Page 263 - Revista da Armada
P. 263
possibilidade de executar marginalmente
tal operação, mediante a instalação de um
depósito auxiliar de gasolina, por baixo da
fuselagem. Seleccionado o Shark 74, foi este
sujeito a completa inspecção e rectificação
de anomalias dos vários sistemas, cujas
debilidades eram crónicas nestes aviões.
Preparado o plano de voo, prevendo
escalas de reabastecimento em S. Jacinto
e Brest, reunido e verificado o equipa-
mento de navegação, recebidos passa-
portes, o avião partiu do Tejo às 17h35,
sem o documento do MNE, que seria le-
vado por uma patrulha motorizada da
PSP para S. Jacinto, onde chegou às 3h30.
Após uma longa descolagem dificultada
pelo excesso de carga e pela pista espelha-
da, o Shark voou para Brest, onde amarou
às 12h10. A partida foi porém suspensa
pelo Comando Francês, por não ter sido
notificado desta missão. Falha do Adido
Naval Francês em Lisboa. Tendo final-
A equipa que foi a Itália buscar os “Macchi” – Armando Roboredo, Namorado Junior, um italiano da fábrica,
Pedro Rosado, Paulo Viana, Aires de Sousa e Cardoso de Oliveira. mente descolado às 14h50, o Shark chegou
a Calshot ainda antes do anoitecer, estando
viões monomotores, mas sobretudo na apoios provocarem uma escalada incon- o embaixador à espera do documento para
comprovação do rigor do sistema de nave- trolável da guerra, a Inglaterra e a França o levar a Londres. E chegou bem a tempo
gação científica criado e adoptado pelos promoveram a formação da Comissão de da reunião da manhã seguinte.
aviadores portugueses. Sistema esse que foi Não Intervenção na Guerra Civil de Cumprida a missão, o Shark regressou
pioneiro entre os demais, embora não tenha Espanha, tendo convocado outros países ao Bom Sucesso, sofrendo sucessivas defi-
sido assimilado literalmente pela genera- para uma reunião em Londres em 24 de ciências e avarias durante o voo.
lidade dos operadores. Mas os critérios Outubro. Em Portugal, esta missão, cumprida
essenciais, como o método dos pré-cálculos, O nosso Ministro dos Negócios Estran- dentro do tradicional estilo de “serviço
viriam a ser de aplicação geral. Foi, por isso, geiros devia elaborar um documento para silencioso” da Marinha, não mereceu espe-
o início do progresso irreversível da genuí- ser apresentado na reunião pelo embai- cial atenção das entidades oficiais. O
na navegação aérea, sujeita depois a sucessi- xador em Londres, mas tal documento só próprio Major General da Armada con-
vas adaptações até ao advento de sistemas ficaria pronto no dia 22. Contactada a siderou tratar-se de um voo de rotina. Em
sofisticados de base electrónica. Aeronáutica Militar para levar o documen- contraste, a Liga Internacional dos Avia-
Em 1928 foi realizado um voo de Itália to a Londres, tal missão foi considerada dores, atenta às actividades aeronáuticas,
(Varese) a Portugal (Bom Sucesso), por impossível, por inexistência de material considerou este voo como a maior proeza
uma formação de 6 hidroaviões monomo- ao voo adequado. Às 12 horas do mesmo da Aviação no ano de 1936, tendo atribuí-
tores Macchi, adquiridos para a Aviação dia 22, o Ministro da Marinha convocou o do o troféu “Cliford Harmon” aos avia-
Naval. Divididos em 2 grupos, estes aviões Comandante do Centro do Bom Sucesso, dores – 2TEN Freitas Ribeiro, comandante
efectuaram as 4 etapas da viagem com a quem encarregou de dar andamento à e navegador, e Trindade dos Santos,
grande regularidade, apesar das condições espinhosa missão. piloto. (*)
desfavoráveis no sobrevoo dos Apeninos Dos hidroaviões existentes na Aviação Entre os trabalhos relevantes execu-
(voando a 3000m de altitude) e do mau Naval, só os Blackburn Shark, monomo- tados pela Aviação Naval, merecem espe-
tempo ao longo das costas ibéricas. Numa tores torpedeiros, de flutuadores, tinham cial referência as missões de fotografia
época ainda caracterizada por uma relati-
va insipiência operacional, este voo reve-
lou já um grau de maturidade apreciável
da nossa Aviação Naval.
Em 1934, três hidroaviões Junker do
Centro do Bom Sucesso participaram nas
manobras aeronavais, efectuando voos de
Lisboa à Madeira, daí aos Açores e regres-
so a Lisboa.
Além da regularidade com que decor-
reram as operações, há que salientar que,
pela primeira vez, estes aviões praticaram
navegação radiogoniométrica, com resul-
tados satisfatórios.
Em Outubro de 1936 coube à Aviação
Naval o desempenho de uma missão de
grande responsabilidade diplomática e
melindrosa do ponto de vista operacional.
Estava-se na fase inicial da trágica guer-
ra civil de Espanha, e vários países se
aprestavam para apoiar os contendores de
um lado e do outro. Na perspectiva desses Chegada do Blackburn Shark com Freitas Ribeiro e Trindade dos Santos a S. Jacinto, no regresso de Inglaterra.
REVISTA DA ARMADA • AGOSTO 2002 9