Page 57 - Revista da Armada
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de Lisboa (1255), do Concelho de Lisboa (1255), da Chancelaria de  A nau dificilmente notada na
         D. Dinis (1285), e do Cabido da Sé de Lisboa (1295); quanto às dos  estátua de D. José algo terá a ver
         padrões da Bica do Andaluz (1336) e da Bica de Arroios (1360),  com a tradição da nau de pedra,
         quando as fontes de abastecimento de água pertenciam à iniciativa de  desde que: “Ainda assim não
         ordens religiosas e de proprietários que faziam chafarizes nos limites  deixaram a Joaquim Machado
                                            de suas terras ou pro-  de Castro a liberdade de inventar
                                            vinham da munifi-  allegorias dos grupos laterais,
                                            cência régia e as ar-  nem de alterar os acessórios da
                                            mas da cidade eram  estátua equestre ...” (10)
                                            diferentes, seriam fac-  E, logo em Abril de 1777, o
                                            to sobejo para consi-  povo substituiu o medalhão do
                                            derar que a figura ico-  marquês de Pombal, ainda em
                                            nográfica do barco  sua vida, pelas armas de Lisboa –
                                            teve cunho nacional  o navio com os dois corvos – até
                                            que, mais tarde, Lis-  que, em 12 de Outubro de
                                            boa e outros municí-  1833, o duque de Saldanha re-
                                            pios passaram a usar  pôs o medalhão de seu avô.  Chafariz do Largo do Mastro
                                                                                        (Campo de Santana).
                                            no seu brasão de ar-  Já a interpretação da parte or-
                                            mas. Além disso, das  namental do frontão da Câmara de Lisboa nos aparece claramente
                                            cerca de doze deze-  definida:
                                            nas de naus de pedra  “... Encosta-se a uns livros, tem na mão esquerda um compasso e
         A Sé. A cerca Moura e a Alcaçova de Lisboa em 1352.
                                            das casas de Lisboa  com a dextra levanta o facho para alumiar a Navegação, que se acha
         que conhecemos, apenas duas – a da Calçada do Carmo (ao Rossio) e                 à sua direita, e se reconhece
         da Rua dos Anjos, 42 e 45 – poderão situar-se no carácter municipa-               pela coroa rostral e pelo na-
         lista. Atente-se ainda no facto de em toda a área da cidade pombalina             vio, e é representada durante
         cujas construções tiveram as mesmas concessões e benefícios apenas                a luta com o Oceano, no
         se encontrarem à vista ou referenciadas cinco naus de pedra dos                   momento em que descobre o
                                                                                           Brasil. Com a mão direita se-
                                                                                           gura a auriflama portuguesa
                                                                                           e, batendo com a haste no es-
                                                                                           cudo do Brasil, faz surgir
                                                                                           Santa Cruz.
                                                                                            Com a mão esquerda mos-
                                                                                           tra-se pronta a parar o golpe
                                                                                           que o Oceano vai acenar-lhe.
                                                                                           A túnica arrancada, o mastro
                                                                                           do navio partido, assim como
                                                                                           a borda deste calcada pelo pé
                                                                                           do hipocampo, recordam as
                                                                                           peripécias do descobrimento
                                                              Frontão da Câmara Municipal de Lisboa.
                                                                                           de Pedro Álvares Cabral.
                                                              Reconhece-se o Oceano pelo hipocampo em que monta, assim como
                                                              pelos golfinhos do ceptro, com que arremete a Navegação. Um navio
         Rua dos Anjos Nº 42.                                 a vapor em construção lembra o Arsenal da Marinha de Lisboa; uma
                                                              bóia, uma âncora, alguns cabos e remos indicam o seu porto”. (11).
         homens do mar: as duas que foram retiradas das esquinas da Rua dos  A aventura marítima dos portugueses – obra dum plano madura-
         Arameiros que dão para as ruas da Alfândega e dos Bacalhoeiros, a  mente estudado, amadurecido e apoiado em recursos científicos,
         da esquina desta artéria com a Rua da Padaria, outra na Rua Augusta,  cimentado com fé e constância indomáveis – só não foi mais além
         236 (alta), e estoutra na Rua Primeiro de Dezembro, 76.  pela impossibilidade natural de aguentar-se o que sempre foi manifes-
           Cumpre considerar o facto de quase todas as lápides estarem  tamente superior às nossas forças, constrangendo, desde o princípio,
         viradas ao mar, das mais correctamente conseguidas com dados pes-  à escolha de precedências.
         soais indiscutíveis, como acontece com a lápide da Rua de Santa
         Apolónia, 18, apresentarem o corbus, da sua singularidade e colo-  Daí serem demasiado escassas as informações que, acerca das via-
         cação a diferentes alturas, tudo a afastar a ideia mercantilista ou  gens dos Corte Real e das outras tentativas ao Atlântico ocidental, nos
         municipalista do evento.                             dão os cronistas, talvez por terem sido feitas em segredo e quase sem-
           O chafariz do Campo de                             pre por iniciativa e à conta de particulares, quanto por serem segredo
         Santana, construído quan-                            de Estado e estarem proibidas
         do D. Luís já se encontrava                          por carta de 22 de Outubro
         doente e teve projectos                              de 1443 do então regente D.
         exuberantes, apresenta a                             Pedro todas as viagens para
         maior singeleza de que                               além do Cabo Bojador sem
         apenas sobressai o relevo                            prévia licença do Infante D.
         duma pequena caravela                                Henrique.
         coroada de coroa real. Não                             “A 1447, ou pouco depois,
         será o barco preito mari-                            diria respeito a viagem força-
         nheiro ao Homem que                                  da daquela “nau de Portugue-
         antes de ser rei foi coman-                          ses” que, vindo do Mediterrâ-
         dante, querido e exigente a  Esquina da Rua dos Bacalhoeiros   neo, pelo Estreito de Gibraltar
         bordo?!                com a Rua da Padaria.         fora, ‘lhe dera tal tormenta’,  Chafariz do Largo de S. Paulo.  ✎
                                                                                      REVISTA DA ARMADA • FEVEREIRO 99  19
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