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REVISTA DA ARMADA | 512
Acresce ainda que a aceleração das mudanças – tão caraterísti-
ca dos tempos atuais – faz com que esta estratégia tenha um hori-
zonte temporal necessariamente mais curto que as precedentes.
Com efeito, ao contrário das Estratégias de Compensação dos
anos ’50 e ‘70, que visavam assegurar a supremacia militar por
períodos de 20 ou mais anos, os ideólogos desta terceira Offset
Strategy têm plena noção de que dificilmente as vantagens mili-
tares conseguidas com novos avanços tecnológicos se projetarão
por um horizonte temporal superior a 5 a 10 anos, reconhecendo
que, sem uma evolução tecnológica contínua, os ganhos de hoje
serão rapidamente perdidos.
CONCEITOS PRINCIPAIS
Em termos globais, esta terceira Estratégia de Compensação
assenta em dois conceitos principais: a colaboração homem-má-
quina (human-machine collaboration) e a parceria em combate
(combat teaming).
A colaboração homem-máquina é um conceito que visa de-
Constelação de satélites do GPS, um sistema nuclear na segunda Estratégia de Compensação. senvolver máquinas que ajudem os humanos a tomarem deci-
sões mais corretas e mais rápidas. O melhor exemplo atual deste
um conjunto bem mais alargado de atores, como a Rússia, a Chi- conceito está presente no novo caça F-35, cujos sensores captam
na, o Irão, a Coreia do Norte e movimentos terroristas como a imensos dados, que são processados e correlacionados automa-
Al-Qaeda e o autodenominado Estado Islâmico – havendo, natu- ticamente, apresentando a informação essencial ao piloto, dire-
ralmente, uma preocupação especial com a Rússia e a China, que tamente no seu capacete. É, portanto, um exemplo da utilização
os EUA veem como grandes potências e, portanto, como “near de máquinas para auxiliar o piloto a tomar melhores decisões, a
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peer competitors” (competidores em quase paridade). uma velocidade que o cérebro humano não conseguiria atingir.
Além disso, a consecução desta estratégia apresenta novos A parceria em combate é o emprego simultâneo de humanos e
desafios, pois a liderança tecnológica transferiu-se daquilo que de sistemas não tripulados ou autónomos, para o cumprimento
os americanos designam como o complexo militar-industrial (res- de operações militares. Um exemplo é o projeto “Loyal Wing-
ponsável por inventos como o computador, a internet ou o GPS), man” (“Asa Leal”) da Força Aérea americana, que emparelha ca-
para as companhias civis, que atualmente lideram a inovação ças F-16 não tripulados com F-35 tripulados, para o cumprimento
em áreas como a ciber-tecnologia, a biotecnologia e a robótica, de missões operacionais.
entre outras. Com efeito, hoje em dia, o mais vibrante berço de Estes dois conceitos pressupõem uma simbiose entre homens
inovações tecnológicas localiza-se em Silicon Valley, na Califórnia, e máquinas – e não um antagonismo, como tem sido apresenta-
onde estão sedeadas firmas como Apple, Cisco, eBay, Facebook, do em muitos filmes de Hollywood, que antecipam cenários apo-
Google, Hewlett Packard, Intel, Lockheed Martin, Oracle e Tesla . calípticos de revolta de máquinas cognitivas contra o homem .
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Atento a esta realidade, o Pentágono criou, em agosto de 2015, Dito isso, importa acrescentar que a colaboração homem-
em Silicon Valley, uma unidade para interagir com essas empre- -máquina e a parceria em combate são conceitos genéricos, que
sas tecnológicas e aproveitar, para a área da defesa, algumas das depois enquadrarão todo um vasto conjunto de programas no
ideias revolucionárias que aí possam surgir: a Defense Innovation âmbito das novas tecnologias, que serão abordados na próxima
Unit – Experimental (DIUx). edição da Revista da Armada.
Sardinha Monteiro
CFR
Notas
1 O professor John Mearsheimer, no seu livro A tragédia da política das grandes
potências (2001), define grandes potências como sendo Estados dotados de boa
capacidade ofensiva, que pensam estrategicamente e tomam em consideração
os interesses de outros Estados na sua órbita, envolvendo-se frequentemente em
políticas expansionistas.
2 A propósito da vitalidade de Silicon Valley em termos de inovação, gostaria de
deixar um dado extra para reflexão, para o qual o físico e futurologista Michio
Kaku tem alertado amiúde: mais de 50% dos investigadores que aí trabalham são
estrangeiros. A certa altura, eles poderão regressar aos seus países de origem
(China, Rússia, Japão, etc.), o que constitui uma vulnerabilidade estratégica para
os EUA, que poderá também ter impactos na área militar.
3 É interessante referir que essa simbiose entre homens e máquinas é uma das
teses do livro A Máquina Iluminada – Cognição e Competição (2016), do profes-
sor Luís Moniz Pereira, um dos mais conceituados especialistas em Inteligência
Artificial.
Capacete do piloto de um F-35, um equipamento da terceira Estratégia de Compensação.
NOVEMBRO 2016 5