Page 15 - Revista da Armada
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numa derrota militar, onde perdemos cer- maneira de ser, como o é agora em que a Foto 1SAR FZ Pereiranheiros de corpos esfrangalhados, chaman-
ca de 7.500 homens, entre mortos, feridos e integração numa grande comunidade in- do pelos entes queridos que não voltariam
desaparecidos. Foi uma pesada dor a dessas ternacional, como a União Europeia, nos a ver. É duro recordar publicamente aquilo
baixas que, em sublime acto de amor, de- pode reduzir à simples qualidade de pe- que alguns de nós vivemos, mas é impor-
ram as suas vidas pela Pátria, na linha do queno número sem expressão, sem rele- tante fazê-lo para que todos procuremos
que tantos dos nossos antepassados tinham vância. Acresce ainda, que a independên- ser dignos desse passado, construindo um
feito antes e como muitos outros milhares o cia que o poder económico nos retirou é futuro melhor, mais nobre e independente
viriam a fazer, depois, até aos nossos dias. vital que seja recuperada, através de uma para Portugal, Pátria de tantos heróis e de
vontade firme e de uma capacidade de sa- tantos Soldados e Marinheiros Desconhe-
Há, assim, nesta nossa romagem um crifício e de amor à Pátria que o exemplo cidos, mas nobres e valentes.
sentido tão amplo quanto os tão diversos dos nossos homenageados nos pode aju-
tempos e lugares em que portugueses de- dar a conseguir. Esta evocação assume aqui especial
ram a vida por Portugal. De Guimarães a significado, por ter lugar no chão glorio-
Ourique, da Batalha Real, tra- Tal como em 1 de Dezembro de 1640, te-
vada aqui a uns passos, em mos de ser outra vez nós mesmos, o povo so da Batalha, junto ao Cam-
São Jorge, às Batalhas da Res- que não aceita jugos, o povo que foi capaz po de São Jorge, onde ainda
tauração, ou então das Linhas de não se perder nos mares do mundo, o ecoa a voz de um Povo que
de Torres às linhas do mun- povo que quer outra vez demonstrar que quis continuar independente e
do inteiro, nas terras de qua- tem direito a continuar a ter a Pátria hon- que, em 1383/1385, lutou con-
tro continentes e nos mares rada que construiu em quase nove séculos tra o mais forte, na defesa do
de três oceanos, foram quase de história. Precisamos de fazer outro pri- que era seu havia já 240 anos.
nove os séculos e os mais va- meiro de Dezembro, também com a mes- Lutou e venceu. Não éramos
riados os lugares em que, para ma força da vontade, da determinação, muitos, éramos até poucos,
engrandecer a Pátria portu- como naquele de 1640, mas agora usando mas estávamos unidos e com
guesa, lutámos e muitos mor- outras armas, as armas do trabalho, da in- vontade férrea e, por isso, fo-
reram por ela. teligência e da honestidade. mos os suficientes.
Todos esses portugueses, Muito do nosso Povo já não conheceu o Depois, a seguir, apertados
soldados, marinheiros e avia- que foi o sacrifício dos nossos soldados, ma- entre as fortes espadas tole-
dores, são aqui homenageados rinheiros e aviadores que combateram em danas e a parede do mar, os
permanentemente, mas hoje com especial África e na Índia, mas alguns terão ainda Portugueses tiveram a inteli-
ênfase pela força desta iniciativa da Liga na mente e no corpo as marcas dessas lu- gência, o saber e o arrojo para derrubar a
dos Combatentes. tas. Os corações de algumas mães recorda- parede, seguindo mar fora com a vontade
rão os gritos que não ouviram, a milhares de serem grandes. Foi uma vontade conse-
Trata-se, pois, de expressar um senti- de quilómetros, dos filhos agonizantes e os guida de serem até os maiores desse tempo,
mento de gratidão muito próprio do nosso combatentes vivos também não esquecem, realizando uma gesta que mudou o mundo.
Povo, muito português, mas também com noite e dia, os brados de dor dos compa- Sinal emblemático da inteligência, des-
raízes na civilização ocidental, de que so- sa determinação e dessa união dos portu-
mos parte, de base cultural grega, romana gueses foi o da construção desta abóbada
e cristã. De facto, já os Gregos, pelo menos que protege o túmulo dos nossos Soldados,
há 2500 anos, em Atenas, homenageavam como aqui referiu José Hermano Saraiva. A
publicamente os seus heróis. abóbada é formada por pedras,
A oração de Péricles de elogio as quais, isoladamente, cairiam
aos mortos e ao poder demo- sujeitas à lei da gravidade. Bem
crático, tão viva e pormenori- unidas não caíram. A abóbada
zadamente relatada por Tucí- não caiu, a abóbada não cai-
dides, dá disso testemunho, rá, como disse o seu constru-
assim como as celebrações ca- tor, um subordinado de Nuno
tólicas em memória dos fale- Álvar es Pereira.
cidos, desde há 2000 anos, são
disso exemplo. E se, tal como as pedras da
abóbada, nós hoje soubermos
Procuramos, assim, honrar estar unidos protegendo os
os nossos heróis e mártires, nossos valores e o nosso Chão
uns conhecidos com nomes Sagrado, com uma visão inteli-
que a nossa memória colecti- gente de futuro, a Pátria conti-
va imortalizou e, outros, des- nuará imorredoura pelos tem-
conhecidos de quem sabemos pos fora e os vindouros olharão
apenas que tombaram nos campos e mares para nós com a consideração e o respeito
de batalha, por nós, para que tenhamos di- semelhantes aos que temos pelos nossos
reito a ter uma pátria honrada e respeitada, antepassados.
a Pátria portuguesa. Homenageemos, pois, neste momento
único, todos os que sofreram, lutaram e
Contudo, o sacrifício de todos eles para caíram ao serviço de Portugal e, em silên-
não ser em vão impõe-nos uma obrigação cio, curvemo-nos sentida e respeitosamen-
firme, um compromisso solene, a assumir te perante a memória daqueles que um dia,
perante a sua memória e que é o de con- quando ajoelharam e caíram, o fizeram ape-
tinuarmos a lutar por Portugal e pela sua nas perante o Altar da Pátria.
identidade e independência. Sejamos dignos deles, Heróis do Mar,
nobre Povo, Nação valente, imortal.
É que, na verdade, talvez nunca tenha
sido tão importante afirmar e manter a
nossa identidade, a nossa cultura, a nossa
REVISTA DA ARMADA • JUNHO 2012 15