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Breve evocação do vulcão dos Capelinhos
Breve evocação do vulcão dos Capelinhos
1957 – 2007
ma erupção vulcânica, seja qual for mais interessadas, profissionalmente, entre a natureza e as dimensões dos grandes blocos
o seu tipo, é um fenómeno natural as quais o Tenente-Coronel José Agostinho, arrancados às paredes das crateras pela força
Uque, para além de ser a única ma- director do Observatório de Angra do He- das explosões; e assistimos às violentas mani-
neira de ver “nascer terra”, desperta imensa roísmo e o Engenheiro Frederico Machado, festações eléctroestáticas produzidas pela fric-
curiosidade, inicia-se por uma longa série de então Técnico Superior na Junta Autónoma ção brutal entre as partículas expelidas.
tremores de terra e provoca, quase sempre, dos Portos de Angra; no início da tarde de As primeiras observações sistemáticas foram
estragos mais ou menos avultados. 4 de Outubro chegou a pequena Missão do iniciadas no dia 6; e, num continuum de 32 ho-
O vulcão dos Capelinhos não fugiu à re- Centro de Estudos Geográficos (1), enviada ras, mostraram que a sucessão das fases de pa-
gra. Desde o dia 24 de Setembro de 1957, a pelo Ministério da Educação, que logo entrou roxismo e de acalmia era irregular: por vezes
Ilha do Faial, nomeadamente no seu prolon- em comunicação com as autoridades locais podiam ocorrer violentíssimas explosões quase
gamento oeste, foi assolada por contínuas e muito duradouras (a
numerosos abalos sísmicos, em- mais longa registada foi de 4h12);
bora de pequena intensidade, outras, embora violentas, eram
que se manifestaram cada vez de mais curta duração (23 a 35
mais próximos uns dos outros minutos) e diferentemente espa-
até ao amanhecer do dia 27, o çadas entre si (intervalos maiores
que, por vezes, dava a sensação entre 1h34 e 3h36); nas de média
de um tremor contínuo. Quan- intensidade foram registados pe-
do o Sr. Tomás Pacheco, faroleiro ríodos entre 1h03 e 2h59 ; naquele
de serviço, pelas 0645 da manhã mesmo período de tempo apenas
foi observar o estado do mar, ve- foram apontadas duas acalmias
rificou, “a cerca de um quilóme- aparentemente totais, pela ausên-
tro a ONO do farol, uma man- cia completa de vapores de água
cha azul-clara” e pouco depois ou de qualquer outra manifesta-
no meio dela viu “borbulhar a ção, ambas de muito curta dura-
água” e quase de seguida “le- ção: cerca de 2 minutos cada uma,
vantar-se em cachão”, caindo O edifício vulcânico apresentava, a menos de uma semana do seu “nascimento”, a clás- seguindo-se logo explosões de
algumas pedras em seu redor. sica forma de ferradura (4-10-1957). pequena intensidade que iam au-
Nascera o vulcão dos Capelinhos. pelas quais foi posta ao corrente dos aconte- mentando progressivamente. O início de cada
Não era a primeira vez que os açorianos cimentos mais perceptíveis: a existência de explosão era precedido pelo empolamento da
presenciavam uma erupção vulcânica subma- grandes explosões alternando ritmicamente água lodosa, sempre presente na cratera, à ex-
rina; o episódio mais famoso foi, porventura, com períodos de maior serenidade. A Missão cepção de no fim dos grandes paroxismos; e
o de 1811, que deu origem à pequena ilha Sa- ficou instalada numa casa vaga, posta à sua só por breves instantes. Assim se formou uma
brina, assim baptisada pela guarnição de uma disposição pelo Governador Civil, Dr. Freitas ilha que cresceu de dia para dia construindo-
fragata inglesa, com esse nome, casualmente Pimentel, situada na estrada que conduz ao -se em formas sucessivas, sendo a mais típica a
em Ponta Delgada, que logo que aquela se farol, a cerca de dois quilómetros e meio do “clássica” ferradura mais ou menos aberta até
tornou visível acorreu ao local e nela implan- foco eruptivo e com excelente visibilidade: foi ao anel irregular, a qual, devido a um capricho
tou a bandeira de Sua Magestade; efémera o nosso “quartel general” nos dois períodos das condições atmosféricas (2) manteve sem-
ilha: poucos dias (ou horas) depois, o mate- de intervenção directa: 4 a 22 de Outubro de pre para o lado de terra o bordo mais baixo,
rial friável que a formara era engolido pelas 1957 e de 2 a 27 de Janeiro do ano seguinte. possibilitando-nos uma observação correcta
vagas do oceano. Mas a sorte dos Capelinhos Foram anotadas sistemática e meticulosa- de todo o edifício vulcânico.
foi diferente: a força e a frequência das explo- mente as fases de actividade e as suas cara- Este estilo de erupção é caracterizado pela
sões, com emissão de enormes quantidades cterísticas e analisados, quanto possível com projecção violentíssima dos materiais em gran-
de cinzas, lapilli, vapores e episódios interca- os meios ao dispor, os materiais expelidos des jactos verticais (surtseyanos) ou oblíquos,
lares de lava, aliada à sua duração, acabaram em grandes quantidades: tipos e altura das com uma forma que lembra a ramagem de
por originar um vasto promontório a oeste nuvens, quer as de cinza e lapilli quer as de abetos (cipressoides); na extremidade de cada
da “velha” ilha do Faial, o qual, evoluindo vapores de água e de gases, ora elevando-se um deles, constituídos essencialmente por es-
na sua estrutura e aparência, se mantem ain- na atmosfera, quando leves, ora enovelando- córias, lapillis e cinzas, via-se sempre uma pe-
da hoje, cinquenta anos após o início do seu -se e “correndo” à superfície do mar, quando dra, por vezes de grandes dimensões, como
longo adormecimento. densas; sempre que “permitido” verificámos que orientando o todo; de cor negra e baça,
A partir dos pri- a achocolatada,
meiros momen- eram acompanha-
tos da actividade dos pela presença
eruptiva, o fenó- quase constante
meno foi acompa- de vapor de água
nhado por curio- (3) que, à medida
sos, que vinham que se elevava,
não só de outros se misturava pro-
pontos da Ilha gressivamente ao
como, principal- conjunto; na base,
mente, da vizinha porque de muito
Ilha do Pico, e por Violento jacto surtseyano e nuvens densas em couve- Fortes jactos cipressoides e emanações de gases (6-10-57). maior densidade,
personalidades -flor (5-10-57). enovelavam-se ga-
REVISTA DA ARMADA U SETEMBRO/OUTUBRO 2007 25