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REVISTA DA ARMADA | 546
VIGIA DA HISTÓRIA 113
UM REGIMENTO
INVULGAR
fl uxo de membros das várias ordens religiosas para os territórios de
O África e da Índia foi, desde que os portugueses ali se instalaram, uma
constante.
É perfeitamente plausível que todos eles levassem, dos respecƟ vos supe-
riores, instruções quanto à conduta e quanto às linhas de acção a desenvol-
ver junto das populações nos locais para onde se desƟ navam.
O que hoje aqui trago, e que tanto quanto julgo saber é caso único (afi r-
mação esta que vale o que vale, se é mesmo que vale alguma coisa), é a
existência de um conjunto de instruções para a forma como os religiosos se
deveriam comportar a bordo do navio que os transportasse.
Tal situação verifi cou-se relaƟ vamente aos frades AgosƟ nhos que, em
1572, iam seguir viagem para a Mina, aos quais, por regimento datado
de 23 de Fevereiro daquele ano, se indicavam algumas regras de conduta,
regras essas que, nalguns casos, nos possibilitam conhecer alguns dos
aspectos mais marcantes, na ópƟ ca dos religiosos, da vida a bordo dos
navios daquela época.
As primeiras recomendações reportam-se ao comportamento a seguir
caso navegassem no período da Quaresma, altura em que deveriam efec-
tuar uma práƟ ca espiritual diária, seguida de ladainhas e terminando com
orações à Virgem, a S. AgosƟ nho e a S. Nicolau.
Estabelecia-se, igualmente, que se se navegasse durante as Endoenças se
deveriam fazer, como pudessem, os respecƟ vos oİ cios religiosos e, à noite,
disciplinas.
Todas as manhãs, ao levantar, deveriam os frades dar os bons dias a toda
a gente, começando pelo capitão do navio, a quem deveriam ainda apre-
sentar muitos cumprimentos.
Durante as pregações, na Quaresma, deveriam exortar toda a gente à
confi ssão frequente, a evitarem fazer juras e jogos em excesso, estabele-
cendo penitências e multas aos que jogassem a dinheiro.
No dia a dia deveriam evitar quezílias com as gentes, nem usar linguagem
agressiva, mesmo quando se tratasse de ofensas a Deus, salvo se o pecado
fosse muito grave.
Deveriam igualmente repreender os cantares torpes e o uso de linguagem
imprópria, o que deveria ser feito “com rosto modesto e com uma tristeza
santa que confunda quem as disser, mas não os chamando de desonestos“.
Não deveriam permiƟ r a leitura de livros profanos, nem conversarem
familiarmente com os seculares, excepto para os trazer benévolos e recep-
Ɵ vos.
No que diz respeito à vida no mar, o regimento termina recomendando
que tratassem os enfermos com muita caridade, dando do que levassem
aos mais necessitados, não o devendo fazer, no entanto, a gente mal acos-
tumada enquanto não se emendassem dos seus vícios.
Cmdt. E. Gomes
Fonte: Monumenta Missionaria Africana vol. XV
N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co
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