Page 126 - Revista da Armada
P. 126

Para consubstanciar esta nova estratégia a  Formosa foi o nome que os nossos nave-
         China tem no topo das suas prioridades a  gadores deram à ilha agora mais conhecida
         modernização da Marinha, seguida pela For-  por Taiwan. Como já disse anteriormente,
         ça Aérea e pela constituição de forças de  para os lideres chineses da RPC não existe
         reacção rápida. Com os novos navios que es-  outra solução que não seja a simples inte-
         tá adquirir à Russia e os que está a construir,  gração da Formosa na RPC, de acordo com a
         a China pretende mostrar o seu poder nas  doutrina oficial de "um país, dois sistemas".
         "blue waters". Por outro lado, como contra-  A diferença social, política e económica
         partida, o Exército de Libertação do Povo  entre os dois Estados é enorme e não vai es-
         está a ser reduzido em 500.000 efectivos.   bater-se antes do próximo século. É difícil
           Este é, por certo, um sério aviso aos seus  imaginar que um país, onde escasseiam qua-
         vizinhos concorrentes. A China vai querer  dros e o pensamento oficial se impõe a toda
         controlar o "Rimland"  de Spykman com vista  a sociedade ( Mao dizia que "cada comunista
         ao controlo da Eurásia, tendo como alvos a  deve compreender a verdade: o poder políti-
         curto prazo a apropriação de recursos pe-  co nasce do cano das espingardas"), virá a  Desfile militar de mísseis balísticos intercontinentais
         trolíferos e piscícolas do Mar do Sul da China  conseguir um desenvolvimento económico  de fabrico chinês, os Dong Feng-31.
         e das Ilhas Spratly e Paracel. Recordo recen-  capaz de se articular com o da Formosa.
         tes conflitos diplomáticos devido à presença  Se nos lembrarmos de comparar uma  mosa e todo o mundo reprovaria a sua ac-
         de navios de guerra chineses junto das ilhas  qualquer cidade da Europa Ocidental com  ção. Além disso, quem garante que os ameri-
         Spratly (cerca de 190 ilhas, recifes, atóis,  uma qualquer outra cidade da Europa de  canos não se envolveriam directamente
         numa área de 150000 milhas quadradas  no  Leste que esteve sob o domínio socialista en-  desde o primeiro momento?
         Mar do Sul da China). Estas ilhas, ricas em  tão teremos dificuldade em aceitar que um  Face a estes cenários parece restar, nos
         petróleo e gás natural, são reclamadas não só  dia Pequim (Beijing) se irá parecer com Tai-  próximos tempos, aos chineses continentais a
         pela China, que as considera historicamente  pé. Como irá sobreviver o modelo "um país,  arma da negociação política, da pressão psi-
         suas, como também pela Formosa (Taiwan),  dois sistemas"?             cológica e a enorme paciência própria dos
         Vietname, Filipinas, Malásia e Brunei.   O Presidente da Formosa, Lee Teng-Hui,  chineses.
           Os estados do Sudeste Asiático estão cons-  sobressaltou recentemente o pensamento dos  Há também quem defenda a ideia que de
         cientes dos programas militares da China e da  chineses dos dois lados do estreito, ao defen-  a RPC precisa desta retórica de patriotismo
         ameaça que ela representa. A ASEAN (Asso-  der, num livro, que a RPC se desintegrará  para assegurar a coesão interna.
         ciation of Southest Asian Nations) representa  dando origem a pelo menos sete novos esta-
         a frente unida capaz de negociar com a China.  dos: Tibete, Xinjiang, Mongólia, Nordeste, CONSIDERAÇÕES FINAIS
           Os E.U.A. também estão muito atentos a  Região de Pequim, Hong Kong e Taiwan
         toda esta área do Pacífico pois espalham-se  (Formosa).                 A moderna sociedade em que vivemos
         por lá muitos dos seus interesses.   Muitos chineses acreditam que o modelo  tem cada vez mais uma dimensão mundial,
                                            de "um país, dois sistemas" vai perdurar e vai  sendo cada vez mais vulgar ouvirmos falar
         A QUESTÃO DA FORMOSA (TAIWAN)      moldar o mundo novo que surgirá no decor-  em termos como globalização e mundializa-
                                            rer de todo o século XXI. Como é que Pe-  ção. A economia cada vez mais global tem
           A passagem da soberania de Macau para a  quim irá conter os chineses da vasta China  também efeitos cada vez mais mundiais.
         China e a resolução da questão de Timor são  com os olhos postos no el-dourado de Hong  A luta pelos mercados arrasta consigo uma
         o fim de uma odisseia que os nossos antepas-  Kong, Macau e Taipé?    luta de interesses e uma luta por recursos. Os
         sados iniciaram há mais de 500 anos. Fomos  Com tantas interrogações ainda está por  E.U.A., enquanto superpotência marítima,
         os primeiros e os últimos ocidentais a sair do  responder a questão sobre a forma como a  estão especialmente preocupados com o
         oriente.                           China Continental irá recuperar a Formosa.  desenrolar de acontecimentos na zona do
                                            Uma guerra parece pouco provável. Os  Pacífico e quererão manter a sua área de in-
                                            geopolíticos da confrontação comparam essa  fluência. Nessa área muitos países seguiram
                                            hipotética guerra com o que aconteceu após  o exemplo de modernização do Japão e são
                                            a queda de França em 1940. O exército  hoje conhecidos por tigres asiáticos. A
                                            alemão (Wehrmacht) embora potencial-  grande China está a despertar, a virar-se para
                                            mente superior aos exércitos que defendiam  o mar, e a querer reclamar o papel de super-
                                            a ilha britânica nunca conseguiram passar o  potência outrora ocupado pela Ex-URSS.
                                            Canal da Mancha. Efectivamente, embora o  Esperemos que a frase de Napoleão "quando
                                            exército da República Popular da China seja  a China acordar o mundo abanará" signifique
                                            muito superior ao da Formosa a verdade é  progresso, paz e harmonia, já que a China
                                            que dificilmente conseguiria alcançar a ilha.  não cabe na pele de um tigre...
                                            A Formosa tem actualmente mais de 150 F-16,  Hoje, não podemos dizer que o que acon-
                                            cerca de 250 F-5, 60 Mirage 2000 e aviões  tecer na Ásia não nos afecta, antes pelo con-
                                            de Hawkeye  cujo poder real em muito exce-  trário, afecta as nossas empresas e organiza-
                                            de  os mais numerosos, mas muito menos  ções e desta forma o nosso pequeno mundo.
                                            evoluídos, aviões chineses. Assim, as forças  Temos de estar atentos!
                                            navais da Formosa apoiadas pela Força Aé-
                                            rea e a protecção das baterias de costa, bem     Armando J. Dias Correia
                                            escondidas, parecem suficientes para repelir                     1TEN
                                            um eventual ataque convencional chinês.
                                            Um eventual ataque com mísseis de cruzeiro  http://www.terravista.pt/portosanto/1143
                                            semelhantes aos Tomahawk americanos pa-
                                            rece pouco provável, porque os chineses ain-
                                            da têm poucos e não se sabe a sua precisão.  Notas:
                                                                               1) Terra da orla do mundo, regiões tampão
                                            Um ataque nuclear é pouco provável, por-  nos conflitos entre os poderes continentais
         Um moderno destroyer chinês da classe Luhu.   que destruiria totalmente as cidades da For-  e os poderes marítimos
         16 ABRIL 2000 • REVISTA DA ARMADA
   121   122   123   124   125   126   127   128   129   130   131