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Análise Estratégica no apoio à decisão
Análise Estratégica no apoio à decisão
A propósito da criação do Grupo de Estudos e Reflexão de Estratégia - GERE
INTRODUÇÃO No entanto, a formação de base dos cola- social canaliza o descontentamento e, só por
boradores que são chamados a tratar situa- esta atitude, ainda que nada mais faça, pres-
Q uando a Índia realizou os seus últi- ções não pré-programadas ou não previstas, siona e influencia a decisão.
tem vindo a diminuir sensivelmente de am-
A Administração Pública é hoje mais aber-
mos ensaios nucleares, três em 11 e
dois em 13 de Maio de 1998, plitude no espaço e no tempo (geografia e ta, o que é bom. Tem que justificar decisões
Zbigniew Brzezinski escreveu: história), aprofundando-se, contudo, na espe- sobre matérias que, até há bem pouco tempo
Nos últimos anos a CIA foi acusada de não cialização e na manipulação dos instrumen- nem sequer sentiria necessidade de divulgar.
ter previsto evoluções históricas de longo al- tos da informação. Por outro lado, os responsáveis pelas deci-
cance, como o desmembramento da URSS. Aos responsáveis pela decisão escasseia o sões são mais frequentemente julgados pela
As acusações seriam mais justas se fossem di- tempo para reflectir. Os documentos que opinião pública que, por sua vez, é muito
rigidas à comunidade académica, cujo desa- lhes são submetidos apresentam bem elabo- mais dura e mais “cega”, porque é mais per-
fio intelectual é precisamente analisar e pre- radas alternativas para a resolução de um meável a manobras políticas, ao sensaciona-
ver as grandes tendências históricas. Pelo problema; mas raramente acrescentam co- lismo, ou a outros jogos de interesses. E
contrário, a missão dos serviços secretos é nhecimento, raramente fornecem elementos criou-se o péssimo hábito de tudo sistema-
detectar a tempo as principais iniciativas ou que permitam ao chefe formar a sua hipótese ticamente contestar, mesmo sem fundamen-
programas de países estrangeiros que possam própria, baseada no seu entendimento da to, porque esta é a mais fácil, mas também a
ter efeito sobre a segurança americana ou situação. mais inconsequente utilização de um direito
afectar os interesses da política externa ame- E vai aumentando sempre a interdepen- fundamental, a liberdade, e a mais irrespon-
ricana (Expresso, 16 de Maio de 1998). dência das áreas do conhecimento. A nível sável vulgarização do “direito à indignação” .
Os norte-americanos sentem este proble- interno, o estudo dos assuntos exige, quase Aumentam, portanto, os parâmetros que
ma de forma muito particular, pois estão ha- sempre, diálogo interdepartamental. Num podem interessar ou condicionar a tomada
bituados a ter em alta consideração os aca- outro nível, a solução dos problemas de inte- de decisão, sendo cada vez mais frequentes
démicos e os intelectuais, que consultam fre- resse nacional está cada vez mais depen- as referências ao que “não se podia prever”.
quentemente e de quem esperam uma parti- dente de negociações internacionais. A cópia Os responsáveis têm que ter apoio, não só
cipação complementar, útil e independente. de figurinos externos é consequência do para avaliação do que é comum, como tam-
Note-se que Brzezinski é professor univer- aproveitamento de experiências alheias, mas bém para conhecimento do que está aquém
sitário e foi conselheiro de Segurança Nacio- pode ser também fruto de um seguidismo e além, tudo para evitar aquelas situações
nal do Presidente Carter. que acaba por se revelar inadequado ao nos- “em que ninguém tinha pensado”.
Nos Estados Unidos, foi numa Universidade so carácter, ser a manifestação de um com-
que Churchill divulgou a sua ideia da for- plexo de pequenez, de falta de auto-confian- EM RELAÇÃO À MARINHA
mação da Cortina de Ferro, foi numa Universi- ça, ou também a solução fácil para a falta de
dade que o Secretário de Estado Marshall tempo. Mas este tipo de reflexão pode aplicar-se
anunciou o Plano de apoio à reconstrução da Há uma outra circunstância que conduz a ao esforço de investigação e de análise que
Europa que tem o seu nome, foi numa Univer- um resultado semelhante. A informação au- deve unir os grupos de intelectuais e os esta-
sidade que o Presidente Reagan informou a menta quantitativamente de forma surpreen- dos-maiores, no âmbito das competências da
Nação da Iniciativa de Defesa Estratégica, etc.. dente; é cada vez mais seca, aparentemente Defesa Nacional.
Entre nós há um divórcio total entre os in- mais objectiva, e foi preparada num ambi- As Forças Armadas estão subordinadas à
telectuais e os políticos. Os intelectuais são ente político, social e cultural, diferente do política, significando isto que recebem do
convidados para fazer os discursos do 10 de utilizador. Governo os objectivos e as orientações gerais
Junho. Seria inconcebível responsabilizar os O tratamento internacional das diversas para a sua prossecução. O Governo tem ain-
intelectuais por não terem alertado os políti- matérias já não é um exclusivo da diplomacia da o papel fundamental na nomeação dos
cos, fosse para o que fosse; seriam imediata- e do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Chefes.
mente postos no seu lugar! Pelo contrário, a negociação e até a assinatu- As Forças Armadas são apartidárias e não
ra de inúmeros acordos internacionais vem participam, como instituição, no debate
AMBIENTE, INFORMAÇÃO sendo uma atribuição dos departamentos do político interno.
E APOIO À DECISÃO Estado responsáveis pelo tratamento nacional Mas as Forças Armadas têm como respon-
especializado das matérias em consideração. sabilidade primeira a defesa de interesses vi-
A vida nacional e as relações internacio- Assim, os responsáveis pelas mais impor- tais, tais como a defesa da integridade do ter-
nais têm aumentado rapidamente de com- tantes decisões em sectores muito diversos ritório nacional, da segurança das popula-
plexidade. têm que considerar a componente “relações ções, da livre acção dos órgãos de soberania
O desenvolvimento científico e tecnológi- internacionais” no seu planeamento. e do livre funcionamento das instituições de-
co proporciona o acesso rápido a uma vasta Os órgãos de comunicação social, nacio- mocráticas. Evidentemente que estes interesses
gama de dados já preparados para utilização nais e estrangeiros proporcionam uma divul- vitais são, por definição, os mais permanentes
imediata pelos responsáveis pela tomada de gação instantânea de todos os acontecimen- e, muitas vezes, há a noção que a capacida-
decisão. tos notáveis, nomeadamente dos negativos. de necessária para os preservar é ofendida
Este sistema poderá satisfazer as exigências A comunicação social, por sistema ou por por alguns dos objectivos políticos, muito
impostas pela urgência das decisões, já que o vício, quase nunca está ao lado do Estado, mais variáveis e transitórios, que foram defi-
tempo de decisão vem diminuindo drastica- mesmo quando cria situações que põem em nidos pelo Governo e que estão, frequente-
mente. causa interesses nacionais. A comunicação mente, muito presos a interesses partidários.
8 FEVEREIRO 2000 • REVISTA DA ARMADA