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colmatar lacunas do discurso expositi-         nenhum museu deve negligenciar.               Foto Rui SaltaNo caso vertente, reportando para a ne-
vo, seja em virtude de restrições na per-       Centrados no presente e com o futuro         cessidade de envolver todos os interve-
cepção sensorial (visual, auditiva), no                                                      nientes no processo (decisores/directores,
processo cognitivo (nas designadas defi-       no horizonte, defendemos que este é o         profissionais e visitantes) como agentes de
ciências mentais, que abrangem um es-          tempo de ampliar este conceito de aces-       transformação e intervenção para, colec-
pectro alargado de variações), restrições      sibilidade no Museu, não deixando que         tivamente, derrubarmos as barreiras (as
em comunicar-se socialmente através da         este se limite à eliminação das barreiras     físicas, mas também todas as outras) que
fala (deficiências na produção linguísti-      físicas. Atender a uma crescente diversi-     constituem factores de exclusão social,
ca), restrições na realização de activida-     dade de públicos é um desafio que ultra-      factores que por via de uma qualquer
des físico-motoras (coordenação motora,        passa os limites da acessibilidade espa-      forma de discriminação, mais ou menos
precisão ou mobilidade), mas também            cial, quando a inclusão está na agenda        explícita, vedam ou dificultam a participa-
outras restrições, como as que são do          das nossas preocupações.                      ção das pessoas na vida dos museus.
foro sociocultural, como aquelas que en-
frentam determinados grupos das nossas          Do ponto de vista teórico é relativamen-       A acessibilidade no Museu é ainda uma
comunidades, como sejam as minorias            te simples e (quase!) consensual esta aber-   provocação, um desafio sem limites e um
étnicas, os imigrantes, ou ainda outros,       tura à diversidade nos museus, porém,         processo em permanente construção.
alvo de segregação social/moral, como          no que diz respeito às práticas efectivas,    Defendê-la é uma das missões essenciais
pessoas reclusas, ou pessoas sem-abrigo        verificamos que são longos os caminhos        do Serviço Educativo, num compromisso
por exemplo.                                   ainda a percorrer. Nestes percursos, as       com o futuro e de mãos dadas com a se-
                                               componentes físicas apresentam-se como        cular divisa da Marinha Portuguesa: «Ta-
 Para o efeito, estas visitas requerem prepa-  aquelas de solução mais simples: rampas,      lant de bien faire» – é esta mesma «von-
ração prévia, preferencialmente envolvendo     elevadores, legendagem em braille, áudio      tade de bem-fazer» que norteia hoje o
docentes de ensino espe-                       guias e todos os recursos que a tecnologia,
cial e técnicos de serviço                     os orçamentos e a imaginação nos permi-                         rumo das acessibilidades
social. Para cada caso e                       tam operacionalizar, para tornar o museu                        no Museu de Marinha.
em função das característi-                    num lugar fruível por um leque cada vez
cas especificas dos visitan-                   mais alargado de pessoas, com as mais di-                            Olímpia Gordon Pinto
tes em causa, são planea-                      versas características.                                                  Técnica de Serviço
das formas de abordagem,                                                                                                         Educativo
delineados circuitos e for-                     Com efeito, as barreiras mais difíceis de
matos de visita, disponibi-                    transpor não são as físicas, mas aquelas                                              Notas:
lizados materiais.                             que se prendem com as mentalidades –
                                               são o preconceito e a discriminação os                            1 "Acessibilidade é uma ca-
 Com vista ao alarga-                          principais responsáveis por uma boa parte                         racterística do ambiente ou
mento desta oferta, o Mu-                      das inacessibilidades intelectuais, sociais,                      de um objecto que permite
seu tem também investi-                        lúdicas, tanto nos museus, como noutros                           a qualquer pessoa estabele-
do na produção de novos                        espaços. Face a esta constatação importa                          cer um relacionamento com
recursos. Um bom exem-                         traçar o diagnóstico e definir que nível de                       esse ambiente ou objecto,
plo disso é o modelo de                        acessibilidade efectivamente almejamos                            e utilizá-los de uma forma
caravela (vd foto) recen-                      para o Museu de Marinha.                                          amigável, cuidada e segura.
temente produzido pelas                                                                                          (…) Portanto a acessibilida-
Oficinas de modelismo                           Abrir o Museu, torná-lo mais acessível                           de promove a igualdade de
do Museu e que brevemente integrará o          num exercício constante e permanente,         oportunidades e não a uniformização da popu-
circuito da exposição permanente.              rompe provocatoriamente com as cons-          lação em termos de cultura, costumes ou hábi-
                                               tantes de um universo há tanto tempo          tos (…)" in: Conceito Europeu de Acessibilida-
 Sabemos no entanto que nem todas              submetido a unidades redutoras e a uma        de - Relatório do Grupo de Peritos criado pela
as pessoas com necessidades especiais          suposta “ordem natural das coisas”. Esta      Comissão Europeia - 2003
visitam o Museu com o apoio da equi-           mudança de paradigma implica neces-           2 Tal como é apresentado por Chris Barker Vd
pa do Serviço Educativo, da mesma              sariamente uma nova visão do Museu e          (BARKER, 2005, P. 448)
forma, estamos também certos que as            daquilo para que este serve, naquilo que
acessibilidades no Museu não dizem             gostamos de designar por uma museo-           Bibliografia:
apenas respeito, muito menos se esgo-          logia de agência, tomando a liberdade
tam, nos públicos portadores de defi-          de importar para a museologia o con-           AA. VV.; (2004); Museus e Acessibilidade;
ciência, muitas vezes referidos como           ceito de agência, das ciências sociais.2      [Temas de Museologia]; Lisboa: Instituto Portu-
“minorias”. Padrões reducionistas da                                                         guês de Museus; ISBN 972-776-229-8.
designada normalidade não nos devem
fazer esquecer que os ditos “normais”                                                         AA. VV.; (1991); Museums Without Barriers
(e suposta “maioria”) terão ao longo da                                                      – A new deal for the disabled: Fondation de
sua vida momentos em que saem do pa-                                                         France / ICOM / Routledge; ISBN 0-415-06994 .
drão: ou por acidente, ou porque têm
filhos pequenos (ao colo ou em carrinho                                                       BARKER, Chris; Cultural Studies: Theory and
de bebé), por vicissitudes diversas, ou                                                      Pratice; (2005); London; SAGE; ISBN: 0 761
tão-somente e inevitavelmente, porque                                                        95774 X.
envelhecem – os mais recentes dados
demográficos evidenciam um crescen-                                                           HOOPER-GREENHILL, Eilean; The Educa-
te envelhecimento da população euro-                                                         tional Role of the Museum; (2006); [2nd ed.
peia. A ligação óbvia entre o processo                                                       1999]; s. l.: Routledge, ISBN – z13: 978-0-415-
de envelhecimento e algumas das ditas                                                        19827-1.
deficiências não pode ser esquecida nos
Museus, muito menos quando sabemos                                                            INSTITUTO NACIONAL PARA A REABILI-
que o turismo (e o turismo sénior está                                                       TAÇÃO, I. P.; (2007); Plano Nacional de Pro-
em desenvolvimento) é um sector que                                                          moção da Acessibilidade; Lisboa: Instituto
                                                                                             Nacional Para a Reabilitação, I. P.; ISBN: 978-
                                                                                             989-8051-06-6.

                                                                                              VALE, José Augusto da Costa Picas do; Mu-
                                                                                             seu de Marinha. Contributos para a defini-
                                                                                             ção de um projecto cultural (2009); Lisboa:
                                                                                             tese de mestrado em Museologia, Faculdade
                                                                                             de Ciências Sociais e Humanas, Universidade
                                                                                             Nova de Lisboa.

                                                                                                    REVISTA DA ARMADA • JULHO 2013 25
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