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A “Espuma“ do NTM “Creoula”
                  A “Espuma“ do NTM “Creoula”

              egistou-se recentemente a morte da  tos de lazer no convés, os banhos de man-  Ilhas Canárias, Tânger, Ceuta e Casablanca,
              mascote do Navio de Treino de Mar  gueira a meio-navio nas tardes de calor tór-  tendo efectuado também a viagem ao Cana-
         R“Creoula”, a cadela “Espuma”.     rido e os refrescantes mergulhos em alto mar,  dá em 1998, no âmbito do projecto: ”Creoula
           A Revista da Armada consagra-lhe hoje es-  com o “Creoula” pairando ao largo nos anos  - de novo na Terra Nova.” Marcou com a sua
         tas linhas, porque a “Espuma” fazia parte inte-  de juventude, ninguém a conseguia impedir  presença tanto as missões mais curtas, corres-
         grante da guarnição do NTM “Creoula” desde  de saltar para a água quando via mergulhar  pondentes a um fim-de-semana ou alguns dias
         há quinze anos, ou seja, ao longo de quase toda  o primeiro instruendo, fazendo apelo ao seu  navegando ao longo da costa portuguesa, re-
         a vida do “Creoula” como Navio de Treino de  instinto protector de cão-de-água...; nos por-  gista-se a sua predilecção pela Berlenga... como
         Mar (relembra-se que esta segunda etapa                                 as longas regatas internacionais – as famo-
         do navio teve início em 1987.).                                         sas “Cutty Sark” – e os cruzeiros oceânicos,
           Nascida em 30 de Março de 1990 no                                     com duração superior a um mês.
         canil das Avencas – Parede, a “Espuma”                                    O actual Comandante, quando interro-
         foi oferecida pela respectiva proprietá-                                Foto CTEN António Gonçalves  gado sobre a “Espuma”, costumava di-
         ria, criadora de cães-de-água, prestigia-                               zer, precisamente:”É o elemento da guarni-
         da raça canina portuguesa que, como o                                   ção que tem mais horas de navegação, o que
         nome sugere, evidencia características                                  melhor conhece o navio. Se pudesse falar, creio
         de uma particular adaptação à vida do                                   que participaria de modo muito válido em todas
         mar com a existência de membranas in-                                   as operações de manobra do navio, e contribui-
         terdigitais relativamente desenvolvidas,                                ria real mente, com indicações precisas, como:
         ao mergulhar as narinas ficam bloquea-                                   a escota não passa por aí, ou:isso nunca se fez
         das evitando a entrada de água para a                                   assim...”
         garganta e os regulares movimentos de                                     Há ainda que recordar a sua vertente de
         cauda, semelhantes aos de uma hélice, de                                estrela dos meios de comunicação social. Ao
         modo a impulsionar o corpo, quando em                                   longo dos quinze anos, foram muitos os
         natação – para além do espesso revesti-                                 jornais e revistas que, em trabalhos sobre o
         mento de pêlo encaracolado, destinado a                                 “Creoula” se referiram, em termos sempre
         conferir -lhe resistência durante as longas                             elogiosos, à “Espuma”, tendo alguns publi-
         permanências na água fria.                                              cado artigos a seu respeito, na generalidade
           A “Espuma das Avencas”, nome de re-                                   ilustrados com respectiva fotografia em di-
         gisto, integrou a guarnição do “Creoula”                                versos contextos da vida a bordo. Foi ainda
         com apenas um mês de idade, e cumpriu                                   protagonista de programas transmitidos
         desde então no navio uma comissão cor-                                  pela televisão, tendo chegado mesmo a ser
         respondente aos seus quinze anos de vida                                entrevistada pelos apresentadores, prova a
         – aliás, com os maiores zelo, empenho e de-                             que se prestava com a bonomia e afabili-
         dicação, como diríamos se nos encontrás-                                dade que mantinha em todas as situações,
         semos a redigir o louvor de um elemento da  tos, muitos foram os bons momentos na com-  como boa embaixadora do navio.
         guarnição, quando do seu destacamento. E, de  panhia dos instruendos, na praia, de que era   É justo relembrar aqui os sucessivos tratado-
         certo modo, talvez seja um pouco disso que se  particular apreciadora, ou percorrendo, pela  res que a ela se dedicaram ao longo dos anos,
         trata... mas, mais do que um louvor, é sobretu-  trela, os longos passeios marítimos nas noites  zelando de modo próximo e atento pela sua
         do o evocar da sua recordação que constitui a  cálidas de Verão.      saúde e bem-estar, controlando as tosquias, as
         razão de ser deste pequeno texto.    E por falar em noites, como não recordar  vacinas...e convidando-a inclusivé para passar
           Uma memória muito grata partilhada por  os momentos em que servia de almofada aos  em sua casa, na companhia de crianças - e até
         diversos comandantes (houve troca de tele-  jovens que resolviam passar a noite no con-  de outros cães! - fins-de-semana ou períodos
         fonemas na data da morte da “Espuma”...),  vés observando as estrelas, encolhidos no seu  de festa, como o Natal...
         dezenas de oficiais, centenas de elementos  saco-cama, sob a pilha de dóris ? E se não fos-  Não seria correcto deixar também de men-
         da guarnição...e milhares de jovens que, em-  se quase segredo, poderíamos ainda evocar a  cionar os cozinheiros que, ao longo dos tem-
         barcados no “Creoula”, puderam vivenciar  imagem de algumas meninas de 14, 15 anos,  pos, mimaram a “Espuminha”, reservando-
         de modo directo a ligação ao mar e à vida de  que levavam ao colo a pequena “Espuminha”  -lhe sempre um pitéu especial... razão pela
         bordo, através da experiência marcante de um  para dormir no 3º beliche... e que, quem sabe,  qual o capacho da cozinha se tornou um dos
         treino de mar neste navio...       hoje, 15 anos depois, talvez tenham oferecido  seus lugares predilectos a bordo.
           Ao longo de década e meia, foram mais  aos seus filhos um pequeno cão-de-água, tam-  Cumpre ainda, neste pequeno texto, ren-
         de sete mil e quinhentos os instruendos, desi-  bém preto e encaracolado...  der tributo de gratidão à Dra. Jacqueline
         gnação atribuída aos jovens embarcados no   Marinheira com mais horas de navegação  Silva Dias, viúva do saudoso Comandante
         “Creoula” que travaram conhecimento com a  a bordo, a “Espuma” navegou ininterrupta-  Silva Dias, que nutria pela cadela grande afec-
         “Espuma”, lhe fizeram festas ou pediram a  mente durante catorze Verões relembra-se  to, aliás totalmente retribuído e que, na última
         pata, a fotografaram ou se fizeram fotografar  que na qualidade de Navio de Treino de Mar,  fase da vida da mascote, lhe proporcionou os
         ao seu lado, posando por vezes a cadela com  o “Creoula” navega, todos os anos, sensivel-  maiores cuidados e carinhos, na exacta medi-
         o boné do “Creoula” e lhe ofereceram pistac-  mente, entre os meses de Maio e Outubro, fez  da em que a “Espuminha” os merecia.
         cios – guloseima preferida – em troca de uma  escala nos mais diversos portos da costa por-  Sabemos que todos os que, elementos da
         profunda gratidão...               tuguesa, Madeira e Açores, bem como portos  guarnição ou instruendos do “Creoula”,
           Extraordinariamente meiga e dócil, sou-  estrangeiros (de entre os quais, países da Es-  conheceram a “Espuma” estão de acor-
         be ser a mascote ideal, perfilando-se com os  candinávia, Amsterdão, Bruges, Londres, Wey-  do: a “Espuma” merecia tudo. E nunca a
         instruendos e a guarnição na formatura das  mouth, St. Malo, Vigo e la Coruña – e no Sul  esquecerão.
         8:30 h, partilhando os momentos de enjoo  da Europa e Norte de África, Tunísia, Nápo-                 Z
         quando estava mar, mas também os momen-  les, Génova, Nice, Barcelona, Valência, Cádiz,   (Colaboração do NTM “Creoula”)
                                                                                     REVISTA DA ARMADA U AGOSTO 2005  27
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