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REVISTA DA ARMADA | 548
Uma das grandes prioridades que fun- nição de fronteiras, reforço da defesa
damentavam o pedido ao Papa – que foi militar, controlo das ordens religiosas – Notas
Não obstante o processo de conquista do território con-
subscrito, como é sabido, pelos priores de reƟ rando-as da sujeição a Castela – e a 1 Ɵ nental português ter fi ndado em 1248.
Santa Cruz de Coimbra, de S. Vicente de adopção do português nos documentos 2 St. Louis, por muitos autores considerado o mais míƟ co
Fora, de Santa Maria de Guimarães e da ofi ciais, estratégia concertada onde, como monarca francês, fundou a Sorbonne em 1257, foi o edi-
Alcáçova de Santarém, além dos reitores ensina o ilustre historiador, teve um papel fi cador da Saint-Chapelle em Paris, tornou-se uma fi gura
lendária das 7ª e 8ª cruzadas – embora tenha saído der-
de mais de 10 igrejas entre as quais Sin- determinante a criação de um “corpo de rotado nas batalhas de Al Mansurah e de Fariskur –, for-
tra, Mafra, Beja e Santarém – era, como clérigos e de juristas que poderiam colocar malmente foi rei de Chipre e de Jerusalém, tendo ainda
ensinam Oliveira Marques e José MaƩ oso, os seus conhecimentos ao serviço da Igreja obƟ do uma grande vitória perto de Tunes (8ª cruzada)
onde viria, aliás, a morrer (de peste).
permiƟ r ao monarca reconhecer “a impor- e da administração pública nacionais”. A 3 Manuscrito que consƟ tui o resultado de levantamentos
tância do conhecimento das leis como base Universidade portuguesa, que já perfez patrimoniais e de terras executado em Inglaterra e parte
necessária ao bom governo dos povos. 731 anos, é, seguramente, uma das 10 de Gales, determinado por William em 1086, com vista à
percepção da Ɵ pologia de domínios senhoriais existente
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Afi rmava-se, assim, o peso que os estudos mais anƟ gas da Europa , e é a simbologia no reino que conquistara duas décadas antes, também
jurídicos teriam entre as várias disciplinas estrutural do marcante reinado dionisino. com o objecƟ vo de aferir que nível de impostos poderia
ter para a coroa.
do Estudo Geral.” Mas havia, em especial, D. Dinis foi – de entre os 35 reis de Por- 4 A conquista deu-se com a derrota do príncipe galês Lly-
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uma outra moƟ vação, e que teria o seu tugal – um monarca de excelência, culto, welyn, sendo por tal facto que, desde então, o herdeiro
enquadramento nas lições que o sobe- estratega, dinamizador, poeta, bem como da coroa inglesa usa o ơ tulo de Príncipe de Gales.
Foi Eduardo I que, ao derrotar os escoceses em 1296, se
rano português apreendia com os seus um astuto e infl uente diplomata, que dedi- 5 apropriou da Stone of Scone – pedra sobre a qual os reis
primos das coroas inglesa e francesa (que cou os seus 46 anos de reinado à solidifi ca- escoceses eram coroados – e a levou para Westminster
já antes abordámos). É que a formação ção defi niƟ va de Portugal o qual, quando tendo mandado construir a CoronaƟ on Chair, o simbó-
lico trono no qual são, desde então, coroados os reis
intelectual – de quem Ɵ nha possibilidades o monarca subiu ao trono, já Ɵ nha, como ingleses, precisamente para colocar a pedra por baixo,
económicas de estudar em universidades Nação, 171 anos. Independentemente de, numa simbologia-limite do absoluto poder régio sobre
europeias – podia sedimentar-se em Por- amiúde, ser designado como o Rei Poeta, o a Escócia; depois de um longuíssimo período de disputa
e de confronto, a Stone of Scone voltaria a Edimburgo
tugal, e, assim, potenciar o fortalecimento Rei Lavrador, o Edifi cador ou mesmo o Pai em 1996.
do aparelho organizacional fi scal, adminis- da Pátria, criador da Marinha (em 1317), e 6 Ao que se sabe, por ordem da própria rainha, Isabel de
traƟ vo e judicial, o que se prende directa- visionário, D. Dinis marca de forma única e França, que nunca teve com ele um casamento franco
e verdadeiro, muito devido às escolhas pessoais do
mente com a supramencionada políƟ ca de absolutamente estruturante a viragem do monarca e ao constante escândalo com que este decidia
reforço da autoridade régia e de controlo velho Portugal visigóƟ co e medievo para viver na corte.
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do poder senhorial (laico e eclesiásƟ co). um Estado mais moderno, organizado, 8 Como ensina SoƩ o Mayor Pizarro.
Cuja matriz de competência incluía funcionar como
D. Dinis pretendia, com a sustentação portanto, mais preparado para a epopeia supremo tribunal.
deste pilar, desenvolver o Estado como universal que a Nação Portuguesa, 9 déca- 9 Com a execução do Grão-Mestre em 1314.
sede de formação jurídica fora dos círcu- das depois da sua morte (1325), viria a 10 Que desenvolveram o Speculum Regis.
Muito por causa do seu casamento com Maria de
los controlados directamente pelo poder empreender. 11 Molina, sua prima em terceiro grau, o que ocasionou
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eclesiásƟ co, o que se enquadrava num inúmeras difi culdades no relacionamento de Castela
intuito claro de insƟ tuir uma políƟ ca de Dr. Luís da Costa Diogo com a Santa Sé, vínculo que era absolutamente determi-
nacionalização que se sustentava na defi - Diretor Jurídico da DGAM nante para os reis cristãos no período medieval.
Facto que, nos seus 891 anos de história enquanto
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N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co Nação (1128-2019), dá a Portugal a extraordinária sim-
bologia de ter as mais anƟ gas e sólidas fronteiras da
Europa – estão a perfazer 772 anos – e, com grande pro-
babilidade, do mundo.
13 Estas inquirições em que o rei visava os bens ilegal-
mente apropriados pela nobreza – no fundo, o processo
de controlo do Domesday Book inglês – era uma acção
que o monarca compensava com um equilíbrio de deci-
sões quanto à perda dos seus (nobreza) bens para as
ordens religiosas, a qual executou com signifi caƟ va cla-
rividência.No fundo, o que o rei fez foi limitar e conter as
jurisdições senhoriais. CoexisƟ u com esta linha de poder
a forƟ fi cação de coutos e honras através da edifi cação
das célebres torres medievais portuguesas (ver a colos-
sal obra de Carlos de Azevedo de 1969) em senhorios
patrocinados pelo poder régio, bem como a destruição
de dezenas delas construídas sem a autorização régia.
14 Seguindo aprofundada análise de José MaƩ oso e SoƩ o
Mayor Pizarro.
15 De Sancho I a Afonso III e a primeira década de D. Dinis.
16 Benefi ciando infantes e a alta nobreza que Ɵ nha (ou
criou) laços de sangue com a Casa Real.
17 Já depois de assinada a Concordata de 1289.
18 Conforme entende José MaƩ oso.
19 Sendo as mais anƟ gas, cronologicamente, naturalmente
depois da insƟ tucionalização de Bolonha (1088) – a única
criada no Séc. XI –, Paris, Salamanca e Oxford (1170), Are-
zzo (1215), Pádua (1222), Nápoles (1224), Montpellier
(1230-1240), Órleans (1236), Avignon (1303), Valladolid
(1304), Perugia (1307), Siena (1357) e Viena (1365). Ver
estudo desenvolvido que aduzimos em “Noções e Concei-
tos Fundamentais de Direito”, QuidJuris, 2007.
20 Como o signatário já defendeu em trabalho anterior,
deve incluir-se a Rainha Teresa neste longuíssimo elenco
designadamente face ao tratamento régio que lhe era
dispensado inclusivamente pelo Papa.
FEVEREIRO 2020 21