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Uma obra portuguesa de Claude-Joseph Vernet
Uma obra portuguesa de Claude-Joseph Vernet
As referências marítimas do quadro do Marquês de Pombal
olhar dos artistas franceses sobre Marquês de Pombal , situado a pouca dis-
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Portugal em meados do século tância da foz do Tejo. A tela foi pintada en-
O XVIII encon- tre 1766 e 1767, ou seja
tra-se marcado por 11 anos após o trágico
uma obra monumen- terramoto, maremoto
tal, conjuntamente e incêndio do dia 1 de
assinada em Paris Novembro de 1755.
por Louis-Michel A cidade de Lisboa
Van Loo (1707-1771) encontrava-se então
e por Claude-Joseph em pleno bulício de
Vernet (1714-1789), reconstrução, obras
dois grandes pin- que se irão prolongar
tores da sua época. por mais de 20 anos .
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Trata-se do quadro Esse tema determina
«O Marquês de Pom- uma parte do sentido
bal expulsando os da obra.
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jesuítas» que repre- A génese do qua-
senta o estadista, em dro é particularmen-
1759, no centro de te instrutiva e infor-
uma cena de grande ma sobre os laços
significado político e que nesses anos exis-
económico. tiam com a França e
Duas razões prin- os seus artistas. Em
cipais fazem deste primeiro lugar, a en-
quadro português comenda foi feita por
uma obra excepcio- dois abastados nego-
nal do seu tempo. ciantes estrangeiros
Em primeiro lu- instalados em Por-
gar a notoriedade in- “O Marquês de Pombal expulsando os Jesuítas”. tugal, o suíço David
ternacional dos dois Purry e o seu sócio, o
mestres: Louis-Michel Van Loo que goza A obra, verdadeiro quadro “ideológico”, inglês Gérard de Visme, ambos protegidos
de uma brilhante reputação de retratista de ocupa um lugar de destaque na pintura e inquilinos de Pombal em Lisboa . Os dois
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corte, e Claude-Joseph Vernet a quem dedi- portuguesa do século XVIII, inscrevendo- homens, comerciantes de madeira brasil
camos este artigo. Vernet, que efectuou uma -se tanto na tradição da paisagem clássica e detentores doutras concessões tiveram
longa estadia de 19 anos em Itália, inspiran- e na exigência iconográfica pombalina, es- um papel notório no apoio que deram a
do-se em Claude Gelée conhecido por «Le tilo característico dum «classicismo de tran- artistas da escola francesa, instalados ou
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Lorrain» , seguiu Adrien Manglard, pintor sição» que marca em Portugal a passagem de passagem por Portugal . Mais ainda,
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francês de paisagens e de marinhas e tor- do rococó ao neoclássico. a encomenda foi feita em Paris, junto de
nou-se, em 1743, membro da Academia de No entanto, a feitura da grandiosa tela per- um dos principais retratistas das cortes
São Lucas, em Roma. De regresso definitivo manece pouco estudada, nomeadamente no da Europa e junto de um dos pintores de
a França em 1753, Vernet colocou-se ao ser- que concerne à participação de Vernet, que marinhas mais talentoso e reconhecido no
viço do Marquês de Marigny, Director Geral acaba por conferir à obra características muito século XVIII.
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e Ordenador dos Edifícios do Reino, exer- próprias de uma pintura de marinha . A pintura centra-se na personagem do
cendo a sua gran- Marquês de Pom-
de especialidade, bal, sentado, do-
a pintura de mari- minando o Tejo e
nhas. Essa arte fê-lo Lisboa, mostrando
ingressar, em 1746, a sua obra à poste-
no seio da Acade- ridade. A cena ma-
mia Real de Pintu- rítima que ocupa o
ra e de Escultura, lado direito do qua-
levou-o a expor re- dro, reveste-se de
gularmente nos Sa- uma grande impor-
lões de Paris e final- tância. A paisagem
mente garantiu-lhe compõe porventu-
o prestigioso titulo Cartela. ra um verdadeiro
de «Pintor da Marinha do Rei» Luís XV. O quadro de grandes dimensões (apro- “quadro no interior do próprio quadro”,
Seguidamente a temática, ou mais exac- ximadamente 2,3 m de altura por 3,4 m de pela unidade da temática (cena marítima
tamente, as temáticas da obra. Estamos cumprimento), hino à glória de Sebastião delimitada dum ponto de vista geográfico,
de facto perante um quadro monumental José de Carvalho e Mello, Secretário de Es- pela Barra do Tejo, pelo Bairro marítimo de
pouco comum; pintura de intérior e de ex- tado do Reino de D. José I, destinava-se a Belém e animada por navios e personagens)
terior, em simultâneo retrato de Homem de ornamentar os Salões do Palácio de Oei- como pelas dimensões (aproximadamente
Estado e arquétipo de encenação do poder. ras, residência de Verão do Conde e futuro 0,9 m por 1,2 m).
18 NOVEMBRO 2008 U REVISTA DA ARMADA