Page 308 - Revista da Armada
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-Mor, Chanceler da Casa da Suplicação, das meritório de procurar dotar o reino com dois cartógrafos, Pedro e Jorge Reinel, um
leis da Chancelaria, Desembargador do Paço estruturas administrativas e religiosas ade- cosmógrafo, Rui Faleiro, um cartógrafo e
- 1536 Estabelecimento do Santo Ofício quadas aos novos tempos que se avizi- cosmógrafo Francisco Faleiro. (8)
- 1537 Protecção à Universidade e sua nhavam. A viagem, que terminou sem o seu princi-
transferência para Coimbra pal empreendedor – Fernão de Magalhães –
- 1539 Terceira edição das Ordenações do II tentava provar que as ricas ilhas Molucas
reino É no reinado de D. João III que o Império ficavam na área de influência espanhola,
- 1548 Governo Geral do Brasil, Regi- Português atinge a sua maior extensão. Os segundo o Tratado de Tordesilhas. Todavia,
mento de Tomé de Sousa destemidos marinheiros portugueses alargam depois do apresamento em Cabo Verde, do
- 1551 Incorporação na coroa das ordens a sua área de navegação no Extremo Oriente único navio que completou a viagem de cir-
de Santiago e Avis e alcançam o Japão no ano de 1543. Por cum-navegação, estalou um conflito de
- 1552 Aprovação régia do Tribunal do outro lado, é também durante o governo feição diplomática pela posse das cobiçadas
Stº Ofício deste monarca que se abandonam certas ilhas. A diplomacia portuguesa enfrentava, a
- 1555 Colégio da Artes entregue à parcelas territoriais ultramarinas em conse- partir daquele momento, um duro desafio à
Companhia de Jesus quência de graves problemas financeiros e sua desejada neutralidade peninsular.
Esta intensa carga de novas leis tem um de fortes indícios, de má gestão e corrupção O diferendo, entre as duas potências marí-
objectivo concreto: a construção do Estado na administração dos espaços de além-mar. timas, escondia ainda um problema científico
Moderno. O engrandecimento do aparelho O monopólio comercial das especiarias es- de difícil resolução: o cálculo da longitude. A
estatal exigiu esforços; aumentaram os fun- tava em perigo. cosmografia portuguesa, distanciando-se dos
cionários tal como as suas funções, incre- O primeiro grande desafio vem dum valores propostos pelos espanhóis, aplicava
mentando-se os atributos de soberania da navegador português ao serviço da Espanha: medidas muito mais exactas para a medição
realeza – poder fazer as leis, aplicar a justiça, Fernão de Magalhães, que em 1519 partira do perímetro terrestre. Na verdade, os cartó-
cobrar os impostos, manter exércitos e de S. Lúcar de Barrameda numa armada grafos e pilotos do outro lado da fronteira
armadas permanentes, nomear funcionários. composta por cinco navios e 265 homens. serviam-se dos valores, errados, propostos
D. João III rodeou-se de homens da sua A organização científica do empreendimen- pela geografia ptolomaica, enquanto no meio
confiança. António Carneiro e Pêro de to esteve, por inteiro, a cargo de portugue- naval português se calculava com muita
Alcáçova Carneiro, pai e filho, foram sucessi- ses: o Capitão-Mor, Fernão de Magalhães, aproximação o valor de um grau do meridi-
vamente seus secretários, ocu- ano terrestre, atribuindo-se 17
pando um lugar de relevo no 1/2 e 18 léguas por cada grau.
aconselhamento da governação, Encontrar um consenso não
ou seja, na execução de uma era tarefa fácil. A demonstrar está
política externa e na gestão das o facto de a Conferência de Elvas
“matérias” ultramarinas. Os – Badajoz ter falhado redonda-
vedores da fazenda, embora des- mente, em 1524. Só mais tarde,
frutando de menos influência, em 1529, o Tratado de Saragoça
actuavam, da mesma forma, com veio a pôr fim ao desentendi-
bastante poder decisório. Cite-se mento. Ironicamente, a troco de
a título de exemplo, D. António uma quantia avultada de di-
de Ataíde, futuro conde da Casta- nheiro, D. João III comprava o
nheira, vedor a partir de 1530, que afinal lhe pertencia por di-
que gozou de animado prota- Fernão de Magalhães Pedro Nunes reito próprio, a posse das ilhas
gonismo junto do monarca (7). Molucas.
Para uma melhor aplicação Para Portugal, o entendimento
das medidas reformadoras re- com o seu vizinho era funda-
correu-se ao primeiro nume- mental. Se a Espanha precisava
ramento (1527-32) de que há de apoio nos “mares portugue-
memória, da população portu- ses”, para garantir segurança aos
guesa. Seguiu-se a divisão do navios vindos do México e do
reino em novas correições, a Perú, carregados de tesouros,
fundação de novas dioceses e a não era menos verdade que
criação de novos tribunais Portugal necessitava de ajuda
(Mesa de Consciência e Ordens em Marrocos, de segurança nas
e Santo Ofício), controlados costas atlânticas e do apoio
pelo poder central. naval espanhol. Quanto à políti-
A Universidade, após longos D. João de Castro Damião de Góis ca europeia, por seu turno, as
anos em marasmo, foi transferida posições diferiam fortemente. O
para Coimbra. O seu corpo do- Império de Carlos V, mergulha-
cente sofreu alterações, convi- do numa dura luta com a França
dando-se ilustres professores de Francisco I, pelo domínio da
europeus para aí leccionarem. A Itália, e em busca da hegemonia
reforma do ensino não estaria europeia, tentava assegurar
concluída sem a fundação, apoios. Contudo, a estratégia
igualmente em Coimbra, do seguida por D. João III, e que já
Colégio das Artes(1548), local vinha há muito sendo aplicada,
onde se faziam os estudos passava pela defesa intransigen-
preparatórios com vista ao te da neutralidade, distancian-
ingresso na universidade. do-se dos campos de batalha
As reformas, levadas a cabo Martim Afonso de Sousa Fernão Mendes Pinto em solo europeu, para canalizar
por D. João III, tiveram o aspecto as suas forças e rendimentos em
18 SETEMBRO/OUTUBRO 2002 • REVISTA DA ARMADA