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A Influência da Água Mediterrânica
          A Influência da Água Mediterrânica

                              no Atlântico Nordeste
                              no Atlântico Nordeste




         1. A ÁGUA MEDITERRÂNICA NO
         ATLÂNTICO

           No oceano, a camada superficial, cor-  muito particular-                              realizam-se através
         respondente aos primeiros 100 ou 200 m  mente, ao largo da                              do Estreito de Gi-
         de profundidade, tem temperaturas e  Península Ibérica.                                 braltar, onde há
         salinidades que dependem do local e da  A Fig. 1 ilustra es-                            entrada de Água
         estação do ano, visto encontrar-se direc-  sa influência sob a                          Atlântica perto da
         tamente sujeita aos efeitos da interacção  forma da distri-                             superfície e saída
         com a atmosfera. Mas em níveis mais  buição da sali-                                    de Água Mediter-
         profundos, aquelas propriedades termo-  nidade média à                                  rânica, mais den-
         halinas só variam por efeitos de mistura  profundidade de                               sa, numa forte cor-
         e portanto podem ser utilizadas para ca-  1200 m. Vemos                                 rente junto ao
         racterizar as massas de água. No caso do  que a região mais                             fundo. Esta cor-
         Atlântico Nordeste, os níveis subjacentes  afectada por esta                            rente, que pode
         à camada superior são preenchidos por  massa de água tem                                atingir valores da
         uma massa de água – denominada Água  a forma de uma                                     ordem de 1 m s -1
         Central do Atlântico Nordeste - em que a  cunha salina a                                próximo de Gi-
         temperatura (T) e a salinidade (S) de-  apontar na direc-                               braltar, vai descer
         crescem quase linearmente com a pro-  ção sudoeste a                                    a vertente conti-
         fundidade. A partir de profundidades de  partir da região ao                            nental do Golfo de
         cerca de 500-600 m começa a fazer sen-  largo da Península Ibérica.   Cádiz encostando-se ao lado norte devi-
         tir-se a presença de uma camada de água  A bacia Mediterrânica, onde esta  do ao efeito da rotação da Terra (i.e., à
         intermédia de origem mediterrânica,  massa de água tem origem, corresponde  força de Coriolis que, no hemisfério
         mais quente e mais salgada que a atlânti-  a uma região de clima semi-árido em  norte, tende a desviar os movimentos
         ca, e cuja influência vai até cerca de  que a salinidade à superfície tende a  para a direita).
         1200-1300 m de profundidade. A cama-  aumentar porque o efeito da evaporação  A Água Mediterrânica (AM) distingue-
         da subjacente à Água Mediterrânica é  (perda de água pura) excede largamente  -se das águas atlânticas não só pelas
         ocupada pela Água Profunda do      o efeito contrário (ganho) devido à pre-  temperaturas e salinidades mais elevadas
         Atlântico Norte com T e S decrescendo  cipitação e à descarga dos rios. Isto equi-  (Madelain, 1970; Zenk, 1970; Ambar e
         de novo quase linearmente com a pro-  vale a dizer que o Mediterrâneo fun-  Howe, 1979a) mas também pelas
         fundidade.                         ciona como uma bacia de concentração  menores concentrações em nutrientes –
           Vamos focar agora a atenção nos  transformando água de origem atlântica  nitratos, fosfatos e silicatos – e em
         aspectos ligados à influência da Água  em água mais salgada (e mais quente).  oxigénio dissolvido (Howe, Abdullah e
         Mediterrânica no Atlântico Nordeste e,  As trocas entre esta bacia e a do Atlântico  Deetae, 1974; Ambar et al., 2001).
                                                                               Estudos recentes da influência desta
                                                                               massa de água ao largo da costa
                                                                               Portuguesa mostraram que a AM tam-
                                                                               bém se distingue por apresentar valores
                                                                               mais elevados da concentração em sedi-
                                                                               mentos em suspensão do que as águas
                                                                               atlânticas (Freitas e Abrantes, 2001). Para
                                                                               além destes aspectos singulares, a pre-
                                                                               sença da AM também tem importância
                                                                               do ponto de vista das espécies biológicas
                                                                               de origem Mediterrânica que ela trans-
                                                                               porta para o Atlântico.
                                                                                 Na camada de Água Mediterrânica
                                                                               podem distinguir-se dois núcleos princi-
                                                                               pais (Zenk, 1975; Ambar e Howe,
                                                                               1979a,b), caracterizados por máximos
                                                                               relativos de T e S, respectivamente cen-
                                                                               trados em profundidades de cerca de
                                                                               800 m (núcleo superior) e 1200 m
                                                                               (núcleo inferior). A separar estes núcleos
                                                                               na vertical interpõe-se uma camada de
                                                                               água menos salgada e menos quente, de
                                                                               origem atlântica.
                                                                                 Vamos apresentar um exemplo de uma
         NRP “D. Carlos I”.                                                    consequência directa da existência de
         12 AGOSTO 2002 • REVISTA DA ARMADA
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