Page 23 - Revista da Armada
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REVISTA DA ARMADA | 504

  Em termos práticos ficou definido que    a neutralidade nacional no conflito eu-                      ficaria à disposição do Comandante do
uma corveta, fragatinha ou bergantim       ropeu, devendo expulsar da costa os na-                      Porto, o qual deveria empregar todos os
da Armada Real ficasse sempre fundea-      vios suspeitos de corso entre a França e                     meios para que aquele navio pudesse re-
da, pronta a largar, entre a Torre de Be-  Inglaterra.                                                  abastecer-se de água, e outras quaisquer
lém e S. Julião. Junto à Torre de Belém                                                                 necessidades, e largar de Lisboa no prazo
ficaria igualmente fundeada uma nau de       O Comandante do Porto de Lisboa pe-                        máximo de 24 horas. Excecionalmente,
linha, que era um tipo de navio de gran-   rante a presença de um navio corsário                        no caso de necessidade de reparação de
de porte e com significativa capacidade    mandaria um oficial a bordo, juntamente                      avarias, o Comandante do Porto poderia
combatente, onde estaria embarcado o       com o escaler da saúde, para recolher as                     estender o prazo até 48 horas, mantendo
Comandante do Porto de Lisboa. Estes       informações sobre a natureza dos moti-                       informado o Ministro, Secretário de Esta-
navios tinham como propósito garantir      vos que o obrigaram a arribar ao Porto                       do dos Negócios da Marinha.
                                           de Lisboa. Após esta diligência, o corsário
                                                                                                          Em todo o caso o Comandante do Por-
                                                                                                        to deveria garantir que os corsários fun-
                                                                                                        deavam o mais próximo possível da sua
                                                                                                        nau, assegurando maior vigilância sobre
                                                                                                        qualquer desordem, insubordinação das
                                                                                                        guarnições, ou conflitos entre corsários
                                                                                                        de diferentes nações beligerantes. E para
                                                                                                        garantir a tranquilidade do Porto, o Co-
                                                                                                        mandante não devia permitir que qual-
                                                                                                        quer corsário içasse outra bandeira que
                                                                                                        não a da sua nacionalidade!

                                                                                                          Para além desta tarefa específica no
                                                                                                        âmbito da conservação da neutralidade
                                                                                                        nacional, o Comandante do Porto, assim
                                                                                                        como o da corveta, deviam atuar nos ca-
                                                                                                        sos de tentativa de contrabando e de fur-
                                                                                                        tos que se intentasse praticar nos navios
                                                                                                        fundeados no rio Tejo.

                                                                                                          Ainda no que se refere à autoridade
                                                                                                        do Estado no mar, por alvará de 4 de
                                                                                                        maio de 1805 foi oficialmente adotado o
                                                                                                        alcance em distância do tiro de canhão
                                                                                                        (cerca de 3 milhas náuticas) como limite
                                                                                                        do espaço geográfico marítimo, medido
                                                                                                        desde a linha de costa, controlável a par-
                                                                                                        tir de terra. Neste espaço o Estado con-
                                                                                                        seguia, de alguma forma, impor a sua lei
                                                                                                        pela força, tendo sido designado por mar
                                                                                                        territorial e a linha limite sido designada
                                                                                                        por “linha de respeito”.

                                                                                                          Concluindo, o surgimento do serviço
                                                                                                        de policiamento marítimo, ainda que
                                                                                                        com caráter provisório, aconteceu em
                                                                                                        1803 como uma medida que visava a
                                                                                                        manutenção da neutralidade portuguesa
                                                                                                        no persistente conflito entre a França e
                                                                                                        a Inglaterra. Este serviço baseava-se na
                                                                                                        manutenção em permanência de dois
                                                                                                        navios à entrada do Porto de Lisboa que
                                                                                                        asseguravam que os corsários destes pa-
                                                                                                        íses não se abrigavam nem vendiam as
                                                                                                        suas presas em Portugal. Como tarefa
                                                                                                        secundária, o Comandante do Porto de
                                                                                                        Lisboa garantia a boa ordem e prevenia o
                                                                                                        contrabando e os furtos nos navios fun-
                                                                                                        deados no rio Tejo.

Preâmbulo da carta régia que estabeleceu de forma primária o policiamento marítimo do Porto de Lisboa.  Bessa Pacheco
                                                                                                                     CFR

                                                                                                        FEVEREIRO 2016 23
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