Page 130 - Revista da Armada
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Igualmente, na participação anual dos
ROCEGA DE MINAS Comandantes e oficiais em estágios na
“É uma ciência de concepção vaga, baseada em elementos discutíveis, deduzidos de Escola de Guerra de Minas, das Marinhas
experiências inconcludentes, realizadas com aparelhagem de problemático rigor, por indi- Belga e Holandesa, em Ostende, marinhas
víduos pouco de fiar e de mentalidade duvidosa.” que punham, e continuam a pôr, uma
parte importante do seu esforço naval
Esta era a filosófica e bem humorada definição de Rocega de Minas de autor desconhecido que, por graça, ornamentava nesta área operacional e, por isso, aquela
algumas das câmaras dos draga-minas Escola, se considerava uma espécie de
“santuário” desta especialidade e onde,
lugar na tolda onde com a boca junto aos am-se bem preparadas, não só pela expe- entre os pares, a nossa opinião era normal-
cabeços e castanhas, procurava ajudar a riência adquirida através do intenso treino mente aceite e respeitada.
meter dentro as espias que, ao tempo, em simulador no Centro de Instrução de Muita desta eficiente actividade agora
eram de cairo ou de sisal. Claro que nestas Táctica Naval e dos numerosos exercícios aqui evocada ficou a dever-se à razoável
sucessivas manobras, acabou por gastar os no mar, mas também pelos diversos cursos estabilidade do pessoal que, principal-
dentes, o que muito veio a facilitar que iam sendo mi-
porquanto ele não permitia a entrada a nistrados com êxito
bordo de elementos estranhos à guarnição às guarnições, pelo
do seu “Ponta Delgada”. bem apetrechado
Fazendo jus à sua raça nadava muito CIMCM.
bem e demonstrava sempre grande alegria Esta certeza de
quando na água, junto à popa do navio, prontidão e rigor
para isso tinha companhia. Depois do de execução na
banho era normalmente içado para bordo guerra de minas e
pelo dorso, com as axilas (das mãos) contramedidas que,
assentes num laço de retenida, lançada por de iníco, exigiu o
um dos marinheiros de serviço. apoio de Guias de
E… ainda havia o “Bandido”, sem Manobra de Roce-
pergaminhos de raça, também todo preto, gas e outros Ma-
que “estava destacado” no “Rosário”. Co- nuais específicos
metia a proeza de subir as escadas verticais elaborados pelos
de acesso à ponte alta, para fazer o seu próprios Coman-
quarto, ia chorar para o camarote do dantes dos navios,
Comandante quando o baixar brusco da pôde ser ampla-
pressão lhe anunciava borrasca iminente, mente testada e comprovada pelos bons mente antes da guerra do Ultramar, se
era o único cão autorizado a andar livre- resultados que se alcançavam quando, em conseguia alcançar entre guarnições e,
mente em Ostende e a entrar nos bares na inúmeros exercícios com marinhas também, ao empenho e profissionalismo
companhia de pessoal do navio, e…muito estrangeiras, era reconhecida e salientada a de muitos oficiais, sargentos e praças que
mais havia para contar destes nossos ami- nossa actuação ao longo dos anos foram passando pela
gos de quatro patas que normalmente jun- Com a Marinha Espanhola eram realiza- Flotilha de Draga-minas, emprestando-lhe
tavam ao seu nome o honroso título de dos anualmente exercícios conjuntos, os uma continuidade de conhecimentos, quer
grumete / ano de adopção ! IBEREX, alternadamente em águas por- como Comandantes de navio, quer como
Porém, a certeza que ainda hoje persiste tuguesas e espanholas. Num desses exercí- elementos da guarnição, quer ainda como
na memória, depois de todos estes anos, é a cios, ao largo de Cádiz, os nossos navios instrutores dando uma dimensão simul-
sensação do dever cumprido com exem- chegaram a ser sobrevoados por helicóptero taneamente prática e teórica ao ensino alta-
plar eficácia. De facto em plena época de para observação da destreza das guarnições mente especializado do Centro de Ins-
ouro dos draga-minas as guarnições senti- no lançamento e recolha de rocegas. trução de Minas e Contramedidas.
Todo este saber da escola dos draga-
-minas se perdeu no tempo, sendo hoje
certamente irreversível de recuperar,
restando apenas, para os velhos mari-
nheiros que ainda se revêem nesta narrati-
va, uma boa e saudável recordação daque-
les tempos de melhores perspectivas para
a credibilidade internacional da nossa
Marinha.
José Carvalheira
VALM
Francisco Duarte Costa
CMG
Notas
(1) Designação usada internacionalmente e que
procura realçar a têmpera necessária para vencer o
enorme desgaste psíquico e físico a que as guarnições
dos draga-minas estão sujeitas em tempo de guerra.
(2) Para obter uma precisa delimitação dos campos
de minas e/ou canais rocegados e determinar o grau
de segurança que ofereciam à passagem de outros
O “Scotch” a ser içado para bordo. navios.
20 ABRIL 2002 • REVISTA DA ARMADA