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REVISTA DA ARMADA | 554


              LISBOA NO CRUZAMENTO DE
              ROTAS AÉREAS TRANSATLÂNTICAS

               Após o Armisơcio em 1918, Sacadura Cabral

              regressa de França animado com a inovadora visão
              para a aviação. A Grande Guerra  Ɵ nha  catalisado
              um desenvolvimento extraordinário na tecnologia
              aeronáuƟca e fez surgir uma indústria de constru-


              ção de aeronaves altamente lucraƟva, assim como
              uma geração de milhares de jovens aviadores. Esta
              sinergia rapidamente impulsionou a conƟ nuação do

              espírito heroico e românƟco da aviação, e a sua ren-
              tabilização na exploração comercial das aeronaves.
               Durante as décadas de 20 e 30, todos os meses
              eram quebrados records de velocidade ou distân-
              cia e planeavam-se ousados raids que traziam um

              notável presơgio para o aviador e o seu país. Os
              Estados juntam-se também ao espírito da chamada
              “Época de Ouro da Aviação”. Britânicos, America-
              nos e Franceses começaram a planear ligar por via
              aérea, com as aeronaves excedentes da Guerra, a
              Europa à América e as suas colónias às metrópoles.
               Tudo indicava que a rota aérea do AtlânƟ co Norte
              iria passar pelos Açores e por Lisboa. A primeira
              travessia aérea do AtlânƟco, protagonizada em

              maio de 1919 pelo Comandante Albert Read da
              U.S. Navy, só o veio comprovar. Sacadura Cabral
              previu-o e, ainda antes dos Americanos chegarem
              a Lisboa por via aérea, Ɵnha já conseguido conven-

              cer o Ministro da Marinha a patrocinar-lhe uma
              travessia aérea de Lisboa ao Rio de Janeiro. Queria
              inaugurar assim a rota do AtlânƟco Sul, que seria

              uma rota com origem em Pernambuco, escala em
              Cabo Verde e desƟ no final em Lisboa. A capital de

              Portugal passaria, automaƟcamente, a ser o mais

              importante aeroporto a nível mundial e as nossas   Excerto do relatório de Sacadura Cabral com croqui a indicar a melhor localização do Centro de
              ilhas AtlânƟcas pontos obrigatórios de escala. Era   Aviação Naval de Lisboa na península do MonƟ jo.

              esta a visão de Sacadura Cabral.
                                                                  As obras da base aeronaval arrancaram em 1941 e, em 1949, no
              MUDANÇA DO CENTRO DE AVIAÇÃO NAVAL                  âmbito do 25º aniversário do desaparecimento do aviador, deci-
                                                                  diu-se designar a futura unidade por “Centro de Aviação Sacadura
              PARA O MONTIJO                                      Cabral”, numa justa homenagem ao principal impulsionador da
               Em novembro de 1919, antes de parƟr para Inglaterra para esco-  aviação da Marinha e a um homem com uma visão extraordiná-


              lher um avião para a sua travessia aérea do AtlânƟco Sul, Saca-  ria para a aviação e que, devido a isso, acabou por protagonizar o

              dura Cabral avalia o melhor local na área de Lisboa para instalar o   maior feito aeronáuƟco português, em equipa com o seu amigo

              futuro Centro de Aviação Naval. Ao que tudo indica, não foi con-  Gago CouƟnho: a Travessia Aérea do AtlânƟco Sul, em 1922.


              siderada outra área para além do MonƟjo, mais concretamente   Com a exƟnção da Aviação Naval em 1952, acabou por ser a

              “na parte norte do canal de Aldea-Galega”, onde hoje se situa a   Força Aérea Portuguesa que, em 1953, inaugurou o Centro de
              Base Aérea n.º 6.                                   Aviação Sacadura Cabral, que pouco tempo depois passou a ser
               Refere o aviador que “Este local pareceu-me conveniente para a   a Base Aérea n.º 6, designação que, com “Força e Grandeza de



              instalação não só de uma estação de aviação maríƟma, mas de um   Ânimo”, tem persisƟdo nestes úlƟmos 65 anos.
              aeroporto maríƟ mo e terrestre”; faz também uma esƟ maƟ va das   Não deixa de ser algo irónico que, passados 100 anos, o projeto
              construções e dragagens necessárias e da melhor localização para   de Sacadura Cabral para o MonƟ jo  vá,  fi nalmente,  concreƟ zar-
              a pista terrestre, que em nada difere da atual. “O aeródromo pode-  -se. A península está prestes a transformar-se no aérodromo que

              ria ser militar e civil conjuntamente e consƟtuir o futuro aeroporto   “…poderia ser militar e civil conjuntamente e consƟtuir o futuro

              de Lisboa“. Sugere então que se “…proponha superiormente a sua   aeroporto de Lisboa“, já que, para além das novas infraestrutu-
              aquisição e seja comprado seja por acordo com o proprietário, seja   ras aeroportuárias, vão permanecer ali unidades da Força Aérea

              por expropriação por uƟlidade pública. A verba de 900 contos des-  Portuguesa e a Esquadrilha de Helicópteros (EH). A EH é a única
              Ɵnada a portos aéreos tem aqui perfeita aplicação.”  unidade de aviação da Marinha Portuguesa e, curiosamente, está

               Não foi desta vez que a proposta de Sacadura Cabral foi avante, e   localizada exatamente no local que Sacadura Cabral indicava como

              só se voltaria a falar do MonƟjo para base aérea em 1932, quando   ideal para o futuro Centro de Aviação Naval.

              finalmente a Aviação Naval pôde voltar a considerar subsƟ tuir o
              centro do Bom Sucesso. Embora num processo sem ligação ao                                   BapƟ sta Cabral
              estudo original, acabou-se por selecionar aquele mesmo local.                                       CFR
                                                                                                        AGOSTO 2020  29
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