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REVISTA DA ARMADA | 554
In Memoriam
Vieira MaƟas toma a decisão de mandar
sair uma força naval para “exercícios ao
largo da Madeira”. E assim, a 11 de junho,
no dia seguinte ao da parada naval, larga-
ram de Lisboa quatro navios, a fragata Vasco
da Gama com dois helicópteros Lynx, duas
corvetas e o reabastecedor Bérrio trazendo
embarcados o DAE (Destacamento de Ações
Especiais) e equipas de fuzileiros com botes,
mergulhadores, uma equipa médico-cirúr-
gica e um estado-maior operacional, tendo
sido designado Comandante da Força o
então CMG Fernando Melo Gomes. No dia
13 de junho, os “decisores políƟ cos” recon-
sideraram e aproveitaram esta força naval,
então já a sul da Madeira, que seguiu para
Bissau onde recuperou 1237 refugiados, de
33 nacionalidades. Julgo mesmo que Vasco
da Gama terá ficado muito saƟ sfeito com
esta forma original de celebrar os 500 anos
da sua chegada à India!
como Comandante da fragata Comandante com quatro ou cinco Ministros da Defesa e Em 3 de agosto de 2002, o Almirante Vieira
João Belo Ɵ nha senƟdo a necessidade de um sempre com signifi caƟ vas difi culdades fi nan- MaƟas termina o seu mandato como CEMA
estágio prévio, e disse-me para estudar essa ceiras. Não foi fácil manter à tona de água os e passou à situação de reserva.
questão. Referi-lhe que no dia seguinte lhe programas de construção dos novos patru- Podemos afi rmar que a carreira do Almi-
traria o programa do estágio, que mereceu lhas oceânicos, e especialmente, o programa rante Vieira MaƟas na Marinha foi muito
uma rápida aprovação. E dois meses depois, de renovação da capacidade submarina, tor- diversifi cada e completa, pois comandou
aquilo que se considerava não ser exequí- pedeado de diversos quadrantes. um Destacamento de Fuzileiros Especiais,
vel… estava a começar, com a presença do Permitam-me recordar um episódio em em combate, uma fragata em exercícios
Comandante Naval na sessão de abertura. parƟcular: a operação CROCODILO. Em 7 internacionais, foi Capitão de Porto e Ofi -
Em fi ns de 1996 fui nomeado para as fun- de junho de 1998, desencadeia-se uma cial de Estado-Maior. Pelo conjunto de
ções de chefe do Estado-Maior do Comando crise políƟco-militar na Guiné-Bissau, tendo qualidades pessoais e profi ssionais que
Naval, e nesse cargo trabalhei em con- os revoltosos ocupado o aeroporto. O reunia era então uma referência para os
tacto direto com o Almirante Vieira MaƟ as. Almirante Vieira MaƟas sugere então aos Oficiais mais novos, no número dos quais
Guardo excelentes recordações do seu esƟ lo “decisores políƟcos” o envio a Bissau de me incluía.
de liderança. Frontal, dizia claramente o uma força naval para recolher as muitas O Almirante Vieira MaƟas tem um curricu-
que queria; simultaneamente, era acessível centenas de portugueses que lá se encon- lum militar muito rico. Em síntese, foi um
e aberto a outros pontos de vista e deixava travam, mas nenhuma decisão é tomada. Homem de valores e de causas. Foi um líder,
o seu estado-maior trabalhar à vontade. Entretanto decorrem as cerimónias do 10 um chefe com quem dá gosto trabalhar. Foi
EsƟve com ele pouco tempo, apenas uns seis de junho que naquele ano incluíam uma um marinheiro, um fuzileiro, um militar e
meses, pois em abril de 1997 foi designado parada naval comemoraƟva dos 500 anos um combatente.
para o desempenho das funções de Chefe da chegada de Vasco da Gama a Calecute, O Almirante Nuno Gonçalo Vieira MaƟ as
do Estado-Maior da Armada (CEMA). e em que parƟcipavam unidades navais de foi um Grande Português!
O Almirante Vieira MaƟas foi Comandante Marinhas amigas.
da Marinha durante cinco anos, até meados Com o tempo a passar e a situação no ter- Alexandre da Fonseca
de 2002. Foi um período diİ cil, trabalhou reno, na Guiné, a agravar-se, o Almirante VALM
DISCIPLINA E BEM COMUM
onheci o Almirante Nuno Vieira MaƟ as ter cessado. Com uma imensa sereni- Entre 2008 e 2010, ambos assumimos
Cjá depois de este ter concluído a sua dade, aliada a uma intensa capacidade – juntamente com ArisƟdes Leitão, João
brilhante carreira na Marinha de Guerra de trabalho, o Almirante conƟ nuou acƟ vo Falcato, e o VALM António Saccheƫ
Portuguesa. Uma das caracterísƟ cas que e criaƟvo em múlƟplas frentes, animado (entretanto falecido) – um desafi o lan-
nele mais admirei foi o seu permanente sempre por uma invulgar autodisciplina, çado por Adriano Moreira, na condição
“estado de pronƟdão”. A sua entrega ao que é Ɵmbre daqueles que, por vocação e de Presidente da Academia das Ciências
serviço público conƟnuou viva e intacta formação, são capazes de assumir as res- de Lisboa: organizar uma obra que sinte-
mesmo depois do imperaƟ vo profi ssional ponsabilidades da liderança. Ɵzasse o essencial da importância do Mar
8 AGOSTO 2020