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REVISTA DA ARMADA | 488
gurança marítima é vital para a estabilidade e segurança na-
cional. Apesar de existir vontade interna, dificilmente este país
conseguirá traçar sozinho uma estratégia para sair da atual si-
tuação, onde tudo é uma prioridade. Portanto, torna-se vital
que a Somália apele ao apoio da comunidade internacional,
aproveitando o facto de ainda concentrar a atenção do mundo,
devido ao recente surto de pirataria marítima. Só assim poderá
deixar de ser um Estado falhado.
A estabilização do país no mar e em terra vai levar muitos anos
a consolidar, no entanto, é necessário começar a dar os primei-
ros passos.
qual tem contribuído para o julgamento e condenação de mui- protagonismo da pirataria no golfo da guinÉ.
tos piratas, em diversos países. Por outro lado, em terra, cons- É preciso atuar já
tata-se que as populações locais deixaram de apoiar a pirataria,
pois o usufruto regular de algum dinheiro resultante do eleva- Desde o início deste século, a pirataria no Golfo da Guiné tem
do poder de compra dos piratas ou da venda de comida e água vindo a agravar-se, contudo, não lhe tem sido atribuído um desta-
para os reféns tem vindo a acabar. Atualmente, e como resul- que tão acentuado como aquele que foi dado ao “Corno de África”.
tado do diminuto número de sequestros, o dinheiro a circular
é praticamente inexistente e os aldeões começaram a ver os Os ataques nesta região têm vindo a ocorrer com grande regu-
piratas como marginais. laridade. Entre os anos 2000 e 2013, segundo o IMB, já tiveram
lugar 334 ataques na Nigéria, 48 na Costa do Marfim, 42 no Gana
Agora que a situação parece estar mais controlada no mar, e 35 no Togo. Estes valores poderão estar aquém da realidade,
torna-se necessário promover medidas em terra que permitam pois estima-se que mais de 50% deste tipo de atos nem sequer
dar continuidade a esta acalmia e assim garantir, finalmente, al- seja denunciado pelos armadores, com receio de represálias, do
guma segurança ao transporte marítimo que cruza as águas da aumento dos seguros e da possibilidade dos seus navios terem
Somália. O atual governo deste país, para além da sua perma- que ficar alguns dias retidos no porto para averiguações.
nente luta contra o Al Shabaab5, tem que envidar esforços para
que a segurança e a reconstrução económica venham a ser uma Os Estados deste Golfo não têm presentemente qualquer tipo de
prioridade do Estado, pois 23 anos de conflitos internos per- política marítima, pois há décadas que lutam para conseguirem man-
manentes deixaram a Somália completamente destruída. Urge, ter a sua soberania e o controlo do seu território no continente, não
então, definir estratégias que possam combater e minimizar os tendo por isso dedicado muita atenção ao seu mar. Como resultado,
principais problemas do país: a fome, a doença, a guerra, o ter- as suas forças navais estão mal equipadas, pouco treinadas e subfi-
rorismo, as milícias ilegais, a pirataria marítima, a pesca ilegal, nanciadas para poderem assegurar a autoridade do Estado no mar.
o tráfico de pessoas, o contrabando de armas, o tráfico de dro-
gas e o depósito de resíduos tóxicos no mar, entre outros. A O aumento da pirataria no Golfo da Guiné fez com que a ONU
Somália dispõe, ou poderá vir a dispor, de alguns recursos que passasse a acompanhar regularmente, e com grande preocupa-
poderão contribuir para alavancar a sua economia no futuro. ção, esta situação, tendo já aprovado pelo seu Conselho de Se-
Entre eles estão a criação de gado, a indústria da pesca, a aqui- gurança duas Resoluções sobre esta temática. As 3 organizações
cultura, a extração de recursos marinhos do fundo do mar e, sub-regionais ‒ a Comunidade Económica dos Estados da África
eventualmente, o turismo. Este país dispõe ainda de 5 grandes Central, a Comunidade Económica dos Estados da África Ociden-
portos, Berbera, Bosasso, Mogadíscio, Merka e Kismayo, que tal e a Comissão do Golfo da Guiné ‒ também se têm reunido
poderão contribuir para o desenvolvimento do país. Contudo, com alguma regularidade nos últimos anos, no sentido de cria-
torna-se necessário edificar linhas de comunicação para o exte- rem sinergias para combater a presente situação.
rior, nomeadamente para Nairobi, no Quénia, para a cidade de
Djibuti, no Djibuti, para Adis Abeba, na Etiópia e para Kempala, Apesar de todo o esforço de cooperação existente ‒ ainda
no Uganda. numa fase muito embrionária ‒, se este não for acompanhado
de perto por uma presença contínua no mar, não passará de um
O primeiro passo para a edificação de uma estratégia ma- conjunto de meras ações simbólicas. Torna-se pois indispensável,
rítima para a Somália pode ter sido dado em Addis Abeba, na para manter a criminalidade marítima controlada, a existência de
Etiópia, durante um workshop realizado em março de 2013, um patrulhamento naval diário, com o possível auxílio da com-
que contou com a participação de elementos do Governo Fe- ponente aérea (com aeronaves tripuladas ou não), à semelhança
deral da Somália, e de representantes das regiões de Puntland, do que já vem sendo feito no “Corno de África”. Esta vigilância
de Galmudug e de Somaliland. A 1 de maio de 2013, em Nova dificilmente será efetiva apenas com os meios navais da região,
Iorque, no 14º plenário do Grupo de Contacto para a Pirataria, pelo que, se não houver a presença permanente de meios da co-
o próprio Presidente da República deste país, Hassan Sheikh, munidade internacional, a pirataria marítima irá paulatinamente
admitiu que o mar e as suas possibilidades económicas são continuar a aumentar.
cruciais para o desenvolvimento futuro da Somália e que a se-
Pirataria – Ataques ou tentativa destes em 2014 (até 31MAR)
Outros; 16; 33% Indonésia; 18; 37%
Nigéria; 6; 12% Estreito de
Singapura; 5; 10%
Bangladesh; 4; 8%
Fonte: IMB
12 AGOSTO 2014