-
tuações de guerra ou próximas,
no espectro dos conflitos), não sentados foram Angola, Ale-
manha, Argélia, Brasil, Cabo
aprofundando muito a função Verde, Espanha, Estados Uni-
diplomática em tempo de paz.
Essa lacuna foi sendo preen- dos da América, França, Itália,
chida ao longo do séc. XX por Marrocos, Moçambique, Poló-
importantes estrategistas marí- NRP Sagres navegando com todo o pano entre Mindelo (Cabo nia, Reino Unido, São Tomé e
Verde) e Ponta Delgada (Açores). Príncipe, Timor-Leste, Tunísia
timos, como os Almirantes Ser- e Turquia. O embarque destes
gey Gorshkov, da Marinha So-
viética, e Stansfield Turner, da jovens oficiais e cadetes, além
de fortalecer os laços entre países
Marinha Americana. A década (com efeitos imediatos e a lon-
de ’70 do séc. passado assistiu
à publicação de dois livros que go prazo), permite a partilha
de experiências e de conhe-
constituem verdadeiras refe- cimento, e possibilita à nossa
rências sobre diplomacia naval:
The Political Uses of Sea Power Marinha evidenciar o seu talent
de bien faire, facto amplamente
(1974), do americano Edward reconhecido pelos militares es-
Luttwak, e Navies and Foreign
Policy (1977), do britânico Ken trangeiros. Além disso, a for-
mação dos cadetes nacionais
Booth. (principal missão da Sagres)
Já neste século, Geoffrey Till
deu mais um contributo impor- Grupo de jovens oficiais e cadetes estrangeiros embarcados na Sagres. acaba por ser amplamente va-
lorizada com esta troca cultu-
tante para a conceptualização ral, que fomenta o respeito por
da diplomacia naval, no seu
livro Seapower: A Guide for the diferentes culturas e religiões,
obriga a falar outras línguas
Twenty-First Century (2004). Se- (sobretudo inglesa e francesa)
gundo ele, “a diplomacia naval
(…) tornou-se (…) uma impor- e promove o espírito de corpo
numa perspectiva multicultu-
tante e declarada função das ral – aspectos que constituem
marinhas e um motivo para as
ter. Já não é meramente uma uma mais-valia inestimável
para a formação dos cadetes
espécie de bónus, algo que as da Escola Naval.
marinhas fazem quando não
há conflitos a travar”. Nesse en- Para aferir do sucesso des-
ta forma, crescentemente im-
tendimento, Geoffrey Till siste- portante, de diplomacia naval,
matizou a diplomacia naval em
três componentes, que podem Militares portugueses e estrangeiros ferrando pano. nada melhor do que transcre-
ver extractos dos depoimentos
ser livremente traduzidas por: de alguns dos militares estran-
• Construção de conhecimento situa- te, têm vindo a ganhar importância o geiros que embarcaram, este ano, na Sa-
cional (recolha, processamento e disse- intercâmbio de pessoal entre estados- gres, os quais se considera serem revela-
minação de informação); -maiores, o intercâmbio entre cadetes dores do sucesso desta iniciativa.
• Coerção naval (dividida em dissua- das escolas navais e o embarque em
são e coacção); navios estrangeiros.
• Reforço do relacionamento diplo- Este último aspecto é um dos que CFR Nuno Sardinha Monteiro
Comandante do NRP Sagres
mático. tem merecido uma atenção crescen-
8 DEZEMBRO 2011 • REVISTA DA ARMADA