Page 16 - Revista da Armada
P. 16
REVISTA DA ARMADA | 563
D. António de Ataíde estava em Madrid quando faleceu o rei, ten- Na sua primeira grande jornada de combate, onde desembarca-
do consigo um conjunto de assuntos pendentes sobre a Armada ra para actuar nos momentos mais decisivos da refrega, o Terço
de Portugal. Um deles era, naturalmente, a sua confirmação no cobria-se da glória que o acompanharia em quase toda a sua exis-
cargo – uma vez que a anterior nomeação fora apenas por três tência, sempre que foi necessário actuar.
anos – e um outro era o “batalhão de soldados” que devia ser Quando a armada regressou a Portugal, D. Francisco de Almeida
recrutado e mantido de forma permanente. deixou o seu comando e foi nomeado governador de Mazagão,
Pode adivinhar-se a grande confusão que assolou o Real Alcazar para onde embarcou de imediato, fazendo-se escoltar por 50 sol-
de Madrid, nos dias que seguiram ao falecimento do rei, saben- dados do seu Terço da Armada, que regressaram depois a Lisboa.
do-se das intenções do seu sucessor quanto à guerra e quanto a Foi substituído por António Moniz Barreto, valente mestre de
muitos outros aspectos da administração, que se entendia que ti- campo que estivera na Bahia a comandar o Terço de Socorro e
nham sido descuidados pelo seu pai. D. António dá-nos disso um que tivera uma decisiva acção na manobra da artilharia desem-
pequeno relato, que sobreviveu numa colecção de papéis diversos barcada. Viria a morrer no grande naufrágio de 1626, ocorrido
relativos à Marinha, hoje pertença da Universidade de Harvard no Golfo da Biscaia, junto às praias francesas de Baione e Saint-
(Houghton Library). E é ele que nos revela como, no dia 18 desse -Jean-de-Luz: um dos maiores desastres navais de toda a história
mês de Abril, el-rey lhe pediu que apresentasse tudo o que tinha portuguesa, com perdas que se comparavam com as de Alcácer
pendente, despachando-o em pouco mais de meia hora. Foi confir- Quibir. Ali perderam a vida muitos soldados, substituídos de ime-
mado como Capitão Geral da Armada, agora com carácter perpé- diato para continuarem a sua missão nas armadas, deslocando-se
tuo, autorizando as despesas para armar dez navios e levantar “um até aos mares do sul, sempre que foi necessário.
batalhão de 800 soldados pagos por todo o ano”.
Nascia, assim, o Terço da Armada da
Coroa de Portugal, que era também a
primeira unidade militar constituída
com carácter permanente, não sendo
desmobilizada em tempo de inactivida-
de ou de paz. Foi criada no despacho
régio desse dia 18 de Abril de 1621,
completando agora quatrocentos anos
de existência.
GLÓRIA E TRAGÉDIA INICIAIS
Como primeiro mestre de campo do
Terço, foi nomeado D. Francisco de Al-
meida, que seria também o almirante
da armada desse ano. Os capitães dessa
armada eram, também, os comandan-
tes das companhias de infantaria em-
barcadas. Naturalmente, que o Terço
foi levantado de imediato, para entrar
em acção na armada formada em 1621.
Contudo, a sua primeira grande missão
teria lugar em 1625, quando os holande-
ses tomaram a cidade de S. Salvador da
Bahia, levando a que a Coroa organizas-
se uma importante expedição naval de
socorro ao Brasil. Levava um contingen-
te português e outro espanhol, que foram
reunidos em Lisboa e em Cádis, com o
comando geral entregue a D. Fradique de
Toledo Osório, marquês de Villanueva. A
armada portuguesa foi comandada por D. Manuel de Meneses, PÓS-RESTAURAÇÃO
levando o Terço da Armada e um Terço de Socorro, levantado
apenas para a expedição, comandado por António Moniz Barreto.
A esquadra portuguesa saiu de Lisboa no dia 22 de Novembro No ano de 1640, quando o Conde de Castelo Novo foi nomeado
de 1624, juntando-se ao contingente espanhol em Cabo Verde e governador do Brasil, o Terço acompanhou-o na viagem que fez até
seguindo para a Bahia, onde chegaram a 27 de Março de 1625, à Bahia. E essa missão fez com que não estivesse presente a quando
da rebelião que aclamou D. João IV, no dia 1 de Dezembro desse
quinta-feira santa. Os navios fundearam em frente da cidade, for-
mando uma meia lua que impedia entradas e saídas, e o desem- ano. Mas foi com o Terço da Armada formado na praça de armas do
Paço da Bahia, que ali foi aclamado o Duque de Bragança como o
barque começou no Domingo de Páscoa. O Terço desembarcou
no dia seguinte, participando de imediato num violento combate, novo rei de Portugal.
Seguir-se-iam anos muito difíceis de uma guerra persistente nas
junto à porta de Santa Luzia, onde os arcabuzeiros obrigaram os
holandeses a recuar. Os combates foram intensos e duraram mais fronteiras do Alentejo e da Beira. E o Terço ali acorreu sempre que
foi chamado a isso, participando nas mais importantes e duras
de um mês, consumando-se a rendição holandesa a 30 de Abril.
batalhas da Guerra da Restauração. Esteve na Batalha do Monti-
16 JUNHO 2021