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REVISTA DA ARMADA | 524
Marinha,
700 ANOS A SERVIR PORTUGAL NO MAR
PARTE III
este artigo final será abordada a intervenção da Marinha nos tem- desses espaços, bem como apoiando o exército nas operações terres-
Npos mais recentes. No final do século xviii a Marinha conheceu tres de afirmação nacional.
algum crescimento, com as medidas tomadas por Martinho de Melo Como consequência dessa disputa, em 1890 a Inglaterra entregou
e Castro e por D. Rodrigo de Sousa Coutinho, enquanto responsáveis um Ultimato a Portugal, exigindo a retirada das tropas portuguesas de
pela pasta da Marinha e do Ultramar. Mas a centúria de Oitocentos uma dada região de Moçambique, sobre a qual os Ingleses considera-
foi bastante conturbada. Começou com as Invasões Francesas, facto vam que tinham direitos. Percebeu-se perfeitamente o desequilíbrio
que levou a Família Real a partir para o Brasil, para afastar o risco de de meios navais entre as duas partes, tendo surgido uma Subscrição
deposição pelas tropas napoleónicas. A Marinha desempenhou um Nacional, que levou à recolha de fundos que permitiram a aquisição
papel fundamental nesta operação, tendo transportado cerca de 15 de um cruzador, duas canhoneiras e uma lancha-canhoneira.
000 pessoas, assim como os seus haveres e muito material das várias Esta disputa sobre os espaços coloniais prolongou-se até à Grande
instituições que acompanharam o Rei, nomeadamente a Companhia Guerra. Mais uma vez a Marinha assumiu o seu papel na defesa dos
dos Guardas-marinhas. interesses nacionais, conforme determinado pelo poder político.
Algum tempo depois, ocorreu a revolução liberal em Portugal. O Foram constituídos batalhões de Marinha, que em terra apoiaram o
Brasil tornou-se independente e grande parte dos navios que para lá exército em operações contra os Alemães, em Angola e em Moçam-
tinham ido com a Família Real, por lá ficaram. Seguiu-se um período bique, mesmo antes de Portugal estar formalmente em guerra contra
de Guerra Civil, entre Liberais e Absolutistas. Foi um conflito essen- a Alemanha. A Marinha participou ainda em operações de patrulha
cialmente terrestre, mas a única grande batalha naval entre ambas e escolta, recorrendo muitas vezes a navios civis que foram adapta-
as fações foi decisiva para o término do conflito. Ocorrida em 1833, dos para essas funções, uma vez que os meios propriamente militares
ao largo do Cabo de São Vicente, teve como resultado uma vitória eram escassos.
dos Liberais. A partir daqui, estes tiveram total liberdade de movi- O Império colonial português durou até à década de setenta do
mentos no mar, aproveitando este facto para melhor posicionarem século xx. A partir de 1961 ocorreu uma guerra de libertação, com
as suas tropas, permitindo desse modo que o conflito terminasse no especial incidência nos territórios africanos de Angola, Guiné e
ano seguinte, com a vitória liberal. Mas a Guerra Civil marcou signi- Moçambique. Mais uma vez a Marinha cumpriu as missões que lhe
ficativamente aquilo que foi a Marinha durante décadas. Existindo foram atribuídas pelo poder vigente, nomeadamente através de ope-
outras preocupações, o reequipamento naval foi sendo relegado para rações com fuzileiros, assim como ações de apoio logístico e de patru-
segundo plano, assim como a modernização das estruturas de apoio, lha das grandes bacias hidrográficas. As Forças Armadas, incluindo
como é o caso do Arsenal da Marinha. Casos paradigmáticos são a obviamente a Marinha, tiveram o papel principal na resolução deste
construção dos dois últimos grandes navios à vela. A construção da conflito, levando a cabo a revolução de 25 de abril de 1974. Entre as
fragata D. Fernando II e Glória, em Damão, demorou dez anos, de principais motivações deste movimento revolucionário estava o fim
1832 a 1842. A nau Vasco da Gama, construída no Arsenal da Mari- da Guerra Colonial, quando se percebeu que o conflito não tinha uma
nha, foi lançada á água em 1824 e só foi concluída em 1841. solução militar e que politicamente não existia vontade de procurar
Com a Regeneração, alteração política ocorrida em 1851, o país outras vias de resolução do mesmo.
conheceu alguma acalmia e desenvolvimento. Foram tomadas várias Desde sempre a Marinha continua a servir o país, participando em
medidas para modernizar a Marinha, nomeadamente em termos de operações no âmbito das alianças e organizações que Portugal inte-
programas de reequipamento, tendo sido adquiridos diversos navios gra. Assegura a vigilância e fiscalização dos espaços marítimos assim
de propulsão mista. No entanto, apesar de todas estas medidas, os como a salvaguarda da vida humana no mar. Contribui igualmente
meios navais estiveram sempre aquém daquilo que eram as necessi- para o desenvolvimento cultural, científico e tecnológico do país.
dades do reino. Recorde-se que, na época, Portugal tinha territórios No presente ano têm decorrido, e vão ainda ocorrer, diversos even-
que se estendiam por três continentes e a Marinha era fundamental tos evocativos deste sétimo centenário da Marinha Portuguesa, tendo
para garantir a ligação entre as diferentes parcelas territoriais. No final sido este o tema do Dia da Marinha, que se celebrou este ano em Vila
do século, aumentou significativamente a competição entre as dife- do Conde e Póvoa do Varzim. Ocorreu igualmente uma cerimónia na
rentes potências coloniais, no sentido de aumentar a soberania sobre Escola Naval, cujo conteúdo se encontra em caixa na página ao lado.
mais espaços, nomeadamente em África. A Marinha teve um papel
fundamental na defesa dos nossos territórios, atuando muitas vezes Costa Canas
a partir das diferentes bacias fluviais que se estendiam para o interior CMG