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REVISTA DA ARMADA | 564
GUERRA NO PACÍFICO
MIDWAY – A DECISÃO PARA DEFENDER
OS POSSÍVEIS NOVOS ALVOS JAPONESES
DR
Não obstante, a aceitação e credibilidade desta informação não
foi pacífica, dando mesmo origem a um grande debate no seio do
Estado-Maior de Nimitz. Também a nível superior, em Washin-
gton, a evolução da situação levou os analistas a acreditar que
aquela informação fazia parte de uma operação de deceção; o
verdadeiro objetivo de Yamamoto seriam as fábricas de aviões no
sul da Califórnia ou, possivelmente, um ataque ao canal do Pana-
má. O GEN George Marshall, Chefe do Estado-Maior do Exército,
por exemplo, estava convencido de que o ataque seria algures na
costa oeste dos EUA. Havia ainda quem acreditasse que o ataque
seria novamente ao Havai.
Por outro lado, no caso de se confirmar que o ataque seria a Mi-
dway, alguns oficiais do Estado-Maior de Nimitz aconselhavam-no
a não empreender qualquer ação defensiva, preservando assim de
riscos elevados os poucos porta-aviões restantes. Argumentavam
que a ocupação de Midway pelos japoneses não seria duradoura,
uma vez que enfrentariam problemas logísticos agravados por um
eventual bloqueio naval, que os levaria a abandonar o atol mais tar-
de ou mais cedo.
Uma mensagem japonesa de 29 de abril, referindo-se à “próxima
campanha”, usou as palavras “koryaku butai” (força de invasão) diri-
gida a um destino codificado como “AF”. Embora não tivesse a cer-
teza definitiva do que significava “AF”, Rochefort percebeu, porém,
que estava iminente uma operação de grande envergadura, e in-
formou Nimitz da elevada probabilidade de “AF” significar Midway.
Vista aérea do atol de Midway – foto tirada a 24 de novembro de 1941
“LES JEUX SONT FAITS”
O PAPEL DA INTELLIGENCE
Como confirmar que “AF” era Midway? Sabendo que, para su-
organização da Intelligence nas Forças Armadas americanas, prir as necessidades de água, Midway dependia de um dessa-
A em particular na Marinha, sofreu uma transformação radical linizador, Rochefort propôs e Nimitz autorizou o envio, através
depois do ataque a Pearl Harbor, em dezembro de 1941, devido do cabo submarino que ligava o Havai a Midway, de uma ordem
principalmente ao grande falhanço na previsão do local e data instruindo o comando em Midway a enviar uma mensagem por
desse primeiro ataque do Japão. Uma das alterações efetuadas rádio, num baixo grau de cifra, informando que, devido a uma
foi o estabelecimento, no Havai, de uma unidade de recolha e avaria no dessalinizador, era urgente o envio de um navio tanque
análise de informações de comunicações (COMINT). A chefia des- com água doce. Os Japoneses morderam o isco. Dois dias depois,
ta unidade foi entregue ao CFR Joseph Rochefort, um especialista uma mensagem do alto comando japonês informava todos os co-
em criptoanálise, que, com a sua equipa, conseguiu, a partir de mandos envolvidos na operação, que “AF” estava com problemas
março de 1942, decifrar parte das mensagens trocadas entre os no abastecimento de água. Nimitz ficou convencido. Estava nas
comandos da Marinha Imperial Japonesa. suas mãos decidir defender, ou não, Midway.
Mesmo dispondo duma equipa pequena e de parcos recursos, Depois de uma análise ponderada, Nimitz concluiu que deixar
Rochefort obteve informações que foram de grande importância cair Midway teria efeitos desastrosos. Se os japoneses capturas-
para a definição da estratégia que Nimitz pôs em prática para en- sem o pequeno atol, rapidamente poderiam utilizar bombardei-
frentar as, numericamente superiores, forças de Yamamoto. Ni- ros de longo alcance para atacar o Havai, o que implicaria a deslo-
mitz diria mais tarde que “durante alguns meses após o início da cação da esquadra americana para a costa oeste, deixando todo
guerra com o Japão, o destino da nação esteve nas mãos de um o Pacífico Central à mercê da esquadra japonesa. A 2 de maio
pequeno e dedicado grupo de homens instalados na cave de um Nimitz desloca-se a Midway para se certificar de que a defesa era
edifício administrativo em Pearl Harbor.” viável. O que viu, reforçou-lhe a convicção de que a decisão cor-
Depois do bombardeamento, a 18 de abril, pela esquadrilha aé- reta era defender. Quando regressou a Pearl Harbor, ordenou o
rea sob o comando de Doolittle, de Tóquio e de outras cidades, os reforço de Midway com mais militares, mais aviões, mais lanchas
japoneses aumentaram de forma muito significativa o tráfego de torpedeiras e mais peças de artilharia.
comunicações, o que facilitou o trabalho de análise criptográfica.
Por outro lado, o trabalho exaustivo de Rochefort e da sua equipa
já tinha provado o seu acerto com as informações obtidas, umas Piedade Vaz
semanas antes, sobre o ataque a Port Moresby e Tulagui. CFR REF
26 JULHO 2021