Page 53 - Revista da Armada
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pequena frente que faria rondar estai que a sustenta, ficou a fun- voltou a replicar que não
o vento e permitir ao navio fazer cionar quase como um balão os via nem tinha possibili-
rumo directo a Finisterra. No (com o navio a navegar à boli- dade de ver, que não tinha
entanto, pelas 3 horas da madru- na!...) até ser carregada pelo pes- radar, que se estava em
gada esta frente, que não era afi- soal do navio em rápida faina faina geral de mastros
nal tão pequena quanto isso, fez geral de mastros. numa situação de emer-
aumentar repentinamente o No dia seguinte, o navio en- gência. Os do “Cuauh-
vento e enquanto o pessoal com- contrava-se profundamente den- temoc” pediam agora para
parecia no convés para faina tro do Golfo da Biscaia, sem pos- que guinássemos para Sul
o
geral de mastros, (os instruendos sibilidades de utilizar a giba, logo (180 ) para evitar a colisão
foram dispensados, pois as também a mezena por questões que parecia eminente.
condições meteorológicas e o de equilíbrio, e duas extênsulas, Mas como, se era de Sul
risco inerente assim o justifi- com vento fraco desta vez de Les- que soprava o vento com
cavam) um dos brandais em que te e na contingência de ter que rajadas acima dos 40 nós
enverga a extênsula da mezena partir a 5 de Agosto para uma e estávamos em faina e
rebentou. Posteriormente ao se nova viagem de quase dois me- com o pano quase todo
carregarem as extênsulas, duas ses, tendo antes que reparar todos ainda içado? Mais uma
delas rasgaram-se irremediavel- os danos no velame e massame vez o Oficial de Quarto
mente. Carregou-se também a assim como a própria avaria no por ordem do Comandante
giba e a mezena. Nesse mesmo radar, de que se falará adiante. e na impossibilidade de se
dia, com o nascer do Sol, o ven- Foi nestas circunstâncias que o Carregar pano. fazer outra coisa, repetiu a
to amainou após a passagem de navio desistiu da regata, seguin- senciais para o pessoal carregar sua ladainha, adiantando ainda
um forte aguaceiro e içou-se no- do para Lisboa a motor e procu- as velas à noite. Navegava-se a ser impossível guinar para Sul
vamente todo o pano disponível, rando assegurar assim a próxima uma velocidade de cerca de 10 (como era óbvio) por ser daí que
pois não se queria perder tempo viagem ao Canadá. ou 11 nós, a WSW com vento o vento soprava. Após mais
e lugares na regata, apesar das Na festa da estada da regata bastante forte de Sul. alguns minutos de tensão e de
duas extênsulas rasgadas. Previa- em Lisboa (Vasco da Gama Alguém chama o “Creoula” repetições ao VHF, do navio me -
-se para essa noite a passagem Memorial), o “Creoula” não em castelhano no VHF. Era o xicano perguntaram qual a nossa
de outra frente com aumento do pode infelizmente participar, navio-escola mexicano “Cuauh- posição. O Oficial de Quarto
vento e o consequente mau conseguindo no entanto, após as temoc” que dizia encontrar-se à prontamente passou a posição
tempo, estando todo o pessoal reparações e fainas essenciais à nossa popa em rumo de colisão do “Creoula” e durante os minu-
avisado da possibilidade de nova próxima viagem, integrar ainda a e por se encontrar em faina geral tos que se seguiram não se ouviu
faina geral de mastros. Após a parada naval no Tejo na qual de mastros, logo não podendo mais nenhuma comunicação do
meia noite, o vento aumentou e participaram todos os navios par- mudar de rumo, solicitava que “Cuauhtemoc” ...
foi rondando ligeiramente de S ticipantes. nós o fizéssemos. O Oficial de Intrigado, mas já suspeitando
para SSW e a partir daí estabili- Há uma história curiosa que Quarto surpreendido, pois não do que se passava, o Coman-
zou permitindo ao navio fazer aconteceu entre o “Creoula” e o tinha visto nenhum navio nas dante chamou de novo o navio
proximidades (no entanto, estava mexicano e perguntou por sua
má visibilidade e chuva o que vez a posição em que aquele se
viabilizava a hipótese de um encontrava. A posição foi passa-
navio próximo não ser visto), na da e rapidamente marcada na
presença do Comandante, repli- carta. O “Cuautemoc” encon-
cou num fluentíssimo “portu- trava-se “apenas” a quarenta
nhol” que o “Creoula” também milhas por ante a ré de nós!...
estava em faina geral de mastros, Depois da tensão foi a gargalha-
que por outro lado navegávamos da geral na Ponte!
sem radar e não sabíamos onde Como alguns Oficiais do
o “Cuauhtemoc” se encontrava, “Creoula” e do “Cuauhtemoc”
para além do facto de aquele ser tinham já estreitado relações du-
o navio alcançante, logo deveria rante a estada em Falmouth,
ser ele a guinar. Mau grado esta voltaram a encontrar-se após a
explicação os do “Cuauhtemoc” chegada a Lisboa num convívio
insistiam no VHF para que fosse- a bordo do navio-escola mexi-
Ferrar o pano.
mos nós a guinar. O Oficial de cano e foi então abordado o
uma velocidade de cerca de 10 navio mexicano “Cuauhtemoc” Quarto dirigiu-se então ao exteri- estranho acontecimento. Ironi-
nós, mesmo sem as duas extên- durante a primeira noite de mau or na tentativa de ver o “Cuauh- camente perguntou-se-lhes qual
sulas, apesar de a um rumo pou- tempo e que merece ser conta- temoc”, no entanto, o halo cria- era a velocidade a que vinham
co favorável que levava o navio da. O navio navegava desde Fal- do pelas luzes de convés na para quererem que nos desviás-
para o meio do Golfo da Biscaia. mouth sem o radar de navega- chuva não permitia distinguir semos àquela distância. A expli-
Afinal, parecia já não haver ção em funcionamento, pois rigorosamente nada. Em faina cação veio entre gargalhadas e
necessidade de se fazer faina uma avaria que surgiu à chegada geral de mastros era impossível algum embaraço: tinham-nos
geral de mastros. No entanto, a este porto, apesar dos esforços apagar as luzes e o radar estava confundido com um outro navio
pelas 6 horas da madrugada o envidados, não pôde ser reparada avariado! Não havia meio de que passava perto deles o qual
vento aumentou ainda mais, de antes da largada. Ora nessa noite saber do “Cuauhtemoc” e de nem sequer chegaram a saber
forma súbita e passou em de mau tempo, como já referido, avaliar directamente o perigo de qual era!
poucos momentos de 25 para 45 apitou a faina geral de mastros à colisão. E no VHF continuavam
nós fazendo com que rebentasse qual o pessoal acorreu com bre- os mexicanos,, que mudássemos
o punho superior do estai em vidade, tendo-se acendido nesse de rumo, que se estavam a António Mourinha
que enverga a giba. A giba sem o momento as luzes do convés, es- aproximar. O Oficial de Quarto 2TEN
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