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"CUTTY SARK"
BARCA “FERREIRA"
A FÉNIX RENASCIDA
DEPOIS DA CATÁSTROFE, UM Os trabalhos foram retomados em 2008 foi também por curiosidade que fomos
e a operação de reconstrução (quase in- verificar que nada tinha sido esquecido...
PROJECTO DE RECONSTRUÇÃO tegral) iria levar mais de 4 anos, até ao naquilo que nos diz respeito.
E UM PROJECTO MUSEOLÓGICO dia 25 de Abril de 2012, data em que
AMBICIOSO a Rainha Elisabeth II inaugurou a “nova” UMA VISITA CHEIA DE SURPRESAS
Por volta da 4 horas da madrugada do “Cutty Sark”. A primeira impressão que fica na apro-
dia 21 de Maio de 2007, foi declarado um Pelo relevo que tem para a história da
incêndio em Greenwich. O fogo ti- Marinha, e também pelo exemplo, é inte- ximação ao exterior do navio, não deixa
de ser curiosa. De facto, a “ Cutty
nha deflagrado na “Cutty Sark”, a Sark” encontra-se agora envolvida
célebre galera da Rota do Chá. O
navio-museu estava, felizmente, por uma verdadeira “campânula
(em forma de “saia”) de vidro e de
fechado ao público para conser- aço, que percorre o navio na linha
vação. A destruição, testemunhada
pelas televisões do mundo inteiro, de água, protegendo as suas obras
vivas e cobrindo igualmente a doca
era considerável, mas não irreversí- seca (ver Imagem nº 1). De facto, é
vel, tendo-se o fogo concentrado a
meio navio e sido dominado atem- compreensivel que, para os “puris-
tas”, este “novo” visual exterior seja
padamente. O projecto de restauro tão polémico... “Não há bela sem
e conservação iniciado em 2006, e
que decorria, foi travado. Contudo, senão”.
A visita inicia-se pela estrutura de
no meio da catástrofe, um ponto vidro e aço, cuja entrada se situa
positivo: o recheio está a salvo por
ter sido retirado e se encontrar ar- pela alheta de estibordo (ver Imagem
mazenado para restauro. Aspecto exterior da "Cutty Sark". O navio envolto pela curiosa "saia" de vidro. nº 2). No interior da redoma de vidro
Os ingleses são seguramente bons que encerra o casco está localizada
a bilheteira e uma pequena loja de
marinheiros e dão recorrentemente Souvenirs.
evidências que são gente que gosta
de mar. A "Cutty Sark", património O circuito da visita começa pela
coberta inferior do navio, à qual se
"Nacional" (e mesmo "Mundial", acede por um corredor suspenso e
se considerarmos que Greenwich
está classificado Património da uma porta recortada no casco. En-
tramos então num primeiro espaço
Humanidade da UNESCO), não se museológico, no interior do caver-
podia perder. O projecto foi, assim,
reorientado: agora já não se tratava name, de ferro forrado a madeira,
dedicado à história do navio na Rota
somente de restaurar o navio, mas do Chá (“Cutty Sark – The Trader”)
sim de o reconstruir, um pouco à
semelhança do que foi feito com (ver Imagem nº 3). Esse período, que
decorreu de 1870 a 1877, é o mais
a nossa fragata "Dom Fernando II e conhecido e mais “mediático” do
Glória". Um novo e ambicioso pro- Entrada do Museu, pelo exterior, à popa do veleiro.
jecto foi elaborado pelo atelier de Clipper, bem como a sua célebre
corrida contra o seu grande rival, o
arquitectura Grimshaw. Este novo “Thermopylae” 1.Caixas de frete de
projecto avançou com algumas
ideias audazes: cobrir a doca seca chá com as dimensões da época e
marcas de estiva servem para judi-
onde se encontra colocado o navio- ciosamente ilustrar e contar esses
-museu e, a pretexto da sua recons-
trução, elevar em cerca de 3 metros anos gloriosos do lucrativo comér-
cio do transporte marítimo do chá,
o navio, sustentando-o por meio de Shangai a Londres. A viagem de-
de doze vigas triangulares de me-
tal embutidas no casco, que seria morava então cerca de 110 dias de
navegação (ida e volta), com o navio
assim também reforçado. Esta solu- a atingir velocidades de navegação
ção permitiria uma "nova" aborda-
gem museológica, proporcionando (à vela) de 16 nós! Nessa coberta,
vários dispositivos multimédia con-
uma visita complementar por baixo tam-nos a história do "comércio do
do casco do Clipper, aumentando
consideravelmente o espaço museoló- Aspecto da Coberta Inferior, dedicada à "Rota do Chá". chá no século XIX", desde o cultivo,
gico do navio, com uma nova área de mais ressante falar sobre o projecto de recupe- selecção, acondicionamento e comércio da
ração que nos propusemos visitar este ano preciosa folha, por via marítima. A meio da
de 1000 metros quadrados. coberta cruzamos um espaço para conferên-
O novo projecto foi lançado por forma em Greenwich. Recordamos que a “ve-
a conseguir uma intervenção duradoura, lha” “Cutty Sark” tinha, no seu interior, um cias, com cerca de 40 lugares. Nesse espaço
programada para mais de 50 anos... e or- pequeno espaço museológico dedicado à é realizada a projecção dum pequeno fil-
çada em 50 milhões de libras esterlinas! história portuguesa deste navio. Assim, me sobre "As viagens do Cutty Sark à volta
REVISTA DA ARMADA • SETEMBRO-OUTUBRO 2013 27