Page 28 - Revista da Armada
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alcançar a eficiência e a eficácia pretendida,  dades sentidas, os sentimentos vividos pe-  Por sua vez, os homens olham o seu coman-
         interiorizando-se desde muito cedo que a  las guarnições, a angústia do desconhecido  dante, como um amigo, como um irmão mais
         improvisação era totalmente inaceitável.  e a interiorização das fragilidades assumi-  velho em quem depositam a máxima confiança,
           Ainda só com o “Espadarte”, organiza-  das, enquadradas num ambiente real de  entregando-lhe a sua vida.
         ram-se os primeiros programas de especia-  guerra, numa vivência difícil de conceber   É esta a verdadeira escola da solidariedade.
         lização em submersíveis, com a criação, por  nos dias de hoje.        Cada um vê no outro o seu irmão, o seu salvador
         diploma de 11 de Março de 1914, da escola   Imaginemos contudo, como terá sido  e sente-se responsável por ele. Sabe que se o navio
         de navegação submarina.            um cruzeiro de submersível, com base  ficar no fundo, terá de aguardar a morte lenta ao
           No início de 1916 e apesar das polémicas,  na descrição do Comandante Fernando  lado do seu camarada, enquanto à superfície os
         o governo português através do Ministro da  Branco (comandante do NRP “Hidra”)  técnicos discutem a possibilidade do salvamento
         Marinha Victor Hugo                                                                   e os mergulhadores mar-
         de Azevedo Coutinho,                                                                  telam o casco pelo lado
         encomendou mais                                                                       de fora, para ver…se eles
         três submersíveis ao                                                                  ainda estão vivos!
         estaleiro italiano, de                                                                  Com o submersível
         características simila-                                                               já em imersão, a aten-
         res e de deslocamento                                                                 ção redobra-se até por-
         ligeiramente superior                                                                 que a divisa assumida
         ao “Espadarte”                                                                        pelas Marinhas aliadas
           Os três submersí-                                                                   de superfície durante a
         veis foram solene-                                                                    guerra era:
         mente entregues a                                                                       “Mais vale destruir
         Portugal em La Spezia                                                                 um submarino aliado, do
         no dia 20 de Outubro                                                                  que deixar de destruir um
         de 1917, baptizados   O submersível “Narval” da 3ª Esquadrilha.                       submarino inimigo”.
         como “Golfinho”, comandado pelo capitão-  nas  suas “Novelas Submarinas” (passo a   Estranho, curioso e macabro.
         tenente Joaquim de Almeida Henriques,  citar): “um pequeno invólucro de aço repleto   Se o valor do submarino, como arma de guer-
         “Hidra”, comandado pelo 1.º tenente Fer-  de maquinaria, onde nada existe que se possa  ra naval, não fosse enorme, certamente não teria
         nando Augusto Branco e “Foca”, comanda-  alcunhar de comodidade, onde o ar é por ve-  sido necessário chegar a tão rasgados lemas e a
         do pelo 1.º tenente Serrão Machado.  zes irrespirável; com 21 homens a bordo, vai  tão profundas reviravoltas psicológicas.
           As lições aprendidas com as dificuldades  permanecer quatro dias afastado do contacto   A tensão a bordo é enorme, mas todos estão
         e os problemas sentidos durante a viagem  do mundo, alapardado entre águas como um  prontos. Os músculos repisados, magoados pelos
         pelo “Espadarte” e o facto de o País se en-  grande cetáceo, exposto ao mar e ao mau tempo,  esforços contínuos. O comandante tem os olhos
         contrar já envolvido na I GG, levou a consi-  às minas, aos ataques do inimigo, dos amigos,  injectados do uso do periscópio. Todos estão pouco
         derar a conveniência dos três submersíveis  dos neutros, das baterias de costa, das patru-  asseados…porque estão há quatro dias sem se la-
         efectuarem o trânsito La Spezia – Lisboa,  lhas nacionais, etc.       varem e a dormirem vestidos. De resto o ambiente
         com escolta.                         Os indivíduos que compõem a guarnição  cheira a óleo, a comida, a cebo e a humidade. As
           O Ministério da Marinha concordou com  são todos conhecedores do perigo que correm,  anteparas gotejam vapor de água, a atmosfera é
         a organização dessa escolta, mas, por carên-  e cônscios da responsabilidade que lhes cabe na  já quase irrespirável. (fim de citação)
         cia de navios e atendendo às emergências  manobra dos vários aparelhos e da qual pode   Estes excertos da narrativa, são ampla-
         da guerra, apenas foi disponi-                                                  mente elucidativos da reali-
         bilizado o vapor “Patrão Lo-                                                    dade da vida a bordo dos sub-
         pes”, modestamente armado,                                                      mersíveis da 1.ª Esquadrilha,
         tendo complementarmente                                                         cujos homens, pioneiros da
         sido solicitada, por via diplo-                                                 arma submarina, são hoje aqui
         mática, a colaboração das Ma-                                                   globalmente lembrados e ho-
         rinhas francesa, italiana e bri-                                                menageados.
         tânica para acompanhamento                                                        A evolução tecnológica per-
         e protecção, em cada uma das                                                    mitiu contudo dotar progres-
         fases do trânsito.                                                              sivamente os submarinos com
           São as peripécias desta via-                                                  capacidades crescentes, confe-
         gem, iniciada ao entardecer                                                     rindo-lhes presentemente am-
         do dia 15 de Dezembro de                                                        plas potencialidades tácticas
         1917, que são relatadas nas                                                     e estratégicas, justificando o
         páginas dos respectivos Diá-                                                    facto de que, presentemente,
         rios Náuticos dos 3 submersí-                                                   as nações que dispõem de sub-
         veis, reproduzidas na Edição                                                    marinos não os querem perder
         que hoje é dada a conhecer.  Três submarinos da 4ª Esquadrilha.                 e as que ainda deles não dis-
           Com o raiar da manhã do dia 10 de Fe-  depender a salvação do submarino, todos olham  põem, os querem adquirir.
         vereiro de 1918, os três submersíveis en-  o seu camarada como se olhassem a si próprios,   Termino, desejando longa vida à “famí-
         traram em formação no Rio Tejo, ao fim de  dedicando à sua missão a atenção que dedicam  lia submarinista” ao serviço da Nação, na
         quase dois meses de viagem, efectuando  à conservação da sua preciosa vida.  Marinha, com a certeza de que continuarão
         navegação perigosa, com mau tempo e em   O Comandante vê em todos os seus homens,  a honrar a divisa: EFICIÊNCIA - PROFIS-
         zonas de guerra, onde a presença de sub-  não uns autómatos humanos que a uma voz  SIONALISMO – DEDICAÇÃO, no presen-
         mersíveis inimigos era assinalada com in-  cumprem disciplinadamente sob o peso dos ga-  te e no futuro muito próximo, a bordo dos
         quietante frequência.              lões, um serviço que não percebem, mas sim uns  submarinos da 5.º Esquadrilha.
           A mais de 9 décadas de distância destes  colaboradores preciosos que inteligentemente               Z
         eventos e para as realidades presentes, é  sabem pôr em pratica aquilo que ele lhes diz     C. Brites Nunes
         difícil percepcionar e sensoriar as dificul-  apenas quando é oportuno que se faça.                  CMG

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