Page 8 - Revista da Armada
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REFLEXÃO ESTRATÉGICA 7
A INFLUÊNCIA DE MAHAN EM PORTUGAL
N o início do século XX Por-
tugal vivia um período de siva, para o ressurgimento do poder
acentuada decadência im- marítimo nacional.
perial no Oriente e estava confron-
tado com a desagregação do poder Os obreiros mais notáveis desta
naval, decorrente da falta de meios causa foram Pereira da Silva, Ma-
para garantir uma presença capaz galhães Corrêa e Botelho de Sousa
de assegurar a defesa dos seus inte- que, por força das suas intensas vi-
resses, em caso de ameaça militar. vências marinheiras, cedo se aper-
Foi nesta conjuntura que uma pro- ceberam da necessidade de o país
posta, apresentada no Parlamento adoptar uma estratégia naval para
para reduzir os efectivos da Armada, defesa dos seus interesses. Em vir-
alarmou alguns sócios do Clube Mi- tude dos estudos e trabalhos destes
litar Naval. Seguindo o exemplo de oficiais se basearem na doutrina de
Inglaterra, onde em 1894 fora cons- Mahan, contribuíram para fomentar
tituída a Navy League, a mais antiga o ressurgimento naval português, ao
das Ligas Navais estabelecidas em mesmo tempo que puseram em evi-
diversos países, com a finalidade de dência a utilidade e indispensabili-
fomentar o interesse pelos assuntos dade da Marinha, como instrumento
marítimos, aqueles sócios criaram a Contra-almirante Pereira da Silva. para alcançar os desígnios políticos
Liga Naval Portuguesa, com o pro- mapas, quadros e gravuras, a Liga Na- nacionais.
pósito de: estudar os problemas que se val Portuguesa tornou-se no principal
colocavam ao ressurgimento marítimo instrumento de divulgação das obras O Contra-almirante Pereira da Sil-
nacional; animar e proteger a va foi, certamente, o maior plane-
iniciativa particular para a ex- ador estratégico naval português do
pansão da economia marítima século XX. Em 1909, ainda primeiro-
nacional; e velar pelo futuro da
Marinha de Guerra, como salva- -tenente, viu a Liga Naval Portu-
guarda dos interesses marítimos guesa publicar o seu livro intitu-
de Portugal. lado O Nosso Plano Naval, onde
A assembleia geral constitutiva fazia a apologia da doutrina de
da Liga Naval Portuguesa ocor- Mahan, sobretudo nos capítulos
reu a 2 de Março de 1901, como que dedicou ao domínio do mar
corolário do intenso período de e ao valor da ofensiva na guerra
trabalho desencadeado a 27 de naval, designadamente, aos ti-
Abril de 1900 pelo Segundo- pos de navios que convinham à
-tenente António Alves Pereira nossa Marinha, à contribuição
de Matos, a que se juntaram per- dos diversos agrupamentos para
sonalidades militares e civis do as marinhas de guerra, à dis-
maior relevo, como Gago Cou- tribuição estratégica das nossas
tinho, Pereira da Silva, Ernesto forças navais por bases de ope-
de Vasconcelos, Isaías Newton, Maga- escritas por vários oficiais que perfi- rações e pontos de apoio, além
lhães Ramalho, Morais e Sousa e Hen- lhavam o pensamento estratégico de da preparação militar das for-
rique Bensaúde, todos eles apoiantes Mahan, contribuindo, de forma deci- ças navais para a guerra. Esta
do fortalecimento marítimo de obra teve enorme relevância no
Portugal. demonstrar da desadequação do pen-
Em 15 de Outubro de 1902 samento estratégico português, que
foram aprovados novos estatu- ainda se encontrava sob influência
tos relacionados com as mari-
nhas de comércio, pesca, re- dos factos relativos às inva-
creio e guerra, cujo objectivo sões francesas e das ideias de
era conferir maior campo de Sebastião Telles, cuja primei-
acção à Liga Naval Portugue- ra prioridade era a defesa do
sa, para que esta pudesse cum- Tejo, como se, no século XX,
prir os desígnios que levaram bastasse defender Lisboa para
à sua fundação. Fruto de uma ter seguro todo o país! Como
activa campanha de propagan- então referiu Pereira da Silva,
da marítima que se estendeu as colónias e os arquipélagos,
a todo o país, materializada as aspirações e o carácter do
através de palestras, confe- povo, bem como as tradições
rências, publicações de livros, Cartaz da Liga Naval - 1912. de Portugal, exigiam uma ma-
rinha com valor militar apre-
ciável e capaz de exercer a
soberania nacional. Para isso,
e apesar do país se encontrar
numa situação financeira deli-
8 FEVEREIRO 2013 • REVISTA DA ARMADA