Page 310 - Revista da Armada
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Álvares, Gaspar Moreira, André Pires, Aleixo que cantou, em forma épica, as glórias quase todos os seus irmãos, exceptuando a
da Mota. nacionais: Luís de Camões. sua irmã mais nova. Deixaria como sucessor o
As preocupações neto - D. Sebastião.
com a segurança da O seu governo foi
navegação dá ori- pontuado de dificul-
gem à instituição, dades – ameaças à
pela primeira vez, de integridade do im-
um ensino náutico pério, problemas
aberto a pilotos, religiosos na Europa,
sota-pilotos, mestres, crises financeiras e
contra-mestres e económicas. O tem-
cartógrafos, sob a po em que viveu foi
direcção de um dominado por gran-
cosmógrafo-mor, des modificações
cuja primeira no- que alteraram por
meação recai em completo valores,
Pedro Nunes. Esse mentalidades e
aperfeiçoamento ideais, e o próprio
científico da náutica modo de vida dos
leva, ineditamente, a povos, mas na medi-
um diálogo entre da das suas possibili-
teóricos e práticos dades, este rei por-
das coisas do mar: tuguês, resolveu os
resposta de Pedro problemas que con-
Nunes a questões O Mundo no tempo de D. João III – Atlas Abraão Ortelius. tinuamente se lhe
postas por Martim depararam.
Afonso de Sousa e a utilização de instrumen- D. João empreende uma verdadeira
tos, concebidos pelo matemático, aquando política de renovação cultural. Primeiro Carlos Manuel Valentim
das navegações de D. João de Castro. Aliás, estabelecendo um programa de bolsas de 2TEN TSN
os roteiros da autoria de Castro deixam estudo, depois através da reforma e trans-
perceber que a coroa estava envolvida numa ferência da Universidade para Coimbra, Notas
acção patrocinadora da exploração e do co- convidando para tal conceituados profes- (1) D. Manuel tivera um primeiro casamento com a filha
nhecimento dos oceanos. Problemas de di- sores estrangeiros. mais velha dos “reis católicos”, D. Isabel, presumível
fícil resolução como eram o cálculo das lon- O Humanismo Português - como reflexo herdeira do trono espanhol, mas esta viera a morrer no parto
gitudes, a representação cartográfica ou o da expansão ultramarina, tem características do nascimento do filho de ambos –D. Miguel da Paz . Que
por sua vez também falecera com tenra idade.
desvio da agulha tiveram por detrás o incen- próprias - aberto ao contacto com outros (2) Crónica de D. João III por Francisco de Andrada,
tivo do poder real, no preciso momento que povos e civilizações, não se encantou ape- Introdução e revisão de Manuel Lopes de Almeida, Porto,
estava em causa a sustentação do “Império nas com a Antiguidade Clássica. A corte, à Lello &Irmão Editores, 1976, pág. 7
da Pimenta”. Cosmógrafos, pilotos, cartó- boa maneira das cortes italianas do Renas- (3) Idem, Ibidem, pág. 15
(4) Por todas veja-se a sua última biografia: Paulo
grafos e outros técnicos de navegação, inven- cimento, transformou-se num viveiro de Drumond Braga, D. João III, Lisboa, Hugin, 2002
tam e re-inventam a Arte de Navegar, neste poetas, historiadores, dramaturgos, novelis- (5) Vitorino Magalhães Godinho, “ A Viragem mundial
ambiente renascentista. Tratados de arquitec- tas. Importa referir, que muitos dos locais de 1517-1524 e o império português” in Ensaios , Lisboa,
tura naval, roteiros, livros de marinharia, pla- de florescimento cultural são patrocinados Sá da Costa, 1ª Ed. 1968, pág. 141
(6) Frei Luís de Sousa, Anais de D. João III, com prefácio
nisférios esplêndidos, pelo seu rigor ou pelo rei ou pela família real, caso dos círcu- e notas de Rodrigues Lapa, Sá da Costa, 2ª Ed. 1951, pág.28
beleza, e muitos outros documentos técnicos los humanistas do Infante D. Luís, irmão de (7) Para esta temática vide : Maria Leonor Cruz, A
fazem a sua aparição nesta época de grande D. João, ou do circulo da Infanta D. Maria, Governação de D. João III. A Fazenda Real e os seus
desenvolvimento e afirmação da náutica por- sua irmã mais nova. O Estado esforça-se em Vedores, Lisboa, Centro de História da Faculdade de
tuguesa, que propicia o aparecimento de prol de uma memória colectiva que registe Letras da Universidade de Lisboa, 2002
(8) Veja-se: A Viagem de Fernão de Magalhães e a
grandes figuras como, por exemplo, os já os feitos de uma nação virada para o mar. Questão das Molucas, Lisboa, J.I.U., Centro de Estudos de
citados Pedro Nunes, um matemático de No ano de 1540 entra em Portugal a Cartografia Antiga, Introdução de Avelino Teixeira da
projecção europeia, ou o incansável D. João Companhia de Jesus, salientando-se, a partir Mota.
de Casto, humanista, navegador, soldado e de 1542, a missionação de S. Francisco (9) Vide Jorges Borges de Macedo, História
administrador imperial. Xavier no Oriente. Entretanto, os decretos tri- Diplomática Portuguesa – constantes e linhas de força,
Lisboa, I.D.N., 1987, pág. 89.
dentinos ditavam uma maior vigilância ao (10) Joaquim V. Serrão A «Crónica de D. João III» de
III ambiente cultural, por parte da Igreja, e moti- António de Castilho, Sep. dos Arquivos do Centro Cultural
A geração de D. João III é uma das mais vavam o envolvimento da religião na cultura. Português, Paris, 1976, vol. II, pág. 77.
(11) Veja-se: A. Saturnino Monteiro, Batalhas e
notáveis da cultura portuguesa. O Hu- Numa Europa fortemente dividida, religiosa- Combates da Marinha Portuguesa, Lisboa, Sá da Costa,
manismo Renascentista português viu mente, a D. João III não lhe resta muito 1992/93.
nascer um conjunto extraordinário de campo de manobra, diante da dependência (12) Cfr: Ana Maria Pereira, Problemas Marítimos entre
autores onde pontificam homens como diplomática e política de dois dos grandes Portugal e a França na Primeira Metade do Século XVI,
Pedro Nunes, João de Barros, Damião de poderes católicos: a Santa Sé e o Império de Cascais, Patrimónia, 1995, pág. 309.
Góis, Diogo de Teive, André de Resende, Carlos V. A grande abertura cultural verifica- (13) Idem, Ibidem, págs 309/310.
(14) Cr: Jorge Couto, A Construção Do Brasil, Lisboa,
André de Gouveia, Francisco de Melo, da antes de 1540, que teve fortes aplausos de Cosmos, 2ª Ed., 1997, pág. 211.
Diogo de Sá, Fernão de Oliveira, D. João de humanistas como Erasmo e Luís Vives, que (15) A. Teixeira da Mota, A Evolução da Ciência
Castro, Garcia da Orta, Pedro Margalho, chegam a dedicar obras ao rei português, dá Náutica durante os Séculos XV e XVI na Cartografia
Fernão Mendes Pinto. Este Humanismo lugar aos processos inquisitórios e à rigidez Portuguesa da època, Centros de Estudos Cartografia
Antiga, 1961, pág. 11
Português teve um papel determinante na das propostas da Contra-Reforma. (16) Vide: A. Teixeira da Mota, Prefácio in O Diário de
divulgação dos Descobrimentos, presen- D. João III veio a falecer no ano de 1557. Pêro Lopes de Sousa (1530-1530), Lisboa, Agência -Geral
ciando o aparecimento de um magno poeta, Assistiu à morte de todos os seus filhos, e de do Ultramar, 1968, pág. 11
20 SETEMBRO/OUTUBRO 2002 • REVISTA DA ARMADA