Page 62 - Revista da Armada

50 Anos no Espaço
50 Anos no Espaço

INTRODUÇÃO que um projéctil, lançado por um poderoso tiu maciçamente na tecnologia dos foguetes.
canhão do cume de uma alta montanha, re- Este trabalho colheria os seus frutos durante a
o dia 4 de Outubro de 1957 a União cebia um impulso suficientemente forte para II Guerra Mundial, altura em que as temíveis
Soviética anunciava oficialmente o lan- que seu movimento balístico descrevesse uma bombas V1 e V2, com alcances da ordem dos
Nçamento do primeiro satélite artificial curva concêntrica à Terra, de modo a nunca 300 km, semearam a morte e a destruição em
da História: o Sputnik I. cair no solo (i.e., cairia sempre fora da Terra, território aliado. Estas terríveis armas não fo-
Naquela data, sobre a qual se completam pelo que continuaria a “cair”, indefinidamen- ram, porém, suficientes para evitar a derrota
50 anos, a Humanidade entrava oficialmente te, em torno dela). das forças do Eixo. Durante a invasão da Ale-
na chamada “Era Espacial”. O Mundo nunca Os princípios eram, já, conhecidos… Faltava, manha a base de foguetes de Peenemünde
mais seria o mesmo. ainda, a tecnologia para pô-los em prática. caiu nas mãos do Exército Vermelho, contu-
do os equipamentos de maior valor tinham,
PRINCÍPIOS CIENTÍFICOS - BREVE A CORRIDA AO ESPAÇO já, sido destruídos pela Wermacht. Entretanto,
ABORDAGEM A partida para a grande aventura espacial uma equipa de cerca de 150 cientistas e técni-
foi dada a partir do momento em que os cien- cos, tratara de se render aos americanos. Entre
Por definição, um satélite é um corpo que tistas se aperceberam de que a força da gravi- eles encontrava-se Wernher Von Braun, que vi-
orbita em torno da Ter- ria a desempenhar um
ra ou de outro planeta, papel determinante no
mantendo a sua altitu- programa espacial dos
de graças ao equilíbrio Estados Unidos.
entre a força da gravi- No período do pós-
dade, que o atrai, e a guerra a pesquisa
força centrífuga causa- científica espacial foi
da pelo seu movimen- liderada pelas duas
to circular, que tende a superpotências anta-
afastá-lo. Um fenóme- gónicas: EUA e URSS.
no semelhante ocorre Naturalmente, a par de
quando fazemos girar um genuíno interesse
uma pedra na ponta de O princípio do movimento orbital em explorar o Cosmos
um cordel: a força centrífuga do movimento dade poderia ser vencida com o recurso a veí- existia uma forte motivação de cariz militar (de
mantém-na afastada do observador, enquanto culos de impulso contínuo e massa variável: onde proveio o grosso do seu financiamento),
a tensão da guita a impede de se soltar. os foguetes. pois, além da inerente componente propagan-
No espaço, os corpos celestes orbitam entre Embora estes engenhos autopropulsionados dística, era inegável que qualquer governo ca-
si obedecendo a leis da Física cujo enunciado – com pólvora negra - já fossem utilizados na paz de lançar um engenho para o espaço teria
foi formulado por Johannes Kepler em 1605. China medieval como projécteis e lançadores também a capacidade de produzir um míssil
Estas leis, baptizadas com o nome do ilustre de fogo-de-artifício, só no dealbar do século intercontinental para levar a destruição ao ter-
astrónomo, baseiam-se em três princípios fun- XX, com os trabalhos do cientista russo Kons- reno do adversário.
damentais, extrapoláveis para qualquer movi- tantin Tsiolkovsky, se equacionou a possibilida- Em 1956, Von Braun e os seus colegas ame-
mento de gravitação: de de utilizar estes veículos – agora movidos a ricanos tinham, já, aperfeiçoado o foguetão Ju-
1. Os planetas descrevem órbitas elípticas em combustível líquido - na exploração espacial. piter C, cujo alcance de 5.280 km era um ver-
torno do Sol, que ocupa um dos focos; O primeiro lançamento com sucesso de um dadeiro marco para a época. Seriam, porém, os
2. O raio-vector que liga um planeta ao Sol foguete de combustível líquido seria condu- soviéticos a tomar a dianteira.
descreve [i.e. “varre”] áreas iguais em A 4 de Outubro de 1957, um incon-
tempos iguais; fundível bip electrónico era sentido nos
3. O quadrado dos períodos de revo- aparelhos de rádio e televisão em todo
lução são proporcionais aos cubos das o Mundo. Logo em seguida, a URSS
distâncias médias do Sol aos planetas. anunciava a colocação em órbita do
Da segunda e terceira leis retira-se o Sputnik I, uma esfera metálica com 60
corolário de que quanto mais curta a cm de diâmetro e 83 kg de peso que
distância ao centro da órbita, mais rá- fora lançada a uma altitude de 939 km
pido terá de ser o movimento circular e se deslocava a uma velocidade de
para gerar uma força centrífuga suficien- 29.800 km/h, completando uma volta
temente forte para anular os efeitos da à Terra a cada 96 minutos.
força da gravidade. Naturalmente, em pleno contexto de
Assim sendo, para colocar um saté- Guerra Fria, esta notícia causou grande
lite em órbita é necessário um meio de consternação nos EUA, pois mostrava
lançamento que, ultrapassando a força que os soviéticos detinham tecnologia
gravítica da Terra, o faça atingir uma para a produção de foguetes cuja potên-
determinada altitude, numa trajectó- cia excedia largamente a dos engenhos
ria o mais paralela possível à superfície americanos.
terrestre, em que a velocidade a que se Modelo do Sputnik I. E foram, também, os soviéticos, me-
desloca lhe imprima um movimento circular zido pelo americano Robert Goddard a 16 de nos de um mês depois (3 de Novembro), a co-
suficientemente rápido para equilibrar a força Março de 1926. locar no espaço o primeiro ser vivo, a cadela
de atracção que se faz sentir àquela distância. Durante a década de 1930 a Alemanha Laika, enviada a bordo do Sputnik II.
Já Isaac Newton, na transição entre os séculos Nazi, limitada na sua produção de armamento Mas a América não dormia: acelerando o
XVII e XVIII, imaginara uma experiência em pelas restrições do tratado de Versalhes, inves- seu programa, os americanos conseguiram co-

24 FEVEREIRO 2008 U REVISTA DA ARMADA