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Michael Hudec
Michael Hudec
Um pintor realista apaixonado pelos Açores e o Mar
oi em Fevereiro de 2004 que tomei co- que havia encomendado
nhecimento da obra de Michael Hudec, ao pintor. Os trabalhos de
Fpintor realista, simbólico, norte-america- Michael Hudec sofrem
no, radicado nos Açores desde 1980. Estava influências da sua vivên-
a bordo do NRP “João Coutinho” a realizar o cia nas ilhas. O Mar está
meu Estágio de Embarque após a realização presente ao longo da sua
do CFBO MN na Escola Naval. O nosso Co- obra, são cais, argolas,
mandante, CFR Valentim Rodrigues, enquanto cascos de velhos navios
conversávamos acerca de literatura e pintura, e as ondas, impetuosas,
revelou-me ter sido aluno, durante a sua última quase furiosas por vezes.
Comissão nos Açores, do Curso de Desenho Parti então com destino a
no Atelier Michael Hudec, em Ponta Delgada. Ponta Delgada! Conheci
Estava então longe de saber que ainda no final um pintor exigente, críti-
desse ano teria eu também a oportunidade de co e analítico perante o
frequentar este curso! Quando em Setembro Mundo e a sua Arte. Nas-
soube que iria destacar para o NRP “Baptista ceu em 1956 no estado
de Andrade”, como Médica de Bordo, para rea- de Nova Iorque, E.U.A.
lizar uma comissão nos Açores, o Cmdt. Valen- onde frequentou a State
tim Rodrigues aconselhou-me a não perder a University of New York, O artista fotografado junto de uma das suas telas.
oportunidade de aprender e aperfeiçoar as téc- o Broome Community College e o Robertson espírito; o lado humano do qual não prescinde,
nicas de desenho com Michael Hudec. Pediu- Center for the Arts and Sciences. e que o mantêm por cá. MH: “Não quero ser
-me também que no regresso trouxesse comi- MH: “Na arte abstracta, e em muitos casos, um artista que só pinta para vender - isto não
go a bordo a prenda de Natal “surpresa” para temos pessoas que vão pintar. Ou seja, vão cabe dentro da minha personalidade. A arte é
a sua esposa - um quadro de Michael Hudec deitar terra, ou outros materiais experimen- uma coisa viva para mim”.
tais, para cima de uma tela, ou um boca- O pintor expõe desde 1978 e já recebeu vá-
do de areia, ou deixam a lata de tinta cair rios prémios durante a sua carreira: Artista do
em cima da tela, e depois, chamam àquilo Ano de 1987, atribuído pelo jornal Correio dos
uma obra. Quando vão expor, necessitam Açores; o segundo prémio em aguarelas no Jeri-
de alguém que profira umas palavras poéti- cho Arts Council (EUA) em 1980 e por último,
cas, para impressionar o povo, para os con- ganhou o prémio “People´s Choice” (votação
vencer de que estas obras é que têm valor e pública) e foi galardoado na categoria de de-
as outras não. Vamos ser factuais, sem uma senho na Exposição Colectiva em Bainbridge
base firme de técnica, de conhecimento, (Nova Iorque), em 1979. O artista plástico
nenhum artista consegue aproveitar aquilo Michael Hudec tem como técnicas preferen-
que tem dentro de si.” ciais a aguarela, o acrílico e o pastel, e exige
Michael Hudec é filho de pais originários dos seus próprios trabalhos uma exactidão
da Eslováquia e de Inglaterra, o seu pai é Ofi- de pormenor em combinação com jogos de
cial da Força Aérea, com o posto de Tenente- luz para captar ideias abstractas que pretende
-Coronel. Chegou aos Açores em 1980, de transmitir. Nos Açores realizou 20 exposições
férias, acompanhado pela mãe e uma das individuais e participou em 8 exposições co-
suas irmãs. Encantado com o misticismo e lectivas. À data, encontra-se a preparar a pró-
a beleza da ilha e curioso diante da socie- xima exposição individual que decorrerá no
dade açoreana, que começava a procurar próximo mês de Setembro. Entretanto, realizar-
uma identidade própria. Prolongou as suas -se-á uma “Exposição Retrospectiva” no Con-
férias... e ficou completamente apaixonado sulado Americano, em Ponta Delgada. Durante
pela simplicidade destas ilhas. Nessa altu- a nossa missão nos Açores, o Cmdt. Rodrigues
ra, passava os fins de semana a ler obras de Pinto convidou o pintor Michael Hudec e al-
Camilo Castelo Branco, Fernando Pessoa, guns dos alunos do seu Atelier a virem a bordo
Florbela Espanca, em casa de um amigo, do NRP “Baptista de Andrade” tendo o artista
que já faleceu, na Fajã de Baixo. Durante a plástico oferecido ao Comandante do navio
semana vivia nas Sete Cidades. um livro Antológico da obra do conhecido
MH: “Aquele momento de parar e tirar pintor naturalista açoreano Vítor Câmara. Os
cinco minutos, que normalmente são uma alunos e o artista plástico tiveram a oportuni-
hora e meia, tomar um copo e falar sobre dade de conhecerem o navio contando com
assuntos da vida, tocar nas almas, é a isso as “explicações” às suas questões por parte dos
que dou muito, muito valor no povo aço- oficiais e restante guarnição do navio que tão
reano. Ainda têm o seu lado humano e, bem receberam os “visitantes”!
infelizmente eles não percebem que cor- Na volta, o NRP “Baptista de Andrade” tra-
rem o risco de o perder, naquela corrida zia consigo memórias, aprendizagens e um
para conseguirem os BMW´s, as piscinas, quadro de Michael Hudec!
as boas roupas.”O pintor, afirma ter abdica- Z
do de muita coisa ao optar por ficar a viver Susana Farinha
nos Açores. Em troca, sente que ganhou o 2TEN MN
26 AGOSTO 2005 U REVISTA DA ARMADA