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do artigo 18º, da Lei nº 34/2006 de 28 de Julho, a expressão usada pelo legislador
interno foi a de “existam motivos fundados (…)”. Esta caracterização parece-nos
mais sólida, porque a exigência da sustentabilidade do motivo existente é um
critério mais objectivo.
3 Incluindo a definição de pirataria, o artigo 15º no articulado de 1958, e o artigo
101º no texto de 1982.
4 Ambos os normativos respeitantes à imunidade dos navios de guerra e outros
navios utilizados em serviço oficial não comercial de um Estado.
5 Este termo já constava do 2º parágrafo do artigo 22º da Convenção de Genebra.
6 Ou use uma bandeira a que não está autorizado.
7 O que, por sua vez, pode ser mais ou menos propiciado com o apoio que o Estado
da bandeira do navio visitado possa, também, querer conceder.
8 Sobre esta análise, ver, também, Fauchille, Marques Guedes, O´Connell e Lynce
e conformidade dos documentos exigidos pela legislação em de Faria.
vigor para o efeito e emitidos pelas autoridades portuárias, 9 Depois de ficar claramente expresso, na primeira parte do preceito, que “Todo
sanitárias, alfandegárias, fiscais e policiais, sem prejuízo da o Estado pode apresar, no alto mar ou em qualquer outro lugar não submetido à
visita e da verificação documental sempre que ocorram suspeitas jurisdição de qualquer Estado, um navio ou aeronave pirata e em poder dos piratas
e prender as pessoas e apreender os bens que se encontrem a bordo desse navio
de infracções de natureza penal ou contra-ordenacional (…)”. (…)”. Repare-se que, no mesmo articulado, a Convenção fala em deter pessoas e
Cinco anos depois da publicação do Decreto-Lei nº 44/2002, em prender pessoas, o que pode induzir que, por exemplo neste caso da verificação
e através de profundas alterações introduzidas nos actos e de um crime de pirataria, a actuação do comandante do meio naval é sustentada
por uma ordem ou decisão de autoridade judicial competente do Estado do seu
procedimentos de visita, visita de saída e de despacho de pavilhão, nos termos estabelecidos pela respectiva lei processual penal.
largada , o Decreto-Lei nº 370/2007, de 6 de Novembro, aprovou 10 Estatuindo o nº3 do preceito que “Os Estados Partes na Convenção procederão
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o regime da visita de entrada de navios que está corporizado no à permuta de informações, a fim de assegurar a coordenação prática das medidas
seu artigo 2º , estando previsto, igualmente, no nº3 do preceito, por eles tomadas para combater o tráfico de escravos, e comunicar-se-ão todos os
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a prerrogativa de efectuar um acto técnico de vistoria por perito casos de tráfico de escravos, bem como toda e qualquer tentativa nesse sentido
de que tenham conhecimento”, normativo que é, afinal, decorrente do princípio
da Autoridade Marítima Local (AML). definido no artigo 100º da CNUDM.
Este diploma adoptou um critério diverso para a realização 11 O artigo 4º desta Convenção define o princípio de que “Qualquer escravo que se
do acto de visita, e que privilegia uma matriz de situações com refugie a bordo de um navio de um dos Estados Partes na Convenção ficará, ipso
potencial risco ou ameaça para as águas territoriais ou para os facto, livre”, que é o princípio acolhido, expressamente, na parte final do artigo
portos, num perfil de acto que o diploma agrega, no momento 99º da CNUDM.
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Ver o que analisamos em “Manual de Direito Internacional” TOMO I, Petrony,
da saída dos navios visitados, à execução de acto de verificação 2020.
aquando da emissão do despacho de largada , também ele 13 Incluímos o texto na língua original em que foi expresso.
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emitido pela AML. Portanto, o acto de visita passou a ter uma 14 Quando abordámos, em sede do estudo dos espaços, a Zona Contígua e a Zona
conexão directa com a tipicidade da situação em causa, e com o Económica Exclusiva, pelo que não iremos, assim, desenvolver essa vertente de
processo de controlo e verificação de condições de segurança à análise ao diploma.
saída do respectivo navio do porto. 15 O artigo 17º da Lei nº 34/2006, de 28 de Julho, transpõe o princípio estabelecido
De relevar, ainda, que em âmbito do Decreto-Lei nº 61/2012, de no artigo 32º da CNUDM, quanto a navios que naveguem no Mar Territorial.
14 de Março, na sua redação atual – diploma que transpôs para a 16 Porque pode envolver a imposição de medidas cautelares e/ou de polícia,
ordem jurídica interna, a Diretiva nº 2009/16/CE, do Parlamento consoante o que resulte da visita ao navio, caso em que, somente um órgão de
polícia as pode impor.
Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2009, referente à inspeção 17
Diploma que aprovou o Regulamento Geral das Capitanias, e que assumiu esta
de navios de bandeira não nacional pelo Estado do porto, e seu competência no seguimento do que tinha sido estabelecido, numa formulação mais
controlo em área portuária –, foram estabelecidos mecanismos aproximada à que seria aprovada, ainda no Séc. XIX, no ponto 19º, do artigo 8º, do
que se assumem como nucleares no processo de controlo de navios Decreto de 1 de dezembro de 1892, o qual estabelecia que incumbe ao Capitão do
no acesso a águas territoriais e à entrada e saída dos portos, como Porto: “(…) Visitar os navios mercantes nacionais e mesmo os estrangeiros, quando
estes tenham tomado carga ou passageiros no porto da sua jurisdicção, e houver
sejam a notificação de chegada do navio, a admissão ou recusa fundado motivo para supor que estão faltos de condição para, com segurança,
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de acesso, o acesso em caso de força maior e a proibição de saída conduzir os passageiros ou carga, procedendo, em tal caso, como é determinado
do navio do porto num quadro de controlo que é, actualmente, n´este regulamento; tendo porém em vista, com relação aos navios que conduzam
passageiros para portos estrangeiros fora da Europa, o que preceitua a carta de
quanto aos seus procedimentos, extremamente pormenorizado e lei de 20 de julho de 1855, e com relação a navios estrangeiros o determinado no
complexo, mas também integrado, sistémico e ágil. artigo 92º, na parte respectiva ao cônsul da nação a que o navio pertencer.” Este
acto tinha antecedentes reguladores em diplomas de 1803, 1839 e 1855.
18 Estatuía o preceito que aos Capitães dos Portos compete: “(…) Visitar, quando
necessário, as embarcações nacionais e estrangeiras para verificar as suas condições
Dr. Luís da Costa Diogo de segurança e impedir a saída daquelas que: 1) Não possuam essas condições; 2)
Diretor Jurídico da DGAM A vistoria tenha dado como não devendo navegar; 3) Tenham mandato de embargo
por parte do juiz ou presidente do tribunal competente; (…)”.
N.R. O autor não adota o novo acordo ortográfico. 19 E atendendo-se, ainda, ao estipulado no nº2, do artigo 23º deste diploma.
20 Regulados até então, respectivamente, pelo RGC, pelo Decreto-Lei nº 519/80, e
pelo Decreto-Lei nº 325/73, de 2 de Julho.
Notas 21 O qual prevê as seis situações em que o Capitão do Porto pode determinar a
1 Definia o nº1, do artigo 22º, do convénio de 1958, que “Salvo nos casos em que realização da visita de entrada de navios em área portuária, e que são dirigidas a
os actos de ingerência são baseados em poderes concedidos por tratado, um navio navios e embarcações que: “(…) a) Tenham avaria; b) Arvorem bandeira de país não
de guerra que encontre no alto mar um navio de comércio estrangeiro não pode comunitário; c) Transportem cargas ou substâncias perigosas; e) Arvorem bandeira
passar-lhe busca a menos que haja motivo sério para julgar: a) que o dito navio se de país comunitário, quando provenientes de país não comunitário; f) Pretendam
entrega à pirataria; b) Que o dito navio se entrega ao comércio de escravos; c) que o aceder a águas territoriais e a águas interiores, aos que nelas pretendam fundear
navio, arvorando um pavilhão estrangeiro ou recusando-se a içar o seu pavilhão, é, ou navegar em direcção a um porto nacional e, ainda, àqueles sobre os quais exista
na realidade, um navio tendo a mesma nacionalidade que a do navio de guerra (…)”. algum tipo de suspeita quanto a avaria ou relativa à tripulação, carga, ou à prática
2 A expressão tem, notoriamente, a dificuldade da percepção do seu grau, e este de algum ilícito penal ou contra-ordenacional”.
aspecto é nuclear, porque é o tipo de suspeita, e a sua sustentação efectiva, que 22
pode permitir, ou não, a acção do navio de guerra. O articulado aprovado em Ver artigos 2º, 4º, 6º e 8º do diploma.
Genebra usava o termo motivo sério, também ele, objecto de críticas. Na alínea a), 23 Conforme resulta dos artigos 18º, 21º, 22º, 27º, 31º, 32º e 40º, todos do diploma.
16 FEVEREIRO 2022