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          país) e da Andaluzia, tendo prosseguido pelo Mediterrâneo, com
          ataques às ilhas Baleares e a Pamplona, após subida do rio Ebro e de          Navio de Oseberg (Museu de Oslo)
          alguns afl uentes. Depois de invernar em França, aƟ ngiram a cidade
          italiana de Luna, que pilharam antes de iniciar o regresso.
           Entre 966 e 971, a Galiza foi alvo de repeƟ das incursões oriundas
          da Normandia, a maior das quais chegou a incluir 100 navios. No iní-
          cio do século XI, a cidade de Tuy foi incendiada e o seu bispo raptado
          para obtenção de resgate. Esta razia foi conduzida pelo príncipe Olaf
          Haraldsson, que viria a tornar-se rei da Noruega e, posteriormente,
          canonizado pela Igreja por ter converƟ do o seu povo ao CrisƟ anismo.
           Durante o século XII registaram-se várias expedições, sobretudo
          orientadas para o Sul, sob domínio muçulmano, o que não terá,
          porém, evitado alguns “acidentes” em zonas de implantação cristã.
          Uma das úlƟ mas foi conduzida pessoalmente pelo rei Sigurd I Mag-
          nusson da Noruega, que viajava, como cruzado, para a Terra Santa
          (1108-1109). Na sua passagem pela costa portuguesa, a sua frota   fundo chato e proa/popa levantadas apresentam grandes afi nidades
          capturou seis galés sarracenas e pilhou os arredores de Lisboa. Terá   com os drakkars vikings.
          tomado, ainda, o Castelo dos Mouros, em Sintra, após a subida da   Na onomásƟ ca portuguesa fi guram, ainda, alguns nomes de origem
          Ribeira de Colares (na altura, possivelmente, menos assoreada).  escandinava, como Igor, Valquíria, Telma, Ilda ou Valdemar, embora
           Quatro décadas mais tarde, cruzados normandos ajudariam   nos tenham chegado, maioritariamente, por via germânica. Também
          D. Afonso Henriques a conquistar Lisboa. E, em 1447, o dinamar-  é de referir a reminiscência de alguns termos náuƟ cos de origem nór-
          quês Abelhart (ou Valarte) tornar-se-ia o primeiro estrangeiro   dica – embora a sua transmissão tenha sido feita por via franco-neer-
          concessionado (a seu pedido) pelo Infante D. Henrique (e tam-  landesa – como é o caso de “esƟ bordo”, derivado da expressão styri
          bém o primeiro nórdico a navegar para Sul do Bojador), ao che-  bord, ou seja, o bordo em que se encontrava o leme (de pá), normal-
          fi ar, juntamente com o português Fernando Afonso, uma expedi-  mente do lado direito do navio para melhor manuseamento  .
                                                                                                         1
          ção à costa da Gâmbia, onde viria a encontrar a morte.  Registe-se, por fi m, o facto de duas infantas portuguesas terem sido
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            VESTÍGIOS EM PORTUGAL                             desposou o rei Valdemar II, e Leonor, fi lha de D. Afonso II, que, em
                                                              1229, casou com o fi lho homónimo do referido Valdemar. Estes casa-
           Na primeira metade do século XI, os normandos entraram em rela-  mentos terão Ɵ do como principal objecƟ vo o reforço do comércio
          ções amigáveis, de natureza comercial, com os povos do Noroeste da   com o Norte da Europa, na sequência do estabelecimento de mer-
          Península, incluindo o litoral portucalense, daí tendo, provavelmente,   cadores portugueses em Bruges (1184) e na Inglaterra (a parƟ r de
          resultado alguns ensinamentos relaƟ vos a técnicas de navegação   1203), relações que se viriam a revelar de fundamental importância
          atlânƟ ca, eventualmente acompanhados de coloridos relatos de   para consolidar o recém-fundado reino de Portugal. O tempo dos
          viagens que decerto terão excitado a imaginação das audiências. É,   vikings era já uma mera recordação, mas os seus descendentes rece-
          assim, possível que a vocação marinheira portuguesa tenha sido, em   beram, deste modo, um pouco de sangue português.
          boa parte, esƟ mulada pelas visitas destes povos do Norte.
           Uma interessante marca deste intercâmbio está nos capitéis de duas                          Moreira Silva
          colunas da capela-mor da igreja românica de S. Cristóvão de Rio Mau                                CFR
          (Vila do Conde, séc. XI), que representam navios normandos (ou deles   N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co
          derivados). Mas também podemos encontrar vesơ gios na constru-
          ção de algumas embarcações de pesca da nossa costa ocidental, cujo
                                                               Nota
                                                               1  Já o bordo oposto era aquele pelo qual se atracava e por onde se carregava o navio,
                                Embarcações tradicionais (arte da Xávega)  moƟ vo pelo qual os anglo-saxónicos o designam por port. No caso português, a palavra
                                                               “bombordo” não tem relacionamento directo com o termo nórdico correspondente, que
                                                               é ladebord (i.e. bordo da carga). Possivelmente derivará de bakbord, que se refere à zona
                                                               posterior do navio e que terá dado também origem ao equivalente francês (babord).
                                                               Bibliografi a
                                                               CONSELHO EUROPEU, DesƟ naƟ on Viking – The Legacy of the Vikings, www.desƟ na-
                                                               Ɵ onviking.com/routes/viking-routes
                                                               CORTESÃO, Jaime, Os Descobrimentos Portugueses (prefácio de Henrique Leitão e
                                                               posfácio de João Paulo Oliveira e Costa), 8 vols., edição exclusiva do Expresso, Lisboa,
                                                               Alêtheia Editores, Março de 2016
                                                               COSSERON, Serge (ed.), História do Mundo, Vol. 6 (No Tempo dos Castelos Fortes), ed.
                                                               Portuguesa, Lisboa, Reader’s Digest, 1998
                                                               LUQUE, Jose Manuel Mates, “The Vikings in the Iberian Peninsula: quesƟ ons to pon-
                                                               der”, Viking Heritage, n.º 3, Visby, Universidade de Gotland, 1998


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