Page 245 - Revista da Armada
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Decoração exterior da Camarinha Real.. Pintura a óleo representando Neptuno e o Cortejo Marítimo. Antes e depois da intervenção de conservação e restauro rea-
lizada em 2002
que este conjunto de embarcações reais se permitiria desenvolver a primeira fase do Pro- intercâmbio de conhecimentos a vários níveis
encontrasse em mau estado de conserva- jecto de Conservação das Galeotas Reais: o no contexto museológico (Lei nº 47/2004 de
ção. Não é difícil acreditar nas palavras do Projecto de Conservação e Restauro do Ber- 19 de Agosto, Cap. I, Art. 2º).
Sr. Teixeira sobretudo se tivermos em conta gantim Real. Eloisa Pérez Santos lembra-nos que a ex-
que se tratavam de embarcações com quase Em finais desse mesmo ano iniciar-se-iam posição deve ser um meio de comunicação
200 anos de história, que tinham sido alvo os trabalhos de recuperação da embarcação. em si mesma, com recurso à utilização de
de uma intervenção de restauro apressada outros meios que permitam comunicar as
quando da inauguração do Museu no Mos- EM JEITO DE BALANÇO mensagens que queremos fazer chegar ao
teiro dos Jerónimos, que posteriormente so- público (Santos 2000:183). Nunca se deve
freram um processo de adaptação forçada a A informação aqui apresentada constitui esquecer que, actualmente, a função do mu-
um ambiente cujos níveis de humidade rela- apenas mais um passo entre muitos que de- seu não é apenas a simples identificação dos
tiva apresentam uma grande variação entre o veriam ser dados com vista a conservar, va- objectos expostos, mas também produzir e
Inverno e o Verão e onde, por último, apenas lorizar e divulgar uma colecção marítima transmitir conhecimentos, descodificando
houve operações de manutenção durante um desta natureza e com esta singularidade. O de forma atractiva e acessível a realidade
longo período de 25 anos. trabalho de investigação até agora realiza- exposta através do recurso a uma museo-
Uma vez que nos confrontamos com a au- do é fundamental para a valorização de um grafia sugestiva e estimulante. Para Sofia
sência de qualquer outro tipo de documen- acervo que, com o tempo, ganhou um valor Cabral, a razão de ser do museu radica na
tação, o testemunho deste pintor é precioso e uma dimensão assinaláveis e cujo processo sua capacidade de estabelecer um circuito
para conhecer as intervenções efectuadas de patrimonialização deveria conduzir à sua de comunicação entre o objecto (testemu-
nas embarcações. Segundo este especialis- classificação como Tesouro Nacional. nha material de uma realidade) e o sujeito
ta, desde 1991 não existem indícios de ter Por outro lado, o nosso contacto regular com (visitante) (Cabral, 2003).
havido qualquer outro tipo de iniciativa nes- o público do Museu permite-nos comprovar Em Agosto apresentaremos a segunda parte
se sentido. que existe o desejo de ter acesso a informação do capítulo destinado à divulgação da inter-
No dia 20 de Novembro de 1997 é atri- mais aprofundada sobre esta colecção, sobre venção de conservação e restauro realizada
buído ao Bergantim Real o World Ship Trust as suas origens e características, a sua função no Bergantim Real. Nesse artigo falaremos no
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International Maritime Heritage Award . En- ao longo da história ou mesmo sobre a razão método de estudo que nos permitiu conhecer
tretanto, o processo natural de deterioração da sua existência. O sexto princípio da políti- as características técnicas desta embarcação
da embarcação vai agravando-se, a doença ca museológica nacional, o Princípio da Infor- e também no sistema utilizado com vista a
ainda não é muito visível, mas as suas con- mação, salienta a importância da recolha e da criação de um código de identificação dos
sequências serão desastrosas. O Bergantim divulgação sistemática de dados, como via de estados de conservação de cada um dos ele-
Real é mais uma vítima da falta de controlo mentos que decoram esta embarcação. Com
ambiental do Pavilhão das Galeotas Reais e o objectivo de ilustrar o processo de conser-
também da falta de um programa de manu- vação e restauro a que foi submetida esta ga-
tenção regular das embarcações expostas nes- leota entre Outubro de 2002 e Dezembro de
ta área do Museu desde 1962. 2004 apresentaremos as duas intervenções
No início de 2002, a Direcção do Museu, mais importantes do ponto de vista científi-
de quem devemos dizer que se mostrou sem- co-técnico e histórico-artístico.
pre extremamente consciente relativamente Por último, destacamos uma citação que
às necessidades que o Museu apresentava do não só ajuda a reflectir sobre a função do
ponto de vista da conservação e da museogra- museu no contexto da sociedade actual,
fia, para além de extremamente interessada como o coloca numa posição delicada de
em proceder adequadamente para com o pa- guardião de um património que é herança
trimónio do qual era responsável, revela-nos a de todos e eixo fundamental para a constru-
sua preocupação relativamente ao estado de ção da identidade portuguesa.
conservação em que se encontra a Colecção “Tomando parte de uma responsabilidade
de Galeotas Reais. colectiva pela salvaguarda e a valorização do
Conscientes ambas as partes de que uma património cultural das comunidades e dos
intervenção de conservação e restauro cri- povos, aos museus compete principalmente
teriosamente realizada permitiria a plena a investigação, a incorporação, a conserva-
fruição deste património marítimo a vários ção, a exposição, a comunicação e a educa-
níveis, abrindo ao mesmo tempo, caminho ção” (Filipe, 2007:2) Z
a futuros trabalhos de investigação, avança- Restauro dos frisos decorativos do exterior da embarca- Mestre Lorena Querol
mos com a apresentação do documento que ção em contacto directo com o público do Museu. Conservadora e Museóloga
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