Page 8 - Revista da Armada
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REVISTA DA ARMADA | 549
tempo que os países em desenvolvimento bus-
cam preservar aquilo que são os seus interesses, DR
face às possibilidades de expansão de sobera-
nia que, como antes referido, a Convenção das
Nações Unidas sobre o Direito do Mar veio per-
miƟ r aos estados ribeirinhos. Os países desen-
volvidos tentam afi rmar os seus interesses no
mar, provocando alterações do Direito Interna-
cional MaríƟ mo, considerando essa acção como
um acto políƟ co com consequências económi-
cas, ao mesmo tempo que adoptam a retórica
igualitária do mar como recurso comum. Os paí-
ses em desenvolvimento esforçam-se por reivin-
dicar a autoridade no mar, mas sentem os seus
interesses ameaçados, por terem reduzidas
capacidades cienơ fi cas, tecnológicas e militares,
que diligenciam colmatar com recurso a alianças
externas. Nestas circunstâncias, a superação dos
desafi os políƟ cos para o reencontro de Portugal
com o mar requer, de forma fundamental, a Amarração do 1º windfl oat do projecto Viana AtlanƟ c.
mobilização da sociedade civil para os assuntos
do mar e a capacitação dos negociadores dos espaços maríƟ mos. tráfi cos de pessoas, de armas e de estupefacientes. Também são
Para além disso, implica que o País disponha de capacidade diplo- uma decorrência das ameaças sistémicas, concretamente do ter-
máƟ ca, cienơ fi ca e tecnológica para afi rmar o interesse nacional, rorismo internacional e da proliferação de armas de destruição
aliada à apƟ dão mulƟ disciplinar para ocupar e usar os espaços massiva. Os desafi os securitários decorrem, ainda, de ameaças
maríƟ mos nacionais. patrimoniais resultantes de acidentes naturais e outros acidentes
RelaƟ vamente aos desafi os económicos, importa salientar que, maríƟ mos, alguns provocados, e das ameaças militares, consequên-
no campo dos recursos marinhos, resultam da exaustão dos recur- cia, mais provável, do emprego de meios navais para alcançar fi na-
sos vivos, do mar ser a úlƟ ma grande mina mundial, da crescente lidades políƟ cas. Nestas circunstâncias, a superação dos desafi os
necessidade dos seus recursos, e da rejeição de medidas assentes securitários para o reencontro de Portugal com o mar, recomenda
na equidade, solidariedade e parƟ lha. Por outro lado, no campo a colaboração no reforço dos instrumentos de cooperação interna-
das acƟ vidades comerciais e industriais ligadas ao mar, os desafi os cional, nomeadamente na aplicação fi rme dos preceitos insƟ tuídos
económicos estão associados aos crescentes confl itos de interes- na legislação internacional, e no uso parƟ lhado das plataformas e
ses entre múlƟ plos actores nacionais e internacionais, e às novas ferramentas da NATO e da UE aplicáveis neste contexto, que permi-
oportunidades ligadas à náuƟ ca de recreio, ao turismo náuƟ co, ao tem o conhecimento e a repressão de actos ilícitos, quer do ponto
transporte maríƟ mo, aos portos e à logísƟ ca, aos recursos vivos e de vista da salvaguarda (safety), quer do ponto de vista da protecção
não vivos, à biotecnologia azul ou ainda, à construção e à reparação (security). Requer, ainda, adequar a acção securitária do Estado no
navais. Nestas circunstâncias, a superação dos desafi os económicos mar, concretamente arƟ culando o planeamento das capacidades
para o reencontro de Portugal com o mar, implica: elaborar uma públicas securitárias, explorando o potencial do múlƟ plo-uso des-
políƟ ca pública da economia do mar; obter capacidade cienơ fi ca e sas capacidades, e coordenando a actuação dos diferentes depar-
tecnológica acrescida, que permita idenƟ fi car e explorar os recur- tamentos públicos, promovendo sinergias entre todos.
sos inertes existentes nos fundos marinhos; e regular e exercer, Na sua essência, as medidas antes enunciadas ajudam a perceber
com coordenação e efi cácia, a autoridade do Estado no mar. a importância, a dimensão e a complexidade dos desafi os a que Por-
Quanto aos desafi os securitários, são consequência das amea- tugal terá de fazer face para se reencontrar com o mar. Isto é, para
ças erosivas, nomeadamente, a criminalidade transnacional e os ser capaz de o usar na justa medida dos seus interesses de desenvol-
vimento e segurança. Todavia, para que estas
DR medidas possam ser reconhecidas e aceites
pelos portugueses, despertando vocações e
animando vontades, afi gura-se indispensá-
vel estabelecer uma visão maríƟ ma de futuro
para o País, moƟ vando os cidadãos e as orga-
nizações públicas e privadas, e mobilizando-os
para projectos maríƟ mos de âmbito cultural,
políƟ co, económico, ambiental e securitário,
tarefas onde todos necessitamos de nos envol-
ver, porque sem o empenho colecƟ vo no mar,
nada acontecerá de relevo, apesar dos esforços
realizados por pessoas notáveis que, individual-
mente, muito têm feito por Portugal, neste
importante domínio do nosso futuro comum!
António Silva Ribeiro
Almirante
Pôr do sol na foz do Douro.
N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfi co
8 MARÇO 2020