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REVISTA DA ARMADA | 548

              com sucessivas e determinantes perdas em   do Estado, sublinhando-se o Fuero Real, as   Castela ver-se-ia confrontada com importan-
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              termos militares, designadamente com os   ParƟ das  como documentos fundamentais   tes vitórias políƟ cas de D. Dinis em termos
              escoceses, tendo sido barbaramente assassi-  que tratavam e regulavam matérias como o   de anexações territoriais para Portugal e
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              nado  em Berkeley, em 1328.        exercício de poder régio e a administração   até para Aragão – no caso português com o
               Em França, ao invés do progressivo encon-  da jusƟ ça; por tal razão, as ParƟ das são con-  Tratado de Alcañices (em Zamora) de 1297,
              tro de equilíbrio entre o poder do monarca e   sideradas um relevanơ ssimo trabalho em   fi rmando a agregação a Portugal de toda a
              o parlamentarismo dos nobres , verifi cou-se   termos de codifi cação do direito comum-  importante região do Ribacoa e outros terri-
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              um constante processo de reforço da auto-  -pleno medieval.           tórios mais a Sul como Campo Maior . Este
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              ridade régia, o que foi marcante logo desde   Na crise sucessória, depois das cortes   acordo  Ɵ nha uma visão estratégica mais
              Filipe II (1180-1223), com o objecƟ vo  de   de Segóvia de 1278 – devido à potencial   vasta com vista a assegurar os termos de paz
              recuperar, entre outros, a Normandia, Anjou,   ascensão de D. Sancho ao trono – Filipe III   na Península, tendo Ɵ do desenvolvimentos
              Poiter e a Aquitânia, todos na posse dos reis   de França exerceu forte pressão para que   políƟ cos marcantes designadamente com o
              ingleses, e o controlo dos grandes senhorios   Afonso de Lacerda (seu sobrinho) fosse   casamento da princesa Constança, fi lha do
              feudais da Flandres, Blois, da Champagne e   declarado herdeiro, tendo mesmo amea-  rei português, com o rei castelhano, e do
              da Bourgogne. O processo conƟ nuou  com   çado invadir Castela. D. Sancho acabaria   Infante Afonso de Portugal (futuro Afonso
              Luís VIII (1223-1226) e com St. Louis (1226-  por se incompaƟ bilizar com o pai, Afonso X,   IV) com Beatriz, a irmã de Fernando IV.
              1270), solidifi cando-se o poder centralizado e   depois das cortes de Sevilha de 1281. Aliás,   Apenas com a maioridade de Afonso XI,
              reforçando-se o controlo administraƟ vo com   numa reunião de Valhadolid (1282), Sancho   em 1325 – precisamente ano em que fale-
              a publicação das  Grandes Ordenanças de   avançou com o apoio do médio clero, dos   ceu D. Dinis –, se começou a assisƟ r a uma
              1254 e 1256, que incluíam matérias como os   homens bons e a burguesia dos concelhos e   recuperação da autoridade régia castelhana,
              deveres dos agentes administraƟ vos (bailios,   com parte da nobreza, depondo o pai, facto   percurso que foi prosseguido com a dinasƟ a
              senescais e prebostes). É, também, com este   que ocasionou a guerra civil em Castela. O   Trastâmara e, claro, com a posterior ascen-
              monarca que Paris se assume como capital   rei português D. Dinis – neto de Afonso X   são dos Reis Católicos.
              políƟ ca e administraƟ va do reino, bem como
              se insƟ tucionalizam as bases políƟ co-organi-
              zaƟ vas do Estado francês: o conselho (órgão
              deliberaƟ vo do monarca), o Parlamento , a
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              Câmara, que  Ɵ nha funções de  fi scalização
              económica e fi scal, e a Universidade de Paris,
              base de formação das elites e servidores do
              rei. É com St. Louis que é assinado, em 1258,
              o Tratado de Corbeil, em que França e Aragão
              (Jaime I) estabelecem as fronteiras externas
              entre ambas as Nações.
               Mas é, indubitavelmente, com Filipe IV, o
              Belo (1285-1314), que a autoridade régia
              aƟ nge o seu ponto medieval máximo, sendo
              que, para assegurar um reforço dos cofres
              do Estado, o rei assumiu um plano de impo-
              sição fi scal a banqueiros – em especial, italia-
              nos e judeus –, um processo circunstanciado   DR
              de desvalorização da moeda, bem como a
              conhecida apropriação dos bens dos tem-  – apoiou o príncipe revoltoso, acção simi-  II. A MARCA REINANTE
              plários e a sua exƟ nção (1312) . Para con-  lar assumida, igualmente, por Pedro III de   DE D. DINIS
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              seguir o apoio da população, e com mestria   Aragão. Sancho (IV) viria a ser coroado em
              estratégica, o monarca admiƟ u representan-  Toledo em 1284, iniciando um reinado con-  Como bem se percebe da envolvente que
              tes dos cidadãos nos Estados Gerais a parƟ r   fuso, instável, em constante confronto com   brevemente vem supramencionada, exisƟ a
              de 1302. Depois de Filipe, o Belo, e depois   a nobreza, e envolvido, até, em polémicas   uma  linha condutora assumida pelos reis
              dos reinados dos seus fi lhos, exƟ nguir-se-ia   com o Papa MarƟ nho IV .    cristãos do ocidente europeu, e que se sus-
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              a dinasƟ a dos Capetos, o que viria a ter con-  Quanto ao perigo muçulmano, na altura   tentava, em essência, em quadro ordens de
              sequências gravíssimas na moldura políƟ ca   uma questão envolvendo elevadíssimo   prioridades: a organização jurídica e admi-
              europeia, com a Guerra dos Cem Anos (já no   risco, já Afonso X Ɵ nha tentado conquistar   nistraƟ va do Estado, o exercício da autori-
              reinado do nosso Rei Afonso IV).   Algeciras com vista ao controlo de Gibraltar,   dade régia sobre o poder senhorial, a insƟ -
               RelaƟ vamente a Castela, Afonso X – em   e impedir desta forma os ataques de pirata-  tucionalização das bases do conhecimento
              1252 – recebeu de Fernando III um reino   ria que Ɵ nham como objecto as rotas marí-  e da formação de elites e a estabilização
              que já incluía Leão e Castela (1230), Córdova   Ɵ mas do Mediterrâneo para a Flandres. No   da defi nição territorial e defesa do reino. D.
              (1236), Jaén (1238), Múrcia (1242) e Sevilha   reinado de seu fi lho, Sancho IV, com o apoio   Dinis foi, durante os 46 anos do seu longo
              (1248), tendo acrescentado aos territórios   de Jaime II de Aragão e também com o de   reinado, absolutamente marcante em todas
              que seu pai já unifi cara Cádis e Niebla (1262),   Génova, foi conquistada a praça de Tarifa em   elas. Abordaremos, em especial, as questões
              fi cando ainda por agregar o vasto reino de   1282, uma importante e estratégica base   da defesa, desenvolvimento territorial e con-
              Granada, o que, face à revolta de 1267 e   naval. Mais tarde, a conquista de Algeciras   trolo senhorial, e a criação do Estudo Geral e
              ao processo que ocasionou, ainda demora-  – que daria o controlo total do Estreito –   o seu impacto.
              ria mais de dois séculos. Afonso X invesƟ u   falhou, pois o rei morreria em Abril de 1295.  Em termos de enquadramento familiar, o
              numa forte base jurídica para a organização   Já com Fernando IV,  fi lho de Sancho IV,   pai de D. Dinis era primo do Rei St. Louis,


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